Partilha,
a pedido do Departamento Cultural da AEFAUP
Gonçalo Furtado, Janeiro 2021
Solicita-me
o Departamento cultural da AEFAUP que partilhe com a comunidade escolar um série
de interesses/influências/sugestões.
Vi recentemente
o FILME sobre Hannah Arendt de
Margarethe von Trotta, filme que integrou a selecção oficial de 2012 do “Toronto
International Film Festival”. A filósofa integra o leque de pensadores
referidos em “Teoria 1”, designadamente a aula que dedicamos à Escola de
Frankfurt (bem como à Fenomenologia), atendendo a que ilustra de forma exemplar
o que deve ser o “pensamento crítico”. Após ser discípula de Heiddegger, Arendt
analisou o totalitarismo, e enojou-se com o discurso daquele na qualidade de director
de Faculdade de Berlim. Já nos EUA, cobriu o julgamento do nazi Adolf Eichmann,
pretexto para alertar para a perversão de uma “banalidade do mal” em “A condição
humana”.
Tenho
dificuldade em selecionar um LIVRO das
minhas estantes. Mas acabo de passar os olhos pelo pequeno livrinho “Fernando
Pessoa: Biografia ilustrada”, da falecida licenciada em filosofia Paula
Balreira, oferecido pela sua prima ao meu filhote de 9 anos. Andando a dedicar
os últimos anos a escrever sobre arquitectura Portuguesa do século XX, Fernando
Pessoa (1888-95) é uma referência incontornável. Neto de Governador civil do
Porto, passou a sua infância perto do Chiado e, depois, viveu na África do Sul com
o padrasto, só regressando aos 17 anos. Foi influenciado por modernistas (Joyce,
Pound, Eliot etc) e estudou na Biblioteca nacional tanto os filósofos gregos (pré-Socráticos,
Aristóteles e Platão) como os Alemães (Kant e Hegel). Envolveu-se com o círculo
intelectual Lisboeta do café “Brasileira” e do “Martinho da Arcada”,
designadamente na discussão sobre as novas ideias Futuristas e Modernistas
(Marinetti, Picasso, Nitsche e Freud). Desistiu da Universidade, foi correspondente
estrangeiro, tradutor, e publicitário (Coca Cola etc) e editor das revistas Athena,
Seleçcão, e sobretudo da Orpheu (fundada com com Mário Sá carneiro, Amadeo
Souza Cardoso e António Ferro etc) responsável pela introdução do Modernismo em
Portugal. Virgem aos 30 anos, teve como namorada Ophélia Queiroz. O seu único livro
publicado em vida em Português, foi “Mensagem” de 1934. Morreu um não depois,
tendo recebido o Prémio Antero Quental do Secretariado da Propaganda Nacional. A
sua vida foi contemporânea á primeira Guerra Mundial, ao governo de Sidónio
Pais assassinado em 1918, mas também à censura do Estado Novo de 1933
justificando a autoria de poemas anti-Salazaristas. Deixou uma arca de madeira com
obra vasta e escrita com heterónimos.
Sobre DISCOS, poderia partilhar uma memorabilia
heterogénea que passa por Sex Pistols, Gil Evans, Naked CIty, Laurie Anderson, Portished,
Jeff Buckey, Interpol, etc.. Mas o último disco que comprei foi há 1 mês no “Jazz
ao centro”, da jovem formação experimental “Chamber 4”, composta por Luis
Viriato (Trompete), Valetim Ceccaldi (Cello), Théo Ceccaldi (Violino) e Marcelo
dos Reis (guitarra preparada). “Live at Ler devagar /LX factory de Lisboa”, a
17 de Maio de 2013, editado pela FMR Records em 2015. Já no que tange a uma MÚSICA singular, passei o “ano-novo” a
ouvir a ouvir “Mama Rose”.
O meu ARQUITTECTO de eleição é, como
esperarão, Cedric Price, maverick da arquitectura Inglesa. Estudante com Korn, foi
autor do notável “Fun Palace”, estudando por Mathews. Mas também do “Generator”,
que investiguei no MoMA de Nova Iorque e no CCA de Montreal, que publiquei pela
Semear palavras; e que então expusemos
na FAUP. Ou ainda “Japan Net”, sobre o qual também publiquei investigação, no
IIAS da Alemanha. Price era um “labour”, e defendia o que denominava por “antecipatory
architecture”, projectando com a máxima “Technology is the answer but what was
the question?”
Em termos
de um PROJECTO singular, não posso
senão salientar a FAUP, numa altura do seu 40º aniversário. Este projecto da
autoria de Álvaro Siza Vieira e acompanhamento de Adalberto Dias é,
sinteticamente (e parafraseando Alves Costa), a mais bela escola do mundo. O
programa/projecto foi acompanhado por uma comissão que integrava, entre outros,
Alves Costa e Domingos Tavares, tendo atravessado várias fases. Possui uma
configuração espaço-funcional que oportunamente analisámos (com Tatiana e
Miguel Serra), por “space sintax”, trabalho de análise este autorizado pelo
autor. Projecto e espaço que é, em si, um manifesto pedagógico. Poder-se-ia questionar
a divisão dos anos curriculares por torres ou das turmas em salas/”ateliers”.
Mas sobressai do projecto, a verdadeira “learning street” (Hertzberger de galerias
e espaços de uso colectivo que, permanentemente, que nos recorda o desejo de
uma “Escola do Porto”. Desejo que nos deve inspirar, sobretudo em tempos de
mudança intermediados pela instabilidade do confinamento/Covidis. Uma espacialidade
que nos acolhe pela manhã (com inesquecível luz), que nos abraça paternalmente
como família, e que sempre nos surpreende incentivando a indagar as
potencialidades do melhor futuro.
Já no que
tange a Arte, o meu ARTISTA predilecto
é o fotógrafo Robert Frank. Ainda que, em termos nacionais, tenha escrito nesta
última década sobre artista amigo, de nome António Azenha. Trata-se de artista
com vasta obra de performer, que vive como professor do ensino secundário.
Gosto em particular da sua linha escultórica, que remota à obra “Pião”, e que recicla
e re-significa brinquedos de crianças. Recorda-nos um imaginário de sonho e criatividade,
que por vezes esquecemos na submersão do quotidiano. Sugere também paralelos
com a Arquitectura, aludindo a espacialidades onde decorre a vida – da casa na
primeira infância, ao pátio, à escola, à urbe e à pólis. Propõe o fascínio do
sonho para lá da crueza do real, um apelo ao infinito potencial por detrás do universo
da Arquitectura. Abertura deveras pertinente em tempos de covidis, bem como de mutação
da nossa (já com 40 anos) escola/Faculdade.
No comments:
Post a Comment