9/7/24

Conversa sobre a escola do porto n.6: Teresa Fonseca (com Gonçalo Furtado)

CONVERSA SOBRE ARQUITECTURA E ESCOLA DO PORTO _ FEVEREIRO 2020 (Teresa Fonseca, com Gonçalo Furtado). PARTE I I. Gonçalo Furtado [GF] - Teresa, em primeiro lugar agradeço o tempo que me concedes para esta conversa. Proponho estruturarmos a conversa na meia dúzia de aspectos avançados pelo questionário que te enviara. Teresa Fonseca [TF] - Aqui vai a minha resposta ao teu amável convite e ao teu extenso questionário. Espero não ter sido poupada, nem exagerada em curiosidades, mas ainda totalmente dedicada à nossa casa comum. GF - No domínio ‘pessoal’, a minha primeira ‘questão’ visa obter informação ‘biográfica’ relativa ao período que antecede o teu ingresso no ensino superior. Entre os ‘tópicos a abordar’, sugeria que incluísses as tuas ‘primeiras afinidades com a arquitectura e afins’. TF - Nasci na Guarda, terceira de seis filhos de um pai advogado e mãe professora primária que viria depois de 1975 a ensinar Pedagogia na Escola Superior de Educação. Não frequentei o ensino primário, só tive aulas de piano, francês e educação física fora de casa até aos nove anos de idade, quando fiz admissão ao liceu. No primeiro ano, pertenci à única turma mista, (de Teresas, Vascos, Virgínias e nomes das últimas letras de alfabeto). Nesse primeiro ano, e no 2º, tive como professor de desenho, o pintor Diogo Alcofurado, do Porto, que disse que os meus desenhos sempre tinham criação de espaço, e isso era arquitectura. Decidi que queria ser arquitecta aos 10 anos e nunca mais pensei noutra coisa, até ao 6º ano em que fiz a alínea h) de arquitectura numa turma que teve apenas 3 alunos (os outros dois não vieram a ser arquitectos). GF - Falas-me da tua escolha de estudares na Escola de Belas Artes do Porto? TF - A escolha da Escola de Belas Artes do Porto, um escândalo na cidade, foi categoricamente apoiada pela minha mãe e tão acarinhada pelo meu pai como as de Direito e Medicina das minhas irmãs mais velhas. GF - A minha segunda questão versaria a tua ‘formação universitária’. Entre os ‘tópicos a abordar’ eu sugeria que incluísses as ‘afinidades pessoais, professores, cadeiras e matérias marcantes’. TF - A minha formação não foi universitária, porque a Escola Superior de Belas Artes não integrava a Universidade. Também não tenho licenciatura, sou diplomada, com muito orgulho. Chamo a atenção para isso porque ser arquitecto - e mulher - daquele tempo traduzia uma opção muito radical e determinada. GF - Poderias falar-me mais do que significava nessa altura a opção de ser arquitecta? TF - Creio que devo chamá-la de uma elite tão mais restrita quanto consciente do risco inerente das carreiras artísticas, só plausível em contextos familiares favoráveis, como o meu. Ambos os meus pais foram intelectualmente notáveis. / Dentro da Escola, fui muito feliz, curiosa, muito dedicada em todas as cadeiras, sobretudo apaixonada pelo curso. Tive a sorte de ser aluna de professores extraordinários, no primeiro ano Alberto Carneiro e Álvaro Cameira, ambos acabados de chegar de Inglaterra, e no segundo ano Fernando Távora. GF - O Alberto Carneiro e o Álvaro Cameira lecionavam num ano inicial do curso. TF - Carneiro, revolucionou a minha ideia de desenho, instalou mesmo uma concepção de desenho tão radical, estruturante do sentido de projeto, através de abstração e não ilustração das ideias, descoberta, interrogação através do desenho, correção, sobreposição de hipóteses e alternativas da forma, depósito gráfico sobre um problema num terreno, que hoje se associa a “palimpsesto”. / É o oposto da sucessiva tábua rasa do desenho em CAD; é também o que me permite entender os desenhos de projeto nos papéis vegetais de Álvaro Siza, e me tem levado a estudar os de Kahn e Le Corbusier, ultimamente os de Miguel Ângelo ou as esculturas inacabadas deste. GF - A terceira questão, versaria os teus ‘interesses actuais e futuros’. Como ‘tópicos a abordar’ eu sugeria restringires-te ao ‘campo da arquitectura e afins’ TF - Já falei deste interesse atual, gostaria de poder mostrar aos atuais estudantes, as vantagens do desenho no velho papel vegetal para ajudar à sua transferência para o CAD. Tenho tentado dizer como fazer disso uma Teoria experimental e sempre aberta, sem a priori, como sucessão de decisões e não como soma de fragmentos avulsos. GF - Lecionaste projecto e teoria. Na arquitectura… TF - Teoria, sempre, dentro da arquitectura. Depois de 22 anos de ensino de projeto, em turmas de 20 até quase 40 alunos e 12 horas semanais, aceitei a regência de Teoria do 4º ano para todos, algumas vezes 200 estudantes. Descobri depois que foi irreversível, não me foi dado voltar a Projecto e manter o gosto de desenhar com os estudantes em mesas. Aceitei também que o meu papel não voltaria tão cedo ao projeto e obra, depois de 10 anos de paragem da vida profissional, mas pode ter utilidade na investigação e orientação que não terminam aos 70 anos. / São afins à arquitectura outros interesses atuais, como desenvolver ideias sobre o desordenamento do território, novos modos de vida, esbater os slogans do património (herdado) e sustentabilidade (abstracta) dando lugar à permanente criação de património e insistindo na noção de economia da terra que se pisa e que não é um recurso ilimitado (Távora dizia que é preciso tocá-la com cuidado). II. GF - No domínio da ‘actividade profissional’, a minha primeira ‘questão’ visa obter uma ‘caracterização’ sumária dessa. Como ‘sugestão de tópicos a abordar’, eu sugeria que incluísses menção ‘à tua abordagem metodológica, etc’. TF - Comecei actividade profissional cm finais de 1970, no GAT da Guarda durante 4 anos, depois, na Direcção de Projectos da Soares da Costa SA, outros 4 anos. No primeiro conheci o trabalho de arquitecto no interior do país, lidei com a escala da aldeia e da vila, foi o que chamo a minha “tropa”, intensa, para responder sobretudo à chegada de retornados das ex-colónias e integração da procura anual de emigrantes por sítios de construção da casa em Portugal. GF - Começaste então por trabalhar num GAT no ‘interior do país’, numa altura em que a arquitectura respondia ao aumento das necessidades. TF - Projectei loteamentos municipais, fogos tipo com projectos de execução, mas também uma Junta de Freguesia que ficou na memória de muitos quando a apresentei no Congresso dos arquitectos de Aveiro em 1979 e gerou um debate aceso entre o que seriam “Escolas”, a do Porto e a outra. GF - O congresso de arquitectos em Aveiro… TF - Terminei essa experiência quando fui admitida em Concurso para ensinar Arquitectura na ESBAP. Convidaram-me, entretanto, para a Direção de Projectos da Sociedade de Construções Soares da Costa (por sugestão do meu antigo professor Álvaro Cameira), onde tive a experiência de grandes projectos e concursos; desde Moçambique à Arábia Saudita, mas também dos terminais TIR de Lisboa e Porto; trabalhei para uma empresa associada de pré-fabricação de painéis de fachada e aprendi a construção no sistema túnel que foi dos primeiros anos 1980; integrei equipas de grandes engenheiros e outros arquitectos (éramos todos professores na equipa, engenheiros da FEUP e eu própria da ESBAP) mas também fui autora. / De repente, dei conta de que tinha um filho de 8 anos que não sabia a tabuada e deixei esse emprego. Fiquei só com o ensino em Arquitectura ainda na ESBAP, e comecei a fazer os meus próprios concursos e projectos. GF - A minha segunda questão centrar-se-ia nas tuas ‘principais obras’. Como ‘tópicos a abordar’ eu sugeria que contemplasses uma distinção ente as realizadas ‘como colaborador, como co-autor e como autor’. Sei que trabalhaste por exemplo no SAAL. TF - Como estudante, colaborei uns meses com António Menéres e anos com Pedro Ramalho incluindo o SAAL, tudo nos anos 1970. / Em profissão liberal tive uma co-autoria apenas. / Toda a restante obra construída e publicada no meu portfólio foi de autora. Houve projectos iniciados e até desenvolvidos por mim, com múltiplas interrupções ora devidas ao cliente ora porque decidi fazer doutoramento em 1990 e alguns acabaram por ser creditados por outros autores. / Tenho dificuldade em escolher obras principais, porque encontro ainda hoje edifícios dos anos ’90 que mantêm o carácter, com programas e terrenos difíceis cujos clientes me procuraram exatamente porque não perspetivavam soluções correntes mas ficavam cativados nas primeiras reuniões de trabalho em que encontravam maquetes para pedidos de viabilidade que foram aceites. Mantive até ao fim esse princípio de mostrar estudos e maquete dos pequenos e dos grandes trabalhos para poder estabelecer honorários e fazer contratos razoáveis, até porque só tive encomendas particulares, não venci nenhum concurso. / Não tive muitos casos de habitação unifamiliar, mas lembro meia dúzia que estão quase inalteradas passados 30 anos. A mais antiga é na Apúlia, e outra habitação rural em Vila da feira publicadas nas 2 primeiras edições de Páginas Brancas. Na terceira edição quis mostrar um grande condomínio, talvez aquele que me é mais querido, fora do centro de Matosinhos./ O IAREN, Instituto da Água da Região Norte, permanece como a minha obra ‘principal’, para usar a tua expressão. Foi-me pedida uma visita guiada pela Casa da Arquitectura há cerca de um ano e fiquei muito comovida com o estado de conservação. Talvez seja a única em que vagamente admito o estatuto de obra artística no meu currículo. O Centro de Diagnóstico Médico da Misericórdia de Matosinhos foi o meu último trabalho, sobreviveu até há poucos meses no estado original mas observo com tristeza que uma grande abertura que existia na platibanda exclusivamente para deixar ver o céu foi ocupada por um dispositivo eletrónico negro e feio, de publicidade. / Em suma, as melhores obras, permanecem incógnitas, felizmente. As que foram vandalizadas, careceram de um estatuto de autor que as protegesse. III. GF - No domínio da ‘actividade pedagógica’, a minha primeira ‘questão’ visaria as tuas ‘experiências lectivas’ na FAUP. TF - Fiz o concurso para a ESBAP em 1980 e a minha actividade pedagógica começou em 1981. Em 1985 foi a transferência para a FAUP. Lecionei projecto entre 1981 e 2002 dos 2º, 5º, 3º, e 4º anos. / Uma curiosidade que só detectei quando tive que encaixotar os materiais do meu ensino, foi o desenho no meu caderno dos ‘projetos’ de cada estudante e suas hipóteses de correcção. Não riscava sobre a folha do aluno, mas cada um via possibilidades nas suas próprias hipóteses de forma ao serem desenhadas pela minha mão. Em cada sessão progredia mantendo a consciência da sua própria ideia e autoria. No final do ano todas as soluções alcançavam mérito e originalidade. Creio que ofereci caminhos de autoconfiança, liberdade expressiva. Raramente havia reprovações nas minhas turmas. / Depois convidaram-me a reger a cadeira de Espaço Público e formas dos Equipamentos, de Teoria do 4º ano, que acompanha o programa equivalente de Projecto também no 4º ano. Durante os dez anos de projecto do 4º ano criei o hábito de reunir todos os alunos em auditório e tratar um tema ou um autor específico, mostrando sempre obras visitadas (Frank Lloyd Wright foi recorrente e comecei a tratá-lo logo em 2002, em homenagem anual a Távora; Mies, Kahn, Stirling, Barragan, Siza tiveram várias edições…). Mantenho ainda esta disciplina e terei gosto em terminar aqui a carreira, porque acho que os estudantes gostam dela e das minhas experiências novas. Altero muito os exercícios e leituras anuais. GF - A minha segunda ‘questão, versaria outras experiências para além do leccionamento na FAUP. TF - A experiência de investigação para o doutoramento foi inesquecível, de exigência, de sacrifício familiar e pessoal. GF - Foste umas das primeiras pessoas a fazer doutoramento, por volta de 1997, no teu caso com orientação do próprio Siza Vieira. TF - Não havia doutoramentos nas Escolas Superiores e aí os professores mais velhos tinham agregação. Só quando integramos a Universidade tivemos acesso e obrigação de fazer doutoramento e, no meu caso, transitei como assistente e integrei o primeiro grupo de candidatos, ainda sem haver curso formalmente organizado com parte lectiva. Aconteceu ter sido, afinal, o primeiro docente da casa a entregar a tese em 1996 e a fazer a prova pública só um ano depois. / Foi só possível e bem-sucedido pela categoria humana de Álvaro Siza, o meu orientador, o grande rigor científico e disciplina que também ele ofereceu ao trabalho. Parecendo paradoxal, não é reconhecida a sua exigência científica, sendo mais correntemente circunscrita à sua condição artística, mas é mais provável que o elevadíssimo nível das suas realizações só se alcance pelas virtudes da paciência, exaustividade, e humildade científica que a sua personalidade incorpora. GF - Em 1997, 2002 e 2007 ocorreram avaliações institucionais da FAUP, que cuja a responsabilidade de coordenação te foi atribuída. TF - De facto, foram três edições de coordenação da avaliação institucional da FAUP, com a minha primeira nomeação em 1997, o ano do doutoramento, e depois em 2002 e 2007. Corresponderam às direcções dos professores Manuel Correia Fernandes, Domingos Tavares e Francisco Barata e senti-me honrada com a nomeação. Foi das mais exigentes realizações (científicas) da minha carreira, e acho que servi bem o encargo. Primeiro tomei a iniciativa de estudar a tarefa na Reitoria estudando processos de outros cursos e apercebi-me da complexidade e rigor do trabalho, depois convidei colegas das várias categorias e áreas disciplinares para constituir equipas e pedi a sua nomeação aos directores, para além da minha pessoa. Criámos métodos e alguns instrumentos de inquérito originais, que a própria reitoria me convidou a apresentar num seminário internacional de avaliação. Essas três edições foram as últimas desenvolvidas internamente e interpares universitários. Depois foi criada a Agência de Acreditação. / Penso que fiquei a conhecer profundamente o curso de Arquitectura da ESBAP/FAUP pelo menos até 2008. Os dossiers são hoje da secção de reservados da Biblioteca, mas a documentação é preciosa para quem ainda queira descobrir o cerne do ensino da agora dita “Escola”, quando os planos de estudos estabeleciam uma formação integrada no projecto e paulatinamente se foi fragmentando em disciplinas cada vez mais autónomas, até à presente disputa de unidades de crédito por cada uma. GF - Isto é, até quase a Bolonha. A minha terceira pregunta versaria as tuas ‘experiências extra FAUP’. Por exemplo ‘noutras instituições’. TF - A instituição que me ofereceu experiências muito relevantes foi a FAUTL, agora FAUL, desde 2001. Conheci os colegas num júri do Prémio Secil Universidades e que imediatamente começaram a convidar-me para cursos internacionais de projecto, no verão dos anos seguintes. Foi fascinante para mim, além de voltar ao projecto, conhecer outros ensinos das escolas espanhola e italiana sobretudo, além da própria FAUTL, e fazer amigos de investigação até hoje. GF - No domínio da ‘memórias pessoais’, a minha primeira ‘questão’ visaria informação relativa a ‘período anterior à FAUP’. Como ‘tópicos a abordar’, sugeria que incluísses ‘eventos, protagonistas, factos marcantes ou curiosidades’ . TF - Já falei do meu professor de desenho Diogo Alcofurado, fundamental e do facto marcante de não ter ido à escola primária (portanto nunca tive TPC na vida... fui uma garota criada em divertido regime de estudos com francês, equações matemáticas, Camões aos 8 e 9 anos... porque era o que as irmãs mais velhas andavam a estudar). Aprendi piano e pedi para deixar porque tocava mal e gostava bastante de música. Depois tentei guitarra e foi outro falhanço, sobretudo para o professor que vinha a casa. Até chegar à ESBAP sempre estudei depois de jantar e ouvia jazz pela noite fora. (Fora das aulas, fazia as compras semanais, cozinhava e passava a ferro numa casa cheia de gente). De noite o meu pai trabalhava no andar de baixo e fumava SG. / Bastante jovem comecei a ir a Madrid com os meus pais, e aos museus. Antes de entrar na ESBAP já tinha estudado os três volumes completos de L’Art et L’Homme, em francês, porque a escola não abria portas antes de Abril. / Continuo a gostar de ler francês, sobretudo Camus e os seus cahiers. GF - A minha segunda questão visaria ’o período da FAUP (pré-Bolonha 2008). Como ‘tópicos a abordar’, sugeria que incluísses igualmente ‘eventos, protagonistas, factos marcantes ou curiosidades’. TF - Comecei como assistente de Alexandre Alves Costa mas com a minha própria turma, autónoma. Observava e imitava o seu ensino, sobretudo no primeiro trimestre sem precipitação na formalização, aparentemente menos produtiva do que noutras turmas mas com resultados mais sólidos e evidentes nas fases seguintes. Foi o primeiro professor a encarregar-me uma aula teórica para todo o ano. GF - Dizes teórico-prática? Depois lecionaste noutras disciplinas, incluindo uma coordenada por Siza Vieira. TF - Fui assistente de Siza, coordenador do 5º ano, e na turma de projecto estávamos três docentes juntos, Alfredo Matos Ferreira, Jorge Gigante e eu, própria - um raro luxo intelectual e amigo. Acompanhei as aulas de Teoria que Siza dava e, vinte anos depois, adoptei muita da sua pedagogia. Lembro-me dos seus métodos, de constituir grupos de estudantes para analisarem e apresentarem na aula obras de autores escolhidos; por vezes emprestava-lhes livros dos autores menos conhecidos e actuais. GF - Obrigado por nos partilhares como era esse método pedagógico do Siza - análise em grupo de obras de autores. / Foste professora de várias gerações, lembras-te de alguém especialmente marcante? TF - Marcantes foram alguns estudantes e recordo júris de outros, que hoje são doutorados, interessantes críticos da atualidade portuguesa. Seria injusto não referir tantos e tão bons arquitectos, que até hoje me querem bem! GF - Como vês o período antes de Bolonha, processo ocorrido por volta de 2008? TF - Uma das coisas melhores antes de Bolonha era a individualidade das provas finais, dada a sua dispersão ao longo do ano. Não me lembro quando passou a ser um pacote numa semana de novembro, not good, em que tudo fica parado supostamente para os estudantes comparecerem, mas as plateias estão desertas, salvo aquelas excepções, afinal casos individualizados, cuja distinção se espera. GF - Pois, com as provas de dissertação pós Bolonha, passou a ser tudo mais concentrado numa semana. / A minha terceira questão, versaria um ´período recente (i.e. após 2008)’. E como ‘tópicos a abordar’, sugeria novamente que contemplasses‘ eventos, protagonistas, factos marcantes ou curiosidades”. TF - Doze anos é muito tempo... GF - A quarta (e última) questão desta primeira, visa o ‘futuro’? TF - Imprevisível... PARTE II IV. GF - Queria-te agradecer pela disponibilidade para esta segunda parte da entrevista. TF - Sim. GF - Estavas-me a começar a falar de dois trabalhos que coordenastes. Um deles que eu penso que inclua também o assistente Fernando Lisboa na equipa. TF - Essa foi a terceira. O Fernando Lisboa participou na última avaliação, fez parte na terceira equipa. / Portanto houve, no âmbito da lei da avaliação do ensino superior um projecto muito interessante, porque Portugal foi um dos primeiros países em que, a nível da lei, ou melhor do parlamento, foi votada a avaliação do ensino superior. O que é uma coisa extraordinária. / Termos um parlamento que, em 1995 legislou sobre o controlo do ensino superior. Não sei se sabias disso? GF - Portugal foi dos primeiros países a legislar nos sentido do controle/avaliação do ensino superior? TF - Uma coisa pioneira, porque estados mais avançados não faziam. Mas nós tivemos uma época extraordinária, em que foi tomada atenção a esta problemática. / E o curioso é que foi criada uma estrutura na altura, a qual criou uns guiões para todas as faculdades, ou melhor, não era incidente nas instituições, mas sim nos cursos, na avaliação dos cursos. GF - As avaliações foram então inicialmente focadas nos cursos. TF - Algo que veio muitos anos mais tarde, uns 17 anos mais tarde, a dar origem à Agência de Acreditação do ensino superior. / Ora, nos anos de 1990, houve em Portugal essa estrutura, com a lei da avaliação. Bem como a criação de um organismo independente, que chamou-se comissão nacional de avaliação do ensino superior - CNAVES. GF - Como explicas, criou-se depois essa comissão nacional de avaliação. TF - Teve a particularidade, de ter sido considerado pelas Universidades, a pertinência por demais de que fosse a própria Universidade a auto avaliar-se. Que é um projeto extraordinário. GF - As faculdades autoavaliaram os seus cursos. TF - Porque na época a comissão nacional e o CNAVS e a FUP (Fundação das Universidades Portuguesas) eram dois organismos que se juntaram. GF - Ah. TF - Fizeram uma coisa muito interessante, que corria sobre os auspícios do professor Alberto Amaral, o professor Renato Araújo de Aveiro e um professor também extraordinário do Minho, Sérgio Machado dos Santos. GF - Passava já algo pela nossa faculdade de ciência da educação? TF - Não, não. Isto não corria nada nas ciências da educação. Isto era um dever das faculdades se auto avaliarem e aos seus cursos. GF - Em 1997 inicio o processo de avaliação. TF - Pelo menos, nós aqui fizemos o primeiro ciclo de avaliação, entrámos logo no primeiro ciclo. Tinha-me doutorado em Março de 1997e em Outubro fui nomeada. / Foi um projeto que eu imediatamente reconheci como algo que só podia ser bem feito por uma equipa. De modo que fiz convites a vários professores da casa e solicitei a sua nomeação formal por parte dos conselhos diretivos. GF - Seria o Correia Fernandes que estaria na altura na direcção da FAUP. TF - Na altura foi Correia Fernandes, integrou a minha equipa o professor Domingos Tavares que era catedrático mas não ocupava na altura qualquer cargo de gestão e amavelmente concedeu-me a colaboração. GF - E o Domingos Tavares como elemento da equipe participou no debate? Sim, sim. Foi uma pessoa importantíssima, com as suas intervenções, sempre curtas e cirúrgicas, mas acutilantes. É a parte da sua grande inteligência. GF - Sim é pragmático. TF - Ele então não pertencia a nenhum órgão de gestão na época e o foco não era a gestão da casa, mas sim a qualidade do ensino e a participação de todos os grupos de pessoas. GF - A direção dele é a seguir. TF - Entretanto, ofereceu o seguinte contributo, que viria a praticar-se: A auto-avaliação como “dar a conhecer”, “mostrar” os dados, em vez de opiniões e interpretações. Muito de acordo com o meu próprio perfil de investigadora. GF - A primeira fase compreendia a autoavaliação pela faculdade e uma análise do resultado por por outra faculdade. TF - Era uma fase que era a auto-avaliação. Fazia-se o dossier da auto-avaliação, o qual era enviado para o CNAVES/FUP que, depois, nomeava uma comissão externa, que avaliava o relatório da auto-avaliação e fazia a visita e reuniões na FAUP com diferentes grupos. / Com o professor Domingos Tavares, já disse, nós estabelecemos aqui na FAUP uma ideologia de avaliação “sui generis”, que foi: avaliar é deixar conhecer; auto-avaliação é mostrar o que há. GF - Recolheram informação de todos os grupos da comunidade académica – pessoal docente, funcionários, discente. TF - Entendemos produzir dados com todos os grupos da comunidade académica. Desde os funcionários, aos professores e aos estudantes, e ao pessoal não docente. Imagina! Recolher e produzir quantidades de informação - dados - e desenhar a forma de os mostrar, em tabelas e quadros que se tornassem de leitura sintética. GF - Resultou num levantamento do que era a faculdade nessa altura? TF - Um levantamento do curso. GF - No concernente ao final dos anos 90. TF - Foi 1997. A coisa que mais me interessou nesse projeto, depois de convidar colegas e constituir equipas, foi criar uma série de instrumentos que foram postos á disposição dos vários grupos da comunidade. GF - Que instrumentos de avaliação incluíram? TF - Inquéritos de muitas formas. E conseguimos algo que foi de tal maneira avassalador o número de respostas aos inquéritos que chegou aos 70%. GF - Impressiona essa resposta próximo dos 70%! TF - Que era uma coisa anormal! Porque o índice hoje de respostas, que os inquéritos têm, é de 20% ou. GF - Referes-te aos online. TF - Os que estão online hoje. Enquanto que nós naquela avaliação produzimos uma informação bruta de 60, 70 ou 80%. GF - Tem uma representatividade incomparável. TF - Foi uma coisa astronómica que ficou. GF - Eu sei que o resultado é grande, até porque uma vez vi a Teresa a passar com o dossier. TF - E fui depositar na biblioteca. GF - Vários volumes. TF - Tem um volume que é o relatório, e tem um segundo volume, muito interessante, porque tivemos uma avaliação feita em duas facetas. Dentro da equipa. um elemento, a professora Maria Helena Morais de Albuquerque, teve como tarefa independente e solitária, recolher todos os documentos produzidos em sede de conselho pedagógico e conselho científico, durante o período em apreço a que chamou “uma história no tempo”. GF - Ah, a equipe integrava ainda outro elemento (Helena Albuquerque ) equipe, que compilou nesse historial documentos proveniente dos conselhos pedagógico e cientifico. TF - “O curso de Arquitectura no tempo” é um volume. Nem faz ideia o que custou fazer a recolha de todos os despachos de conselho cientifico, de conselho pedagógico…. mudanças de planos de estudo, discussão, contributos de professores com sugestões. Documentação de variadíssima índole. GF - Pois, houve distintos planos de estudo… TF - Há documentos produzidos pelo professor Nuno Portas, professor Correia Fernandes, coisas interessantíssimas que estão nesse volume separado. GF - Ah. TF - O volume dois… Eu tenho aqui os livros. O exemplar da comissão nunca saiu desta estante. GF - O relatório teria 3 umas centenas? TF - Não, o segundo volume tem aproximadamente 200 páginas e é constituído mesmo com numeração página a página. E o relatório propriamente dito tem 350, 390 páginas, para aí. GF - Mas, onde está sintetizada a informação dos inquéritos (docentes/disciplinas, etc)? TF - Foi sintetizada a informação dos inquéritos em forma de quadros. Quadros que mostravam o desempenho dos docentes nas disciplinas, desde regentes a assistentes. E também outra coisa que era muito curiosa na investigação que fizemos, dirigimos aos estudantes e aos professores assuntos que não eram previstos estar na avaliação GF - Ah. TF - E que foram por exemplo, a sua consideração: se os planos de estudos eram interessantes, se as condições das instalações eram boas ou más, se estavam satisfeitos com as expectativas do curso, porquê que estavam neste curso? Coisas de índole substancial, não quisemos limitar-nos à casuística das disciplinas e muito menos à personalização (focagem do docente A ou B) apresentando os resultados em termos dos colectivos por disciplina. Quisemos envolver a comunidade toda sobre as questões gerais do curso e da escola… Coisa que ninguém tinha feito. GF - Era uma avaliação pelos protagonistas. TF - Sim. GF - Tentaram dar uma resposta, ao vos encomendado, que fosse productiva. TF - Senti que a avaliação do curso tinha que servir… E isto é o grande propósito muito bem equacionado pelo professor Domingos Tavares dentro da comissão… (aqui enquadrado pelo colectivo). A sua contribuição está dentro do colectivo, da teoria da avaliação que nós fizemos. GF - A filosofia de uma autoavaliação produtiva e com utilidade para o colectivo/escola e sua gestão estratégica. TF - A filosofia da avaliação foi, esta avaliação é em primeiro lugar de utilidade interna. GF - Conhecer forças e debilidades, etc TF - Para poder melhorar as políticas. Cirurgicamente localizar problemas, e os pontos fortes e fracos. Coisa que nem sequer era previsto que nós fizéssemos. Mas, ao entregar aquele dossier entendemos que talvez a escola, a nível da gestão, pudesse fundamentar melhor estratégias. O que nunca me foi dado a conhecer. GF - Mas tens feedback se foi analisado? TF - Não tenho qualquer feedback interno do que aconteceu. GF - Ah. TF - Não, nunca tive porque tiveram o caminho que tiveram de ter e as minhas funções terminavam quando terminava a entrega do dossier. Só continuavam quando era para me apresentar perante a comissão externa. GF - Pois, o processo envolveu o trabalho da avaliação interna, e uma comissão externa. TF - Facto que foi apenas uma vez utilizado, porque a comissão externa não teve necessidade de ouvir a comissão de avaliação interna. Das comissões externas que vieram não foi sentida a necessidade de conhecerem quem tinha feito o relatório. (Risos)… Foi uma coisa curiosa! Também de humildade para mim e foi necessário cultivar. Eu nunca vi esse trabalho como algo para me notabilizar, fi-lo por serviço. / Nunca foi necessário à faculdade, explicitamente. GF - Mas, como antes dizias, estão na biblioteca esses documentos? TF - Estão, estão… os três. GF - O de 2002 continuou a ter um segundo volume historiográfico? TF - São dois dossiês. GF - Depois o último foi em 2008? TF - Exacto. Mas os dossiês têm a data de 1998… estão catalogados na biblioteca em 1998 e em 2003. Porque começava no final do ano anterior e terminava no seguinte. / O primeiro era dessa dimensão, 300 páginas mais o segundo volume da professora Helena já tinha só 200. O de 2007/2008 tem uma estrutura completamente diferente. GF - Alteraram a estrutura. TF - Isso é muito engraçado! GF - A Helena Albuquerque também participou na segunda avaliação, dando continuidade ao historial? TF - Era professora de desenho convidada. De geometria. / A segunda edição tem também, como segundo volume, a continuação do anterior. A professora Helena Albuquerque, preparou um segundo volume na segunda avaliação, que continua o primeiro. A tal história no tempo. GF - E em 2008? TF - Em 2007/2008 já não existia em funcionamento a estrutura anterior de avaliação, porque passou a haver, suponho eu, a comissão de acreditação. Não sei. GF - Em 2007/2008 acho que a avaliação adquiriu outra denominação. TF - Foi, avaliação institucional da Universidade do Porto. E a Universidade do Porto pôs em curso um processo interessante também, ainda muito influenciado pelo projecto anterior. GF - A universidade colocou as unidades orgânicas a avaliarem-se. TF - Colocou as suas faculdades a avaliarem-se como faculdades e não por cursos. Portanto, foram as instituições, as faculdades, as unidades orgânicas, mais precisamente. Isso foi uma das facetas de 2007/2008. Foram as faculdades que se avaliaram, fizeram auto-avaliações e depois houve um sorteio dentro das mesmas para produzir as comissões de avaliação externas. GF - Á FAUP calhou ser avaliada pela faculdade de economia. TF - E por acaso, a nossa faculdade (FAUP) foi avaliada pela FEP (Faculdade de Economia). a nossa faculdade avaliou aqui a faculdade de Ciências da UP. A FCUP publicou o relatório da nossa avaliação externa num livrinho. Ficou extremamente honrada com a nossa avaliação externa e, de gratidão, publicou o relatório imediatamente. GF - A comissão que coordenavas teve sempre a mesma composição? TF - Não, não. A comissões mudaram sempre e salvo a Helena Albuquerque, convidei sempre mais três ou quatro professores diferentes, na última incluí uma estudante finalista e um funcionário responsável pela informática. GF - Tu coordenaste todas as três. TF - Fui eu sempre nomeada. Na primeira, era coordenadora da avaliação interna. Na segunda fui coordenadora da avaliação interna ou auto-avaliação E na terceira foi a universidade do Porto, e não a FAUP. Fui presidente da comissão da avaliação interna. GF - Como explicas, em 2007/2008 passou a ser uma avaliação interna . TF - A terceira foi avaliação interna. E a diferença substancial na terceira é que a universidade do Porto exigiu um máximo de 50 páginas sendo um dossiê critico da responsabilidade da presidente. O papel de presidente na avaliação implicou que a redação do documento fosse critico e sintético, muito interessante. E o mesmo se passou na avaliação externa. E curioso! GF - Como explicas, o relatório passou a ser uma síntese crítica pelo presidente da comissão interna. E já não tratava meramente o curso, mas o funcionamento da faculdade. TF - Já não era sobre o curso de Arquitectura, mas sobre o funcionamento da faculdade. Como é evidente, eu gostei imenso dos trabalhos… mas foram transcendentes. O de 2007/2008, ocupou a minha primeira licença sabática… não pude fazer nada mais de investigação a não ser isso. Levou muito tempo, muito esforço e muito desgaste. V. GF – No período da segunda avaliação, o Domingos Tavares exercia como director na faculdade. Que feedback é que houve nessa altura, dado que na direção estava alguém que até estivera na comissão… TF - Ora bem, na primeira ainda foi o professor Correia Fernandes. Na segunda não sei se foi o professor Domingos Tavares. Na terceira foi o professor Francisco Barata. Não eram diretores, eram os Presidentes do Conselho Diretivo. GF - Mas a verdade é que ocorreram três processos de avaliações interna ao longo de três sucessivas direções na faculdade. TF - Foi. GF - Voltaste a sentir ausência de feedback nos três períodos? TF - Nunca senti. Ou melhor, nunca me foi dado a conhecer. GF - Pessoalmente… TF - Eu achei interessante. Penso que aquilo que aprendi nesses 15 anos foi que faz parte da natureza da FAUP as tarefas se cumprirem com espirito de missão, Havia muita dedicação das pessoas que eram nomeadas para missões: montagem de anuárias, até montagens de exposições. Há um espirito de sacrifício muito grande da parte das pessoas que são nomeadas e não há hábito de qualquer formalidade a posteriori … GF – Antes muitas encomendas eram feitas informalmente TF - Durante a avaliação desses três ciclos, descobri e fiz o levantamento de incontáveis missões que a FAUP desenvolveu e que foram reportadas nos relatórios. GF - Ah TF - Sempre com este ou aquele nomeado para fazer, sem hábito por parte da direção, de formalidades no encerramento delas. Pelo menos, não sei, não tive qualquer conhecimento. GF - Os últimos conselhos directivos na FAUP tiveram novos gestores TF - Nos últimos conselhos directivos penso haver gente mais nova e que tem feito missões, mas não sei se poderão, por timidez ou por natural descrição, achar que deve haver uma carta. GF - Entraste para a FAUP nos anos 80, presumo que entre a comissão de instalação presidida pelo Fernando Távora e a direcção do professor Alexandre Alves Costa. TF - Eu, minto! Porque eu tive uma carta que sempre coloco no meu currículo vitae, entre os prémios e reconhecimento, eu tive um reconhecimento em 42 anos de FAUP. Foi-me enviado pelo professor Alves Costa em 1988, sei quase de cor. A carta veio em 1989 pela montagem de uma exposição da FAUP na feira de indústrias culturais. GF - A FAUP expôs na FIL de Lisboa? Ou seja, coloco sempre no meu currículo vitae o reconhecimento recebido pelo presidente da FAUP. Reconhecimento pela montagem do pavilhão da FAUP nas industrias culturais em Lisboa na FIL, portanto é a minha medalha de honra aqui da FAUP. Foi em 1889 porque tinha montado o pavilhão da FAUP em 1888 em Dezembro, engraçado não é? É bonito e soube-me muito bem! Uma em 42 anos! VI. GF - Permite-me, tomar os 3 ciclos da escola entre o final dos anos 90 e meados dos anos 2000s. Identificas transformações em projecto? TF - Não tive feedback explícito, mas, por exemplo, da primeira para a segunda sentiu-se uma transformação enorme a nível das regências de projecto, porque na primeira as pontuações atribuídas pelos estudantes às regências de projeto tinham sido muito inferiores às ponderações que os estudantes davam aos assistentes. E no ano seguinte, todas as cadeiras de projecto passaram a ter coordenadores ou regentes, tão activos que inclusive se criou a hora teórica de projecto. Foi muito engraçado. GF - Também não há relação desses marcos cronológicos com discussões ou mudanças dos planos de estudo? TF - Sim, mas não foram. Por acaso, curioso que não foi coincidência. GF - Ah. TF - Os 2 primeiros relatórios de avaliação têm segundo volume, compilações feitas pela professora Helena, e quadros em excel, com a evolução de todos os planos de estudo da ESBAP/ FAUP. Que é uma página absolutamente notável, é um mapa muito interessante para quem queira estudar a evolução do ensino na FAUP. GF - Mas podes partilhar memórias pessoas do período após avaliação 2008? TF - O mandato do professor Barata já não se pode considerar porque o período terminou quando ele entrou. Eu já não o abrangi. O que não estudei, não posso comentar. GF - E nas avaliação que estiveste envolvida, em termos do domínio científico? TF - Relativamente à FAUP concluímos que foi cientificamente bem governada nos períodos que falámos. Muito interessante, com muita vivacidade a nível do debate de ideias desses primeiros períodos que eu estudei nas avaliações. Havia uma grande quantidade de documentos internos de conselhos. GF - E no concernente ao período até 2008, em termos do domínio pedagógico, houve alguma constância na direção de Anni Gunther. Penso que só posteriormente à sua aposentação foi substituída pelo Rui Braz. TF - No período que analisei, houve uma grande continuidade. Aquilo que se percebeu da avaliação é que havia um projecto escola consistente, muito permanente, uma transmissão da herança de ensino e pedagógico na busca de soluções. GF - Na análise do desempenho do cientifico-pedagógico tu pessoalmente identificas um projecto escola. TF - Do pedagógico e do científico. GF - Ah. TF - Mas houve …. uma inquietação enorme por aperfeiçoamento dos planos de estudos, é o que está expresso naquele trabalho. A prova é que houve variadíssimos ajustamentos aos planos de estudo, não houve preguiça da faculdade…. Até 2008 o que eu posso dizer, só posso falar até 2008, foi há 12 anos e o balanço é positivo. Foi uma instituição que teve inquietação teórica e estratégias de projecto pedagógico que incluíssem mais convidados, estimulassem cadeiras novas, algumas tecnológicas, mas houve uma enorme tradição. GF - Os CADS com o Fernando Lisboa até falece em 2008, e que remete pelo menos aos anos 90s? TF - Eu acho isso uma enorme herança de inquietação e atualização! GF - Nesta segunda parte já não falámos do período entre o teu ingresso nos anos 80 e meados dos anos 90. TF - Transitei para a FAUP em 1985 continuando na ESBAP porque a construção do novo edifício da FAUP só começou em 1989. Antes, eu tenho um percurso muito rico. GF - Na primeira parte referimos alguns aspectos concernente aos anos 80s. Gostava que também falasses do período de 2001, em que fizeste a tua admissão a professor associado. TF - Para esse concurso entreguei um relatório chamado “O ensino de projeto na escola do Porto - 1981/2001”, que ao longo dos vinte anos, ano por ano, inclui os sumários do meu ensino, quem foram os regentes, quantos alunos tive, quais foram os temas, quais foram as aulas que dei teóricas, quais foram as prácticas, quem foram os professores que me sugeriram que lecionasse uma sessão teórica, portanto, tem 20 anos relatados. GF - Quando eras professora de projecto eras também conhecida pelos seus cadernos pretos, e foi do que tinhas lá que partiste? TF - Foi dos cadernos que eu transcrevi todo o material para o segundo volume (dossier pedagógico). Transcrevi dos meus cadernos desenhos, os meus sumários, a crítica aos alunos, há um ano lectivo em que registei todas as conversas que tive com todos os alunos ao longo do ano. O que mandava fazer, o que dizia que estava mal, porque foi quando comecei o doutoramento e aí quis registar um quotidiano de um dia normal de projecto. GF - Sei que tens de acabar agora a conversa por compromissos, agradeço o tempo que dispensado. Obrigado TF - Nesta segunda parte da entrevista conversámos bastante (pela couriosidade especial que possuías) na avaliação dos cursos em que participei há trinta anos. Já na primeira parte, abordámos assuntos bastante mais diversos. / As memórias importantes dos meus 43 anos de ensino na ESBAP/FAUP têm milhares de nomes e rostos dos alunos da ESBAP, e dos agora chamados estudantes da FAUP, de quotidianos preenchidos com a minha voz enquanto desenhei nos cadernos e me movi em volta das mesas de maquetes. Outros dias, milhares também, preenchidos com preparação de projeções de slides com palavras selecionadas para cada aula, muitas vezes traduzidas em inglês, continuando a manter a minha voz. Todas as compilações das ‘mil e uma aulas’, traduzidas nos relatórios dos concursos académicos e depositadas na biblioteca da FAUP, me parecem ainda hoje rigorosas e claras, mas fruto de infinito tempo de trabalho na solidão da escrita, sem o som da festa que, com alunos e orientandos, celebrei em cada uma dessas aulas e sessões de orientação.

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