writings on architecture, design and cultural studies (incl. cedric price, gordon pask and many other stuff)
7/2/23
"Historia, resistência crítica e interesses actuais"
Kenneth Frampton (entrevistado por Gonçalo Furtado e Cristina Silva), “Historia, resistência crítica e interesses actuais: Uma conversa com Kenneth Frampton”, In: AAVV Arq/a, nº86/87, Lisboa, 2010, p.111-115) /
"1 - Uma Historiografia critica /
1.1. /
[ GF+CS] - Comecemos pelo (…) percurso enquanto historiador e critico de arquitectura. Tendo nascido em 1930, e Inglaterra, formou-se como arquitecto na Architectural Association School of Architecture [1950-55]. Desde então desenvolveu uma actividade intensa e participativa no campo da arquitectura, nomeadamente como docente, autor de numeroso livros e ensaios. Em Inglaterra, por exemplo, leccionou no Royal College of Art [1974-77], na AA, tendo também dirigido a revista Architetcural Design entre 1962-1965. Em meados da década de 60, rumou aos EUA, sendo professor na Columbia University, e, desde 1972, na muito conceituada Columbia University. Leccionou várias gerações de arquitectos tal como influenciou vários jovens teóricos que tiveram projecção internacional. Não perdeu no entanto a sua ligação à Europa e a outros continentes, tendo voltado a leccionar no Royal College of Art, assim como outras instituições, incluindo o ETH de Mendrisio, o Berlage Institute [por altura da fundação por Herman Hertzberger], de Amesterdão, a Accademia di Architettura de Mendrisio [aquando dos primeiros 5 anos que ensinou com Mario Botta], a Chinese University of Hong Kong. A chamada “fuga de cérebros” verificou-se também na arquitectura, tendo muito ingleses ido ara os EUA (recordemo-nos de Alan Colquhoun, Robert Maxwell, ou outros dos seus colegas). (…) /
1.2./
[ GF+CS] - No mesmo ano que começou a dar aulas na Columbia University ingressou no Institute for Architecture and Urban Studies, de Nova Iorque, então dirigido por Peter Eisenman, sendo co-fundador da revista Oppositions, editada pelo instituto, desde 1974. Teóricos eminentes como Anthony Vidler, Manfredo Tafuri, Aldo Rossi, Robert Stern ou Bernard Tchumi participaram nesse fórum, assim como o jovem Rem Koolhaas, enquanto estagiário. Num primeiro momento, viram-no à semelhança de Giedion, como um potencial historiador de tudo o que estavam a fazer. /
[ KF] - (…)
O IAUS-NY foi uma instituição excepcional, e aqueles que como nós estiveram diária e intimamente envolvidos, todos sentimos que foi o produto de um momento único … uma equipe de 15 pessoas a maioria a trabalhar em part-time, foi capaz de motar tantos programas diferentes e actividades dirigidas ao publico, que vão desde exposições, á edição de livros, revistas, catálogos e jornais, até à gestão de um curso de arquitectura e cursos de educação de adultos. Para além de tudo isto, envolvemo-nos com o Urban Development Coorporation of NY State, no desenvolvimento de um protótipo de baixa altitude e alta densidade , que eventualmente construiríamos em Brownsville, Brooklyn.
(…) /
1.3. /
[ GF+CS] - Tem uma produção notável, tendo-se mostrado sempre implicado em várias discussões que foram surgindo. Envolveu-se por exemplo no debate entre os ‘White’ e os ‘Grey’ – entre aqueles que defendiam uma relação com o Movimento Moderno Europeu dos anos 20 (como Richard Meyer ou Peter Eisenman) e a primeira vaga de ‘pós-modernos’ historicistas (como Robert Veturi ou Charles Moore). /
Editou o seu livro ‘Arquitectura Moderna: Uma história critica”, em 1980, o qual teve múltiplas edições e foi traduzido em várias línguas. Trata-se de uma história da arquitectura vista pela óptica de um arquitecto, redigida para arquitectos, que é formatada por capítulos que abrem sempre com uma citação. Este relato inclui de forma origina alguns momentos menos conhecidos, sendo no geral pautado por ima perspectiva política, ao jeito do compromisso critico Tafuriano.
Mais tarde, desenvolveu o termo ‘regionalismo critico’ no ensaio ‘Towards a critical regionalismo: Six points for na architecture of resistance’ que publicou no livro editado por Hall Foster, ‘The anti-aestehtic: Essays on postmodern culture’, em 1983. O conceito surgiu como uma alternativa ao contexto emergente marcado pela globalização e capitalismo tardio, assim como ao pós-modernismo historicista. Em oposição a outras posturas mais liberais ou optimistas, o seu conceito surge como mais próximo da consciência Habermasiana (que também aí publica um ensaio sobre a continuidade do projecto moderno designado ‘Moderity: An incomplete project’). (…) Anos de trabalho, realizado num contexto de emergência do pósmodernismo, na Europa e nos EUA. (-…) Referencias (…) vão de Martin Heiddegger a Hannah Arendt, passando por Paul Ricoeur, com que, com que construiu este importante contributo teórico e que abriu caminho a parte do seu trabalho futuro.
(…) /
[ KF] - O Estilo Pós-moderno em oposição à Condição pós-moderna já estava a surgir nos Estados Unidos, por volta de 1980, que não é só o ano da Bienal de Veneza, comissariada por Paolo Portoghesi, com o significativo título ‘The presence of the past: The end of prohibition’, mas é também o ano em que apareceu pela primeira vez ‘Modern architecture: A critical history’. A sua publicação levou por coincidência à elaboração da […] tese sobre o Regionalismo Critico, os ‘Six points for an Architecture of Resistance’, publicado mais tarde […] no livro ‘The anti-aesthetic’, de Hall Foster, de 1983. (…) Os colegas nos colegas que me levaram a tomar esta direcção, como contraponto ao canibalismo historicista do Estilo Pós-Moderno. Estou particularmente em dívida, agora e retrospectivamente, à parceria Grega/Belga ed Alex Tzonis e Liane Lefaivre, que primeiro cunharam o termo ‘critical regionalism’, e ao arquitecto/filósofo Checo Dalibor Vesely, que me pôs em contacto com o ensaio seminal ‘Universal civilization and national cultues’, de Paul Ricoeur.
(…) /
2 - Resistência critica. /
2.1. /
[ GF+CS] - No (…) livro ‘Arquitectura moderna: Uma história crítica, refere o contacto com Siza Vieira, que conheceu através da L’Architecture d’aujourd hui’, de Bernard Huet. Frampton visitou Portugal já nos anos 80 [primeiro contacto com Siza em 1985), tendo sido um dos promotores ed posturas arquitectónicas próximas das desenvolvidas pela Escola do Porto e por Siza, Mantendo ainda hoje uma relação de amizade com ele. Verifica-se que o discurso corrente sobre a obra do arquitecto português e a ‘Escola do Porto’ fala de um método, suportado pelo desenho, que propõe soluções austeras, empenhadas socialmente, ancoradas ao ‘lugar’ e ao ‘contexto’. Tal jargão parece permitir algumas relações directas como o conceito de ‘regionalismo critico’. (…) História de (…) encontro com a Arquitectura Portuguesa e Siza Vieira (…) – Quais as reações que delineava entre a sua obra e o suposto ‘regionalismo critico’?
(…) /
[ KF] - Penso que o meu primeiro encontro com Álvaro Siza, no Porto, foi em 1985. Lembro-me de ter ficado extremamente impressionado com os seus primeiros trabalhos coloridos por uma atmosfera particular, que aparentemente prevaleceu naquele tempo no Porto como consequência da chamada Primavera Portuguesa. (…) A atmosfera de Matosinhos (…), nas Piscinas da Quinta da Conceição e de Leça da Palmeira, na espetacular ruína da casa em Moledo do Minho, e no edifício discretamente dinâmico do Banco e Oliveira de Azeméis. (…) /
É um homem extraordinário, com uma sensibilidade excepcional, empenho e ironia melancólica, desenhando em cafés fumando cigarros infinitamente. Este método mais profundo pode dizer-se que deu um significado mais profundo ao slogan anterior de Mario Botta ‘building the site’. Siza grava o sítio no seu bloco de desenho antes de o construir ao mesmo tempo que o edifício. Uma pessoa pensa jocosamente que para Siza, o que o edifício quer ser é o que o edifício quer que o edifício seja. Quanto ao ‘Regionalismo crítico’, não quero impingir esta categoria a ninguém, embora pense que o Siza tenha sido bastante critico quando, quando persuadiu os eu cliente, Alcino Cardoso, a manter as vinhas em vez de as arrancar e plantar laranjeiras como os seus amigos bancários o tinham aconselhado, por necessitarem de menos manutenção e serem mais rentáveis.
(…). /
2.2. /
[ GF+CS] - Sabemos que os seus interesses são múltiplos. Ainda assim, segundo cremos, permanece atento á arquitectura de Portuga, ainda que esta seja periférica relativamente ao debate global. /
Olhando os desenvolvimento da história recente, [questiona-se …] a Escola do Porto conseguiu transmitir a cultura ideológica que Frampton reconheceu no edifício da FAUP, desenhado por Siza e(1991). / Recordemos por exemplo a ascensão na década de 90s de outras arquitectura europeias como a holandesa ou a espanhola.
(…). /
[ KF] - Acho (…) difícil de saber o que se passa no interior das escolas de arquitectura nos dias de hoje, em qualquer lado, ou se a Escola do Porto tem sido capaz de manter a sua abordagem discreta, depois da saída de Távora. (…) eu costumava dizer (sem grandes provas), que existem quatro países no mundo onde se pode falar de cultura arquitectónica, no sentido que naquele país existem 15 a 30 arquitectos, que num mesmo tempo produzem continuadamente um trabalho notável. Para mim, desse há mais ou menos uma década, são a Espanha, a Finlândia, o Japão, e a Austrália.
(…). /
3 – Interesses actuais. /
3.1. /
[ GF+CS] È fácil constatar uma continuidade nas suas referências teóricas, por exemplo, o seu interesse pelo espaço público e pela relação arquitectura/urbano espelha os eu fascínio pela Arendtiana “Condição humana” e pela importância da dimensão pública da arquitectura. /Por outro lado Constatamos que vem revendo a sua ‘História critica’. / Na última edição acrescentou um novo capítulo, designado ‘Architecture in the age of Globalization: Topography, morphlogy, sustainability, materiality, habitat and civic form, from 1975-2007”; remetendo precisamente para antepenúltimo o capítulo designado ‘Critical regionais: modern architecture and cultural identity’. [… Questiona-se como se] perspectiva a operatividade do património teórico-crítico do regionalismo critico nas circunstâncias mundiais actuais que aparentemente parecem não a favorecer? Consideremos por exemplo, ressurgir de fenómenos politico-culturais alheios a fronteiras, como o terrorismo e a globalização desmedida em várias áreas apesar da crise económica. /
(…) recebeu reacções como as de autores como Jean-Louis Cohen, na Casabella em 1996, que defendiam um Internacionalismo crítico, argumentando adequar-se melhor à realidade actual.
(…) /
[KF] Eu comecei a retirar-me da polémica do Regionalismo Critico, quando os estudantes americanos continuavam a dizer-me, (…) em várias parte dos EUA, que não havia cultura regional na área (…). Isto levou-me a deslocar o meu ponto de vista para a sugestão de que a arquitectura actualmente pode parcialmente estar baseada na ‘poética da construção’; daí o meu livro ‘ Studies in tectonic culture’, em 1992./
Contudo, eu continuo a não deixar cair que a tarefa primária é criar o ‘espaço da aparência pública’ (apropriando-me da frase Arendtiana), mas isto pressupõe o desenvolvimento de uma sociedade verdadeiramente democrática; algo que torna cada vez mais difícil de sozinho aspirar e de alcançar, dado que o objectivo asbtracto de maximização do lucro ed corporações multinacionais, sem diferenciação geográficas. /
Só temos de pensar na descarga ininterrupta de crude no Golfo do México, para nos lembrarmos da impotência democrática dos governos democráticos contemporâneos. Isto leva-nos a Martin J.O’Connor, cuja questão retórica eu cito no princípio último capítulo da quarta e última edição do meu ‘Modern Architecture: A Critical history’, ‘Is capitalismo sustainable?’. É claro que ele não acredita que o seja. Entre outras coisas, é esta sóbria aporia que torna qualquer panorâmica dos últimos 30 anos [1977-2007] uma desafio. /Daí as minhas 6 categorias que, longe de serem satisfatórias, são uma tentativa de trazer à luz 6 tendências expressivas/ou preocupações ideológicas que parecem ter sido trazido para a linha da frente, na arquitectura recente, apesar das ultimas duas, habitat e forma cívica, estarem mais na natureza e um conjunto de obrigações sócio-programáticas, as quais se tornaram cada vez mais difíceis de preencher. Daí a minha antipatia pela tendência da espectacularidade da arquitectura dos ‘renderings’ comos e se fosse puramente um exercício de belas-artes,- a la Frank Ghery e outros. Pois, apesar de haver uma dimensão escultural decisiva na arquitectura de Siza Vieira, as suas obras não são reduzidas ao estatuto de objectos estéticos independentes. / Enquanto o culto das ‘marcas’ testemunha a mercantilização da arquitectura torna-se cada vez mais claro que é extremamente difícil cultivar uma aproximação mais sensível e ética ao ambiente, quando é tão evidente a falta progressiva de uma base económica e política sobre a qual actuar. Como escreveu numa resposta a uma mensagem minha de felicitações no final da década de 80 – “ Sim eu tenho muitos projectos, mas não estou feliz. Como se pode estar feliz quando a europa não tem nenhum projecto?" /
Kenneth Frampton (entrevistado por Gonçalo Furtado e Cristina Silva), “Historia, resistência crítica e interesses actuais: Uma conversa com Kenneth Frampton”, In: AAVV Arq/a, nº86/87, Lisboa, 2010, p.111-115)
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