writings on architecture, design and cultural studies (incl. cedric price, gordon pask and many other stuff)
5/25/23
NAPKINS na Casa da Esquina: Memórias recentes, Tríades e desenhos.
NAPKINS na Casa da Esquina: Memórias recentes, Tríades e desenhos.
(Gonçalo Furtado)
“Napkins” constitui termo inglês, que se traduz como guardanapos. A escolha este título para as série de desenhos exposta, remete para a fragilidade dos suportes físicos da maioria deles, bem como para espaços quotidianos, e a efemeridade desses momentos fixados./
Duas centenas de desenhos, feitas em pausas do dia, com traço rápido (maioritariamente a caneta) e aguada (maioritariamente de café)./
Embora sempre tenha tido atração pelo desenho, a verdade é até ao ingresso no ensino superior dediquei o meu tempo livre muito mais à música e fotografia. (Uma tríade) Quem desenhava bem era um dos irmãos que tenho, com 11 meses de diferença./
No início dos anos 90s, aquando da licenciatura em arquitectura, fui mais ou menos obrigado a imergir-me (como presumo ocorra com uma maioria de jovens que frequenta o ensino artístico) nesse tipo de visão e relação com a realidade que é o desenho./
Que me recorde, tive algumas aulas de desenho ou pintura com José Guimarães e Sá Nogueira em Vila Nova de Cerveira, com Joaquim Machado, com Emílio Remelhe no CAPC, com José Grade e Francisco providência. Recordo como o Francisco frequentemente enunciava que “desenho”, é um termo remete etimologicamente para “disegno”, para designar no literal sentido de dar nome. Ora, e dar nome às coisas, é forma como se nos tornam familiares, e as conhecemos ou tomamos por conhecidas./
Na primeira década do século - absorvido pela academia, a escrita e a crítica para revistas (uma tríade) - retomei a fotografia (com minoxs e afins, polaroids, descaráveis, primeiras, pequenas digitais compactas e depois telemóveis) mas desenhei muito pouco. (outra tríade)/
Em partir de 2011, voltei a desenhar para sedar muitas pausas do dia e depois como actividade artística em conjunto com o meu filho até ao ingresso no ciclo. (Tríade)./
Resido ao pé da Casa da Esquina e, desde 2019 visitei alguns eventos com artistas amigos, recordando por exemplo o debate no último LineUp, com máscaras em plena pandemia Covidis./
No contexto de conversas com a Sandra e Filipa ao longo de anos recentes, alimentámos a ideia de expor alguns dos desenhos que acumulara desde 2011, bem como o título da exposição e, futuramente, de uma publicação./
Em 2023 decidimos concentrar a exposição em período posterior a 2019, altura estranha da minha vida, em que o Covidis paradoxalmente nos imenso tempo mas simultaneamente nos afastou daqueles que nos são mais queridos. Bem como ano em que realizei uma exposição na Escola Dona Maria, incentivado por amigo com quem jantávamos semanalmente no Reis e pelo António Azenha que lecciona na escola. Bastante desenhei entre 2019 e 2022, sedando as pausas do dia, como se de memórias expectantes se tratasse./
Em Maio de 2023, em conjunto com a Sandra, selecionámos 73 desenhos da imensidão acumulada em pastas A3, 73 desenhos. Sozinho em casa, procedi a uma segunda selecção de aproximadamente 120 ou 130 desenhos da imensidão guardada em pastas A4 referentes aos anos posteriores a 2019./
A montagem ocorreu no início de Junho de 2023, e a exposição falada desde tempos da pandemia tem agora a luz do dia./
Todo este segundo trimestre de 2023, foi também simultâneo à minha organização de um evento (com A.Oliveira) na Fundação Instituto Marques da Silva no Porto. Designadamente de um ciclo multidisciplinar de conversas, envolvendo o escritor Nuno Camarneiro, o crítico de artes preformativas Daniel Tércio, os filósofos José Gil e Ana Godinho Gil, bem como a académica Maria Filomena Molder./
Inevitavelmente, aquando da concetualização da instalação da montagem da presente exposição na Casa da Esquina em Coimbra, sinto que vivi os ecos da conversa tida com os terceiros autores – José Gil e Ana Godinho Gi – (numa tríade) no Porto em 18.5.2023./
Gostaria de salientar alguns dos aspectos dessa importante referência que são estes filósofos, no que tange a temas como o Espaço, o Corpo e as Artes. (Uma tríade)./ Filósofos e referências que sinto não terem deixado e ecoar ainda aquando ma minha montagem da presente exposição – espaço de liberdade, interior e de sensações, contra a acção de maquinarias que por vezes nos assaltam enquanto “sujeito”./
Remeto pois para o texto/comunicação intitulada “Espaço do corpo e arte contemporânea” por José Gil então lido. Designadamente para a segunda parte, em que reflectiu sobre uma sequência de tópicos, focando a “Arte”./
Desde logo, referiu-nos que “Podemos ver na Arte uma maneira de tornar actual a virtualidade do espaço do corpo”(sic), e Partilhou-nos também pretender futuramente vir desenvolver o tópico em concreto de que “a pintura lida com um espaço não transformado e ela própria o transforma.” (sic)/
Um primeiro lugar ou tópico é feito para recordar que a pintura abstracta se foi entendendo como desaparecimento da natureza, ( e) em que a figura humana “desapareceu” (encontram-se entre exemplos de Gil - o Suprematismo de Malevitch ou o Abstracionismo de Kandisnky). José Gil alude-nos a que se acaba com o espaço, mas que tal é simultâneo ao aparecimento de um espaço “interior” de sensações. Mais salientando que, de resto e “em verdade, tem-se que a realidade reside nas sensações”. (sic)
Num segundo lugar ou tópico, identifica um “voltar para dentro de um corpo próprio”, recordando que a percepção tem como condição primária “não vermos os órgãos”. (sic) Gil opõe então eg aos ready-mades de Duchamp à escultura de Henry Moore como peça que “erradia forças”. Certo sendo que, no fim dos anos 70s, o vanguardismo “explodiu”, acabou a pintura, e começou a “contemporaneidade”. E só já mais recentemente e aquando da “arte pós-moderna”, assiste-se a um reaparecimento da pintura, pintura humana, etc. E entre aspectos da Arte contemporânea a salientar se pode enumerar eg a “monumentalidade” (encontrando-se entre os exemplos dados por Gil – Kaspur ou Joana Vasconcelos, a segunda parecendo mais marcada por uma determinada “ornamentação”./
José Gil conclui com palavras como: “Experiências fazem-se no limite, e não têm espaço do corpo”. E remata a sua comunicação, esclarecendo que tal remate remete para o (ou um) “Espaço da política”./
Já relativamente a Ana Godinho Gil, remeto para o texto/comunicação em torno de uma “espacialidade livre” (focado num ponto específico da exposição de José Gil). Entre outros aspectos, faz referência à “experiência do bebé”, referenciada no 7º e 8º capítulo do livro “O jogo e a realidade” de Winnicot. Sugere “Não ver o corpo e o espaço” como muitas vezes, mas pelo contrário indagar: “O que acontece a um corpo quando fica sem centro, um corpo…que fica sem casa”.(sic) Depois contrapõe-nos em hipótese de um: “espaço não como subordinado ao/do tempo, mas como criador”; como “necessário” e onde nos “poderemos deitar”. Para, em momento subsequente, remontar à etimologia do termo espaço, com as seguintes palavras: “O espaço do latim ‘spatium’ pode ser definido de diversas formas (…); uma pode ser a de espaço como extensão, que pode ser medida”. (sic) Mas, mais, salienta que o “espaço” não é só determinado entendimento: “É espaço, planeta e clima…, é viável e… planeta”.(sic) O corpo, recorda-nos, possui uma relação com o caos e o não orgânico. Depois nos remetendo para um “um corpo literalmente arquitectura…”, recordando como em Deleuze podemos ter “superfícies” ou em Bacon “sensações”./
Por último, e perto do fim da sua comunicação, Ana Godinho Gil tem a amabilidade generosa de nos referenciar um “espaço do amor”. Terceira área/região em Winnicot - o “entre a mãe e o bebé” - aquando de um “último momento da continuidade e contiguidade” (sic). Sendo que na, passagem para um paralelo com o “planeta”, parece dever persistir uma “confiança do viver” paralelo com o amor do/pelo “planeta”. (Mais, a tríade)/
Memórias recentes, pois, Tríades e desenhos./
Coimbra, 2023/
Gonçalo Furtado/
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