5/29/25

Mutação das propostas de reabilitação em centros urbanos do norte de Portugal

Rosa Macedo - “Mutação das propostas de reabilitação em centros urbanos do norte de Portugal”. Programa Doutoral em Arquitectura da FAUP / Co-orientação: Gonçalo M. Furtado C. L. - FAUP / Ana Cláudia Costa Pinho - FAUL / Trabalho para doutoramento em curso

5/22/25

Apontamentos sobre arquitectura portuguesa e escola

1 - Apontamentos sobre arquitectura portuguesa e escola / Gonçalo Furtado ; des. Gonçalo Furtado, Ricardo Martins. - [Porto] : Lugar do Desenho - Fundação Júlio Resende, 2024. - 89, [53] p. : il. ; 30 cm. - ISBN 978-989-35431-2-2 Link persistente: http://id.bnportugal.gov.pt/bib/bibnacional/2211724 Copiar link

5/16/25

IJUP 2025 - CC

https://www.up.pt/ijup/sobre-o-ijup/#comissaocientifica

UP

https://www.youtube.com/user/universidadedoporto

5/15/25

CONVERSA SOBRE ARQUITECTURA E ESCOLA DO PORTO _ FEVEREIRO 2020 (José Cabral Dias, com Gonçalo Furtado)

  CONVERSA SOBRE ARQUITECTURA E ESCOLA DO PORTO _ FEVEREIRO 2020 (José Cabral Dias, com Gonçalo Furtado) I. [Gonçalo Furtado] - José, propunha falar contigo por seres das poucas pessoas na Faculdade que veio de Coimbra. Interessava, sobretudo nessa posição privilegiada em que estás, de ter estado nos dois locais, perceber como é que modelo do Porto foi implementado noutras Escolas públicas. Neste caso em Coimbra, que foi a primeira./ Alguns dos professores eram comuns, outros não, como é que FAUP apoiou a implementação do curso em Coimbra; como é que tu recordas esses anos em Coimbra? As disciplinas que tinhas, os professores que tinhas... Sobretudo, agora, como professor na FAUP, também consegues fazer comparações à distância, e vais a Coimbra muitas vezes. Conheces a forma como o curso evoluiu, e, também, o modo como o do Porto evoluiu. [José Cabral] – Bem, Gonçalo, vou tentar ser rigoroso. Vamos conversar sobre episódios que já se passaram há algum tempo… Respondendo-te, de facto a relação é estreita, e explica-se facilmente porque no nosso 2º ano houve uma revisão significativa do plano de estudos. A revisão teve como principais intervenientes Fernando Távora, Alexandre Alves Costa e Domingos Tavares e aproximou a estrutura formativa daquela que era praticada na FAUP. Aliás, os três continuaram ligados ao ensino no DARQ durante anos, em Projecto e História da Arquitectura. Alves Costa foi meu professor em Projecto, no 2ºano, e mais tarde em História da Arquitectura Portuguesa, no 5º ano. Domingos Tavares foi meu professor em História da Arquitectura Moderna, no 3ºano. E Távora, em Projecto do 4º ano./ A ligação de que falavas existe, de facto, porque a comissão formada por Távora, Alves Costa e Domingos Tavares veio a assumir uma grande responsabilidade no futuro do curso. [GF] - Entraram só no 2º ano? [JC] - Só entraram no 2º ano. O meu professor de Projecto do 1º ano foi o João Mendes Ribeiro. [GF] - O João Mendes Ribeiro esteve sempre só em Coimbra, acho que nunca chegou a dar aulas mesmo no Porto. [JC] - Creio que não terá passado mesmo pelo Porto enquanto docente. Foi professor na Faculdade de Arquitectura, mas na Unidade Pedagógica de Viseu. Foi para Viseu no final do nosso 1º ano e regressou no nosso 4º ano, novamente para Projecto, para assistente de Távora. Foi assistente de Távora até 1998 – nesse ano, Távora estaria já com 75 anos ou perto disso e ter-se-á desvinculado do ensino em Coimbra. [GF] - Em 1988, quando tu entras para o 1º ano, quem é que tomava conta do curso? [JC] - O curso surgiu dentro da Faculdade de Ciências. Não sei como nem com quem é que o Plano de Estudos foi elaborado, mas creio que terá sido decidido internamente. O curso surgiu como fruto da mobilização do Núcleo de Arquitetos Locais, o NARC. [GF] - O Núcleo de Arquitectos da Região de Coimbra. [JC] – Sim, os arquitectos locais, organizados em torno do NARC, conseguiram em articulação com a Universidade, que o curso surgisse. E o João [Mendes Ribeiro], tanto quanto sei, foi uma indicação do próprio NARC… a organização local que antecedeu o Núcleo de Coimbra da Ordem dos Arquitectos. [GF] - Da qual fazia parte o Bandeirinha. [JC] – Sim, o Bandeirinha fazia parte dos poucos arquitectos que existiam em Coimbra, mas não sei se fazia parte da direção desse grupo./ Mais tarde, o [José António] Bandeirinha entrou também para o 2º ano, por concurso. Abriram um concurso para 3 lugares para assistente. Entrou o Bandeirinha, entrou o Walter Rossa, e o Mário Bento, um arquitecto de Lisboa. Ficaram os três como assistentes de Alexandre Alves Costa, em Projecto./ Desse grupo, o Bandeirinha foi até o que mais ligação manteve ao ensino de Projecto (pelo menos, nos anos em que tive mais ligação ao DARQ). Actualmente é professor catedrático e Presidente do Departamento [à data da entrevista]. [GF] - Também foi vice-reitor ou pró-reitor. [JC] - Sim, foi Pró-Reitor para a Cultura, entre 2007 e 2011./ O Walter [Rossa] é também professor catedrático, e afirmou-se mais na História da Arquitectura Portuguesa, como docente e investigador. Penso que até tem tido mais destaque na História da Cidade Portuguesa. Terá aí aprofundado os seus interesses, no campo da cidade e do património. [GF] - Portanto, foram pessoas que entraram nesse 2º ano. Esse modelo está necessariamente muito próximo do modelo de ensino do Porto, porque surgiu a partir do entendimento da Arquitectura e do ensino de 3 pessoas que são fundamentais na Faculdade. [JC] – Não o diria exactamente desse modo. Há de facto uma matriz de origem próxima do ensino no Porto, mas a proposta de ensino em Coimbra juntou pessoas de vários sítios, com interesses convergentes, com certeza, mas com experiências profissionais e pedagógicas que são diversas. Tinham certamente modos afins de ver a arquitectura… mas não vieram só do Porto, também vieram de Lisboa e creio que é correcto dizer-se que tinham o seu próprio modo de olhar o ensino./ Eu estou a lembrar-me de Manuel Taínha, que foi meu professor de Projecto no 3º ano. Mais tarde, Vítor Figueiredo entrou também para Projecto do 3º ano. Manuel Graça Dias também teve uma passagem por Coimbra, em Projecto 3. Hestnes Ferreira veio a entrar para Projecto do 1º ano. Gonçalo Byrne foi meu professor no 5º ano. No 4º ano, foi Távora. [GF] - Portanto, criou-se ali uma plataforma que juntou pessoas de vários sítios e que, de facto, criou frutos. [JC] - Eram pessoas que se respeitavam imenso e diria que, de alguma forma, eram complementares. Terão sido todos convidados pela Comissão instaladora do Curso, presidida por Margarida Ramalho (professora na Faculdade de Ciências e Tecnologia), mas certamente com um forte contributo de Alves Costa, Domingos Tavares e Távora. Como estava a dizer-te, apesar das diferenças, tinham proximidade, pelo modo como pensavam, caso contrário não se tinham juntado ali, num novo projecto de ensino. Essa proximidade sentia-se. Porventura, o facto de estarem a construir algo de raiz criava uma ligação forte entre as pessoas, uma espécie de cimento. Nós sentíamos isso no modo como se relacionavam. Não só no interior da Escola, mas também em convívios e jantares com estudantes, nos quais muitos dos professores normalmente participavam. A Escola era pequena. Isso ajudava. [GF] – Percorreste os grandes nomes que vieram de Lisboa. O Vítor Figueiredo, o Gonçalo Byrne, e o Manuel Taínha. [JC] – Como disse, Hestnes também passou por lá e teve um forte papel no ensino. Permaneceu alguns anos, com continuidade, e criou uma matriz própria em Projecto 1. O ritmo era intenso, com muitos exercícios de curta duração, mas creio que aqueles que foram seus alunos lhe reconhecem um importante papel na sua formação. Não foi meu professor, eu já tinha passado o 1º ano./ Como estava a dizer, houve também Manuel Graça Dias no 3º ano, embora com uma passagem não tão longa. Foi um pouco disruptivo e não terá sido bem compreendido; creio que não quis continuar, tenho pena… mas não só o Manel. Correndo o risco de algumas omissões, vieram também Reis Cabrita e Mário Krüger de fora de Coimbra, mais ligados ao ensino da Teoria. Na História, Paulo Varela Gomes foi marcante. Tinha um especial talento para cativar e motivar os estudantes. Era acutilante, e por vezes era mesmo desconcertante, como modo de nos fazer pensar. E, obviamente, José Gigante, na Construção. Sinto que o seu sentido de humor e a empatia eram tão importantes nas aulas como o discurso rigoroso. Era um professor muito próximo./ E com isso conseguia intensificar o nosso interesse pela Arquitectura. [GF] – Manuel Graça Dias a dar Projecto 3, tinha como assistentes o José Fernando Gonçalves e o Paulo Providência. [JC] – Sim, é verdade. Portanto, percebe-se que embora o curso estivesse próximo do ensino no Porto, na sua estrutura-base, não era exatamente um “clone”. Conheces o Manel... [GF] - Os três grandes professores que estavam a dar aulas eram esses três – Távora, Alves Costa e Domingos./ Estas figuras eram de Lisboa, mas também próximas, digamos... [JC] – Próximas do Porto ou dos professores que lá ensinavam. Exatamente. [GF] - E o Manuel Vicente? [JC] - Nunca por passou por Coimbra. [GF] - E os docentes locais? Era o Bandeirinha e o João Mendes Ribeiro? [JC] - Sim, havia também o Gonçalo Urbano, mas não tive um grande contacto com ele. O João Marta… tinha escritório em Coimbra. Foi meu professor de Construção no 3º ano. O Walter Rossa não era de Coimbra, embora tivesse adotado Coimbra. Era da zona da Aveiro. Fez o curso em Lisboa./ Estavas a perguntar… o José Fernando Gonçalves e o Paulo Providência entraram para o 3º ano, para trabalhar com Manuel Taínha, que foi o nosso professor de Projecto do 3º ano./ Repara que estou a falar-te dos primeiros anos do curso, na forma como ele surge. No 4º ano, regressou o João, enquanto assistente de Távora. Havia só uma turma. Era numerosa. E no 5º ano, o Nuno Grande entrou com Byrne. Entrou para professor das turmas práticas. [GF] - O Nuno Grande só entrou em 1992/93. [JC] - E o Jorge Figueira entrou para o 2º ano, ainda eu estava por lá, como aluno. O Mário Bento, entretanto, já tinha saído. [GF] - E o Pedro Maurício Borges? [JC] - O Pedro Maurício entrou mais tarde, para o 1º ano. [GF] - Mais tarde, do que em relação ao teu ano de entrada? [JC] - Sim, exatamente. De qualquer modo, julgo que ainda o terei apanhado no DARQ, enquanto estudante. No caso de Hestnes, seguramente. Eu ainda estava na Faculdade quando entrou para o 1º ano. O Pedro Maurício foi trabalhar com Hestnes e creio que o Gonçalo Urbano também fazia parte da equipa./ Ou seja, pelo que sabemos desses arquitetos, do trabalho deles, por aquilo que muitos escreveram, pela obra, pelas relações que tinham com Távora, Alves Costa e Domingos, percebe-se que existia a intenção de dotar o curso de Coimbra de um ensino mais sólido. [GF] - E que não poderiam estar muito distante do Porto. Embora não fosse exatamente igual… [JC] – Havia essas pontes, de que já falámos. Em todo o caso, o curso foi construindo a sua própria via, com autonomia, reforçando-a ao longo dos anos pela didáctica, a investigação (que veio a ser desenvolvida) e pela progressiva consolidação de um corpo docente próprio… ou pelo menos autónomo. Não nos esqueçamos que logo nos primeiros anos começaram a entrar colegas nossos, já formados no Departamento [de Arquitectura]./ Os primeiros a entrar foram o Rui Lobo e o Adelino Gonçalves, meus colegas de curso. Mais tarde entrou o António Bettencourt. [GF] - O Adelino também era teu colega de curso? [JC] – Exactamente. Também fomos colegas no liceu, além de colegas na Faculdade. [GF] - São pessoas de Coimbra. [JC] - Sim. O Lobo e o Adelino fizeram o liceu em Coimbra; o Bettencourt, não. Era Açoreano e foi para Coimbra para estudar./ Depois disso… já não te sei dizer a sequência exatamente… entrou o Luís Miguel Correia, que é neste momento o vice-presidente do Departamento [é o actual presidente]. A ida do Miguel para o Departamento coincidiu com a contratação do Nelson Mota, mais ou menos na mesma época. O Nelson esteve a dar aulas de Projecto durante uns anos no DARQ. Foi para Delft, fez lá o doutoramento e ficou. Foi convidado a ficar a dar aulas lá, na faculdade./ O Gonçalo Canto Moniz também já teria entrado. Nos anos seguintes, entraram mais ex-estudantes no DARQ. O João Gomes, que trabalhava com o Gigante, entrou para Construção, juntamente com o João Fôja. Isto já nos anos 2000. Actualmente, são muitas as pessoas já diplomadas no DARQ. [GF] - A irmã do Lobo entrou mais tarde. [JC] – Sim, não foi das primeiras a entrar. [GF] - São todas pessoas já formadas ali. [JC] – Sim, são pessoas já formadas ali. [GF] - Nesse ensino de Arquitectura, o que é que tu recordas de grandes cadeirões, em termos de cultura arquitetónica? O que é que te marcou? [JC] - Marcou-me muito a cadeira de Teoria de Arquitectura com José Aguiar. Na época, era investigador no LNEC. Foi para Coimbra enquanto assistente de Reis Cabrita em Teoria 1… entretanto, passou da carreira de investigação no LNEC para a Faculdade de Arquitectura de Lisboa. As aulas foram praticamente todas asseguradas por José Aguiar. Recordo-o como um tipo incrível, com uma capacidade de comunicação enorme e com uma cultura arquitetónica bastante grande. Para miúdos no início do curso, foi uma iniciação em pleno. Não só nos falava dos arquitectos modernos e da sua obra, como nos relatava as viagens que tinha feito para os conhecer. Foi por essa via que entrámos no universo de Loos, Le Corbusier… foi a primeira vez que vi o Karl Marx-Hof. A imagem ficou-me gravada. Fortíssima. [GF] - Logo nos primeiros anos? [JC] - Sim. No 2º ano. Para mim, foi muito marcante. Tanto quanto me recordo, fazia a ponte entre a teoria e a história da Arquitectura com grande eficácia e naturalidade. E, portanto, nós percorremos logo nos primeiros anos do curso, uma parte muito significativa da história e da teoria da Arquitectura contemporâneas. Foi muito enriquecedor. Permitiu-nos conhecer autores e obras-chave. Foi um modo muito intenso de entrar no universo da Arquitectura. [GF] – Isso no início do curso… [JC] - Exactamente. Normalmente, os estudantes demoram muito até conhecerem esse período. Num curso em formação – nós íamos na frente, éramos os primeiros – acabou por não correr mal./ Estou a lembrar-me, também, das aulas do Domingos Tavares. Eram interessantíssimas. O Domingos tem uma capacidade de comunicação invulgar e um enorme talento para prender a atenção dos estudantes. [GF] - Isso foi no 3º ano. [JC] - Nós sentíamos que a História da Arquitectura Moderna estava um pouco distante do nosso tempo, mas, apesar disso, estávamos interessados. [GF] - Não era moderna… é do período da história considerado período moderno. [JC] – Sim, isso mesmo. Pensávamos que não era tão útil para o estudante de arquitectura ou para o arquiteto como seria a arquitectura contemporânea. Um erro. [GF] - Este José Aguiar, por exemplo, qual era a referência mais recente de que falava? Falava de Herzog e coisas assim? [JC] - Não, não. O Herzog não era uma referência óbvia, nessa época. Pelo menos, não o víamos assim. Na verdade, não o conhecíamos. O Herzog “entrou” na Escola quando eu estava no 4º ano ou no 5º ano, talvez./ A certa altura, sentiu-se muito a sua influência nos trabalhos. Os projectos eram muito Herzog./ Creio que começou com aquele livro da GG, pequenino, que tem as primeiras obras de Herzog & de Meuron. A primeira Monografia da El Croquis surgiu mais tarde, Quando estava no 3º ano, fizemos uma viagem de estudo a Barcelona. E a El Croquis, era nessa altura uma revista relativamente jovem. Havia coisas, fenómenos, que nós agora damos por adquiridos que, na altura, estavam muito no início. As revistas mais conhecidas eram a Casabella, a Domus, a L’Architecture d’Aujourd’hui./ Pelo menos em Coimbra, a El Croquis não era uma revista tão conhecida quanto isso. Lembro-me nessa viagem que um dos nosso colegas comprou um número sobre Tadao Ando. Foi uma revelação. [GF] - Eu estou a reconhecer no que estás a dizer-me... E depois em Barcelona comprava-se as “El Croquis” mais facilmente. [JC] - Lembro-me perfeitamente./ O Tadao Ando… aquela arquitectura muito limpa. Aquelas superfícies muito exatas. A própria definição matérica do betão, muito espesso. O controlo da luz, aquelas relações entre interior e exterior nas casas com pátios. Tudo isso se tornou numa referência muito presente para alguns de nós. E graças à El Croquis. [GF] - Portanto, final dos anos 80 e início dos anos 90. [JC] - Sim… [GF] - O contemporâneo que tu estavas a dizer que vos era mostrado... Falavam do Tadao Ando? [JC] - Não exactamente. Nas aulas de que falávamos atrás, o tema era sobretudo a arquitectura moderna e os seus antecedentes. Lembro-me de se falar de Norte Júnior, Ventura Terra, isso em Portugal. [GF] - E do orgânico. [JC] - …estes termos são um bocado equívocos, porque nós estamos na arquitectura do movimento moderno, se quiseres. Que é para não se confundir com a arquitectura moderna dos séculos XV a XVII… [GF] - O que tu estavas a dizer é que se entrava no 2º ano e apanhava logo a história do movimento moderno... [JC] - Exactamente. [GF] - Estamos a falar do movimento moderno que entrava pela mão, i.e. pelo discurso, de José Aguiar. [JC] – Sim. Como estávamos a ver, a Arquitectura da idade Moderna veio mais tarde, com Domingos e a Arquitectura do século XV e seguintes - Renascimento, Maneirismo, Barroco, etc. [GF] - E o que tu querias dizer, há bocado, era que se começava pela arquitectura do século XX. [JC] - Exatamente./ José Aguiar foi um professor que me marcou muito, porque, de facto, nos abriu os horizontes, com um discurso realmente muito arquitectónico, para a dimensão da Arquitectura./ Passavas daquilo que era o nosso quotidiano para referências eruditas internacionais. E isto falando de Arquitectura, percebendo os postulados, percebendo a convergência entre a linguagem, as ideias, a forma, o espaço, etc. [GF] - Eu acho que o maior impacto no ensino do conhecimento da cultura arquitectónica, e que tem mais impacto no Projecto, é o século XX. E, portanto, eu realmente não percebo assim esse atraso... Eu foco o meu ensino no século XX. [JC] - Não será porque os estudantes estarão menos aptos para fazer convergir o conhecimento histórico com o exercício de projecto, quando se trata de períodos mais distantes? [GF] - Eu faço isto no 2º ano. Mas não deveria esperar pelo 2º ano. Se tivesse dado logo no 1º ano... [JC] – Perguntava-te, até pela minha própria experiência enquanto estudante… os estudantes não estarão menos disponíveis para saber fazer a ligação entre as arquitecturas mais distantes no tempo e a sua própria prática? Parece haver uma espécie de véu. A ornamentação parece que oculta o espaço e a forma, uma espécie de véu sobre o essencial. [GF] - Há uma espécie de véu. A aplicação do barroco no projecto hoje em dia é uma aplicação um bocado indireta, digamos assim. Ou seja, o seu entendimento não é imediato. [JC] – Não é. As dinâmicas especiais e as articulações espaciais são muito interessantes. Mas há o tal véu, a ornamentação, não é verdade? Para o total entendimento da arquitectura, é preciso filtrar mais... enquanto que a arquitectura do final do século XIX e entrada no século XX, pelo seu lado mais depurado, poderá ser mais facilmente compreensível por um estudante de arquitectura./ Mas também terá que ver com a forma como se dá a ver, não será? Porque se se souber fazer as pontes com o discurso contemporâneo, se calhar os estudantes entendem. Mas não quero ser injusto. Muito provavelmente, as falhas de entendimento ficaram a dever-se a mim próprio. [GF] - Mas é mais difícil, de facto. [JC] - Não sei, de facto, se é preciso ordenar o ensino da história do modo mais expectável. Pessoas mais bem colocadas do que eu para essa reflexão, ligadas ao ensino da História, já pensaram sobre o assunto… se é preciso ter esta sequência lógica, cronológica, nas diversas histórias. Não deixa de ser verdade que a História da Arquitectura Contemporânea se relaciona muito com a Teoria da Arquitectura, com os seus temas. [GF] - No 2º ano, seria isto. E no 3º era o Domingos Tavares, na História. E no 4º ano? [JC] – No 4º ano tivemos Paulo Varela Gomes em História da Arquitectura Contemporânea. Foi memorável./ Nesse ano, a Teoria da Arquitectura foi organizada em seminários. Os professores iam ”rodando” – Bandeirinha, João Paulo Providência, Jorge Figueira, etc. Na prática, eram vários os responsáveis pelas aulas, tratando assuntos diversos, [GF] - O Jorge Figueira dava a versão também pop dos anos 80? [JC] - Já não me lembro muito dos conteúdos. Não foi uma coisa que me tivesse marcado especialmente. Lembro-me de poucas coisas. Lembro-me de uma aula do João Paulo Providência em que falou na cabana primitiva. Lembro-me que fiz um trabalho sobre o Mercado de Braga… fomos em grupo, um conjunto de colegas, entrevistar Souto de Moura: nessa época tinha o escritório na Foz./ Recordo-me bem dos professores. Lembro-me de um colega nosso ter ficado intrigado por um dos professores ter manifestado apreço pela obra de Alcino Soutinho… ou de Souto de Moura, não sei bem… e de Graça Dias. No meio da resposta, tentando desfazer o espanto do nosso colega, o professor disse-lhe: “você, quando for mais velho vai perceber…”. Tinha razão! Isto também dá o tom do ambiente daqueles anos. Havia alguns antagonismos. Hoje, as coisas estão mais plurais. [GF] - E no 5º ano, tinha alguma relação com o Urbanismo? [JC] – Se perguntas o que se passava em Projecto, sim. O nosso trabalho tinha essa dimensão, e o exercício que realizámos tinha como propósito tratar as margens urbanas do Mondego, em Coimbra./ No 5º ano, lembro-me perfeitamente de Byrne, que era uma pessoa com uma capacidade tremenda de nunca dizer mal de qualquer trabalho, mesmo quando tinha de demonstrar ao estudante que não tinha escolhido a via mais adequada./ Byrne é de uma elegância absoluta. É um príncipe da Arquitectura (Risos). [GF] - Era professor de Projecto, não é? [JC] - Era de Projecto, sim./ A forma como tu o conheces como pessoa, a forma como actuava enquanto professor, era, de facto, de uma sensibilidade tremenda e de uma pessoa cultíssima. Aliava essa cultura a uma grande sensibilidade para, de um modo bastante pedagógico, demonstrar ao estudante, sempre de forma positiva, que o trabalho não estava a seguir na melhor direção. [GF] - Portanto, ele cativava imensos os estudantes. [JC] - Sim. Totalmente./ As aulas dele eram extremamente aguardadas e era uma pessoa muito presente. Embora estivesse em Lisboa, ia sempre às aulas. É desse modo que o recordo. [GF] - Gonçalo Byrne tem textos dos anos 70 já altamente sofisticados, do ponto de vista teórico./ Portanto, fazendo essa ponte, o que te pergunto é se havia alguma disciplina concretamente de Teoria? [JC] - Tínhamos Teoria de Arquitectura, mas não me lembro com toda a exactidão. Tinha que ver com temas da cidade e do urbanismo. Ouvi aí falar pela primeira vez nas ideias de Nuno Portas. Era uma cadeira leccionada pelo João Paulo Cardielos.. [GF] - Tinham uma linha de disciplinas de História separada da de Teoria. [JC] – Sim, isso mesmo. Paulo Varela Gomes deu-nos História de Arquitectura Contemporânea./ José Aguiar foi professor de Teoria, mas andou por esses caminhos. Foi uma convergência de discursos, mas foi uma coisa circunstancial, sem grande seguimento. José Aguiar teve uma passagem não muito duradoura pelo curso. E logo no início. Reis Cabrita permaneceu por lá mais tempo, mas passou para Teoria do 3º ano, com temas que reflectiam muito mais as investigações do LNEC./ Paulo Varela Gomes, era uma pessoa maravilhosa, com uma capacidade de integrar no discurso temas distintos, referências distintas. Era uma pessoa com uma capacidade de comunicação fora do vulgar, que punha completamente ao serviço da pedagogia. E, de facto, as aulas eram espantosas. [GF] - Recordas-te de como é que se chamava a disciplina? Era História de Arquitectura Contemporânea? [JC] - Era História de Arquitectura Contemporânea. [GF] - Havia, portanto, duas colunas. Uma de Teoria e uma de História. [JC] - Exactamente. [GF] - Tal como no Porto. [JC] – Podes dizê-lo desse modo. II./ [GF] - Voltando a… personalidades interessantes como o Paulo Providência. [JC] - Na altura fumava-se nas salas. E ele falava muito pausadamente, muito devagar, a medir cada palavra, cada raciocínio.… quando hesitava, acendia um cigarro. Sempre com sentido de humor, por vezes uma ponta de ironia, uma ironia fina... mas a nossa experiência foi muito boa. Ajudava-nos imenso, era muito dialogante, e fez-nos descobrir o projecto de arquitectura. A turma era muito pequena e conversávamos muito. Nós nunca sabíamos o que ia acontecer, porque falava devagar e ia desenhando as coisas que pensava. Estava sempre com um caderno, andava sempre com aquele caderno, e desenhava no caderno preto A4. Quando não o tinha consigo, desenhava nos cadernos dos estudantes. Eu fiquei com um caderno com muitos desenhos do Paulo Providência./ E, portanto, isto era incrível, ele era pausado, não respondia assim de uma forma muito espontânea, muito imediata. Era pensativo, e depois era capaz de se alongar nas respostas, sem pressas, durante algum tempo. [GF] - Ia desenvolvendo as reflexões lentamente. [JC] - E era completamente desconcertante com estas coisas./ Agora há muito pouco tempo, nas aulas... Como te disse, nós éramos muito poucos por turma, no 3º ano, porque havia dois assistentes… uns 15 ou 20, por turma. Havia tempo para falar dos projectos e conversar. E ele conversava imenso sobre Arquitectura e não só. Fazia remissões para outros assuntos, a partir da Arquitectura. [GF] - Não era só debruçado sobre o projecto específico. [JC] - De todo, foi um ano muito rico. Era engraçado, porque as nossas referências na altura eram muito em torno de Souto de Moura. O José Fernando trabalhava com Souto de Moura./ Estávamos no primeiro ano em que se dá o desenvolvimento do projecto em Construção, com a definição dos aspetos construtivos da proposta. Nós tínhamos folhas do projecto de execução de diversas casas de Souto de Moura e também do Convento que o João Paulo e o José Fernando estavam, na altura, a começar a construir em Lisboa. Conhecíamos os detalhes de trás para a frente e fomos muito influenciados por isso. Era uma espécie de manual. A informação disponível não era tanta como hoje, mas creio que nos fez bem olhar em profundidade para a que tínhamos, com foco, tentando compreendê-la. [GF] – Referias-te ao Convento dos Dominicanos. [JC] – Sim, isso mesmo. [GF] - Havia tempo para conversas… Alexandre Alves Costa também foi marcante? [JC] - Sim, Alves Costa não podia ter sido mais marcante. É uma pessoa com um entendimento da História que é, não a História como campo de conhecimento, mas a História como matéria operativa para arquitetos./ E, portanto, aquilo de que falávamos há pouco, de o estudante conseguir ter capacidade de ler nas arquitecturas do passado matéria que o possa informar na accção projectual… era por aí que andava a pedagogia de Alves Costa. Tornava inteligível o que era complexo. Sem deixar de lado o rigor histórico, falava-nos de Arquitectura, de temas de Arquitectura. De projecto, em suma. [GF] - Ou seja, tratava-se de olhar a história pelo entendimento claro dos edifícios. Situá-los no tempo, percebendo porque é que surgiram de determinada forma, com a sua espacialidade. [JC] – E com isso conseguia... se havia aulas a que ninguém faltava, eram as aulas de História da Arquitectura Portuguesa de Alexandre Alves Costa./ De facto, houve professores muito marcantes quer mais ligados à área do Projecto quer mais ligados à área da Teoria e da História. [GF] - Há outros professores de História de que te lembres? Falámos de Paulo Varela Gomes e falámos de Domingos Tavares. E Mário Krüger? [JC] - Mário Krüger leccionava Arquitectura Teórica, I e II. [GF] - Era semestral? [JC] - Eram duas semestrais, I e II. [GF] - No 5º ano. [JC] - Eram aquelas temáticas das gramáticas formais, ligadas a Christopher Alexander e de todo esse grupo de Oxford, de Cambridge, etc. [GF] - Como é que eram recebidas essas aulas? [JC] - Inicialmente, de uma forma um bocadinho desconfiada. Mas depois, Mário Krüger, que é um homem inteligente, conseguiu contornar o problema e abordar os assuntos de um modo cativante, desenvolvendo-os de modo a torná-los interessantes. Essa temática das gramáticas formais foi muito explorada a partir da obra do Frank Lloyd Wright e isso resultou. [GF] - …como matéria, ponto de partida, para estudarem obras de arquitetos contemporâneos. [JC] – Exactamente. Eu lembro-me que fiz um trabalho sobre Souto Moura, a partir da abordagem teórica que Krüger propunha, ligada às gramáticas formais. Era uma escolha óbvia, tendo em conta a sua fase neoplasticista./ No fundo, Krüger conseguiu fazer bem a ponte para o que seria a nossa expectativa, digamos. Terá tentado chegar até nós com uma prática mais corrente, dentro da própria estrutura do curso e da tradição do Porto, se quiseres. E não tanto daquela tradição anglo-saxónica, muito analítica. [GF] - Acabaste a Prova Final do curso em 1994/95. [JC] - Sim. Orientada por Byrne./ Finalizei a parte curricular em 1992/93, e depois fiz a prova final em 1993/94. [GF] - E eu tinha esta ideia de que tinhas vindo pelo Alves Costa para a Faculdade. Sim, porque, entretanto, fiz o Mestrado na FAUP./ Em 1996, candidatei-me ao Mestrado aqui no Porto, de Projecto em Planeamento do Ambiente Urbano. O Mestrado tinha como campo o Urbanismo. E o Urbanismo é por definição o terreno da incerteza… não consegues antecipar as “oportunidades não programadas”, como Nuno Portas dizia. [GF] - Sim, as “oportunidades não programadas”. [JC] – E, portanto, o plano tem que estar permanentemente a lidar com a incerteza, a dúvida, e é um campo muito escorregadio. Por comparação, no projecto tu operas melhor sem a incerteza. Consegues desenvolver o projecto quando tens dados seguros, quando tens o programa. É certo que as obras mudam, alteram-se, mas mudam pela alteração de uso, de programa./ Se lidas com a indefinição, é-te mais difícil decidir. [GF] - O José Miguel tinha entrado num ano anterior ao teu. E o Luís Viegas? [JC] – Sim, é verdade. O Viegas, também. O Luís Pedro Silva e o Mário Mesquita também tinham entrado antes de mim./ Dessa geração, fui colega da Carla Leitão, da Ana Luísa Jardim, do Pedro Balonas, do Jorge Veloso, do José Ferreira, primo do Jorge Figueira... era engenheiro, trabalhava na área Metropolitana do Porto. E da Ana Luísa Velosa, também engenheira…/ [GF] - Porque o Mestrado era organizado pela FAUP e pela FEUP./ A tua prova final é sobre a arquitectura religiosa? [JC] - Sobre Tomar./ Estava a contar-te: eu, inquieto com a incerteza do Urbanismo, fui procurar uma maior certeza... julgava eu, que depois as coisas não vieram a revelar-se exatamente desse modo. Mas fui procurar um território que pudesse pisar de forma mais confiante. Um território mais firme./ Tinha tido uma cadeira com Alexandre Alves Costa, que era de Renovação Urbana... [GF] - Nesse Mestrado. [JC] - Nesse Mestrado. Um tema fundamental no Urbanismo./ E Alves Costa organizou a cadeira em vários temas, em seminários. Deu a primeira e a última aulas, e convidou Alexandra Gesta para relatar a experiência de Guimarães, Rui Losa, sobre a Ribeira, e Siza, para falar do Chiado. [GF] - Portanto, convidou uma série de pessoas para falar sobre ações de renovação. [JC] - No fundo, para falar de reabilitação de áreas históricas. O âmbito era a cidade. E eu aproveitei o embalo. Resolvi fazer o Mestrado mais para essa área. Como uma decisão natural, Alves Costa foi o meu orientador da dissertação de Mestrado./ Quanto à tua pergunta inicial, entrei para a escola como assistente convidado. Vinha fazer a substituição de um professor do 1º ano de Projecto que tinha saído. O Sergio [Fernandez], com quem eu tinha convivido muito lá no escritório [Atelier 15] terá simpatizado comigo e generosamente considerado que eu podia desempenhar esse papel. Aliás, já o tinha conhecido numa viagem de estudo a Barcelona. [GF] - Quem é que tinha saído? [JC] - Creio que tinha sido o Elisário Miranda./ Como contava, cruzei-me bastante com o Sergio no contexto da orientação da dissertação de Mestrado. Alves Costa era um orientador presente e atento e eu ia regularmente ao Atelier 15. O Sergio conheceu-me melhor nessa ocasião. Na verdade, quem me convidou foi o Sergio Fernandez. Não se pode dizer que tenha sido totalmente pela mão de Alves Costa. Foi pela mão do Sergio, graças, naturalmente, às muitas horas de orientação que passei ali no escritório da Rua 15 de Novembro. Íamos conversando. Mas na verdade eu estava ali pela mão de Alexandre Alves Costa. Será justo reconhecer que Alves Costa teve um papel importante. E teve, com toda a certeza, uma influência decisiva. [GF] - Portanto, acabaste em 1993/1994, lá. Ingressaste no Mestrado em 1996. E vieste para aqui em 1999. [JC] – Enquanto assistente, vim para aqui em 1999. [GF] - Vieste em 1998/99? [JC] – Em 1997/98 fiz a dissertação… na verdade, devia ter feito, já que prolonguei para o ano letivo seguinte./ Quando entrei aqui em Outubro de 1999, passado pouco tempo, em Novembro, terminei o Mestrado. Comecei a dar aulas em Outubro de 1999. [GF] - Nessa altura, o diretor da Escola era Domingos Tavares. [JC] - Era Domingos Tavares. [GF] - O que recordas da direção de Domingos Tavares? Foram 8 anos. E depois tivemos outras duas direções. Recordas alguma coisa da organização, do curso, das questões que houve nessa altura? [JC] - São coisas que se passaram há muito tempo. Mas lembro-me que havia cinco cadeiras no 1º ano, sem História: a História da Arquitectura Antiga e Medieval acontecia no 2º ano. E havia Antropologia do Espaço, que depois saiu./ A terminologia era diferente. No 2º ano, a Teoria era MLAC, que era Métodos e Linguagens da Arquitectura Contemporânea. Havia Espaço Habitável e Formas de Residência. Mas, no fundo, eram designações mais extensas… creio que os conteúdos estavam muito próximos do que veio ser leccionado em Teoria I e II. Os professores mantiveram-se os mesmos após a mudança, durante algum tempo… Manuel Mendes e José Salgado./ Depois houve umas trocas. Cadeiras que desceram do 3º para o 2º ano e do 2º para o 1º. Na CERT [Comissão de Concursos Especiais e Regimes de. Transferências], tive oportunidade de recordar as diversas estruturas do curso. Sabemos que houve várias mudanças, mas já não me lembro com detalhe. [GF] - Ou seja, a tua ideia é a de que essas disciplinas se mantiveram ainda durante 10 anos. Nos primeiros 10 anos, tinham um título mais comprido, normalmente, como uma ideia programática… e depois passaram a ter apenas aposto um número. Designações mais genéricas. [JC] - Nos casos em questão, tenho essa ideia, sim. [GF] - Mas a ideia é que continuaram a ser dadas igualmente. [JC] - Sim. O José Salgado continuou. O Manuel Mendes continuou. A Teresa Fonseca continuou no 4º ano./ Antes da Teresa Fonseca, quem mais estaria?... não era Manuel Correia Fernandes? [GF] - Talvez. [JC] - Acho que sim. Manuel de Correia Fernandes estava nessa cadeira... Pedro Ramalho estava em Projecto 4. [GF] - Domingos Tavares leccionou as Formas de residência do 3º ano. Como o próprio Francisco Barata. I.e. Domingos Tavares e Francisco Barata também passaram pelas cadeiras de Teoria./ Mas houve muita instabilidade. Houve alguma mudança… se calhar até Manuel Correia Fernandes. Agora estou curioso com isso. Porque tenho a ideia de que Correia Fernandes esteve nessa cadeira. [JC] - Eu acho que Correia Fernandes esteve nessa cadeira. Creio que era Espaço Público e Formas dos Equipamentos. [GF] - Esta primeira fase de Domingos Tavares e a outra fase de Francisco Barata... são duas décadas diferentes. A de transição depois inclui a direcção de Carlos Guimarães. Como é que tu comparas? Francisco Barata apanhou a transição para a Bolonha. [JC] - Tanto quanto me lembro, foi no mandato de Francisco Barata que se deu essa transição, onde houve algum ajuste./ A minha percepção é a de que houve empenho em promover essa transição do melhor modo. Houve reuniões em que o conjunto dos professores foi chamado a participar, tendo sido apresentadas as ideias para readaptação do plano de estudos. Foi um processo difícil, de compressão, já que o curso teria de se limitar a 5 anos – e já não a 6 anos, como até aí./ Mas pode dizer-se que a estrutura do curso não mudou substantivamente. Há a percepção geral de que um dos problemas que ainda hoje se nota é de se ter comprimido para 5 anos o que se fazia em 6./ A Dissertação de Mestrado é herdeira desse problema. Creio que apesar de todos os esforços e da boa vontade de toda a gente, tem havido alguma dificuldade no ajuste do modelo da dissertação ao tempo de fomação. De resto, houve uma diminuição de unidades curriculares - como agora se diz - no 5º ano. [GF] - Ainda há muito trabalho, muito peso, disciplinas a mais? [JC] - Havia 6 anos. Agora, há 5. Ou seja, o curso foi ajustado como foi possível fazê-lo, com a participação e o debate realizados. Não direi categoricamente que o modelo da prova de mestrado está desajustado relativamente à duração do curso, mas sente-se algumas dificuldades, por vezes. [GF] - E esta redução só para um semestre do último ano também não chega. [JC] – Há quem diga que o cobertor parece ser curto. [GF] - Mas no início, quando houve essa mudança repentina, continuava tudo a pedir a mesma quantidade de trabalho. Digo tudo à volta do Projecto e… [JC] - Já no tempo da prova final havia muitos estudantes, aqueles que eram mais louvados, os que eram mais destacados, que tinham óptimos resultados, que não terminavam o curso no tempo esperado. E isso já se passava em Coimbra. Aconpanhei-o de perto. Desde esse ponto de vista, Coimbra até foi pioneira, como te disse. [GF] - No Porto havia o estágio. [JC] - Nós fomos o primeiro curso a ter a prova final. E foi uma péssima notícia que Alves Costa se viu na obrigação de dar-nos, numa reunião de final de ano lectivo. Foi em Maio, lembro-me perfeitamente. Nós estávamos a dois meses de terminar o curso. E foi-nos dito que já não iríamos terminar nesse ano, porque havia uma exigência da União Europeia a que era forçoso dar cumprimento. Foi um choque. [GF] - Ou seja, havia uma diretiva europeia que obrigava que a composição dos cursos fosse de forma distinta. [JC] - Era o tal modelo do trabalho final, na conclusão do curso. [GF] - E depois, em seguida, essa prova final veio também para o Porto. [JC] - E ninguém sabia muito bem o que era uma prova final, pelo menos em Coimbra…/ E no nosso caso não a concluímos no período em que era suposto. Foi um bocadinho mais dilatado… ninguém a entregou em Julho. [GF] - Era Teoria ou Projecto. [JC] - Eu desenvolvi um projecto. Mas a aprova era mista, tinha uma componente escrita./ Entregámos a prova final em Novembro. Concluímos numa época especial. Tivemos que fazer um requerimento ao Conselho Científico da Faculdade para a extensão do prazo - uns meses, apenas. A seguir, vieram provas finais de 2 e 3 anos. O modelo que veio para o Porto teve pioneiros em Coimbra, com experiência a estender a prova. (Risos) / E isso, ficou, em muitos casos, como todos sabemos. Estamos a falar de meter num semestre aquilo que em muitos casos já não se fazia num ano (em Coimbra o curso era de 5 anos e meio). [GF] - O que é que pensas sobre isso? [JC] - Tem havido um esforço para resolver o problema. [GF] - As relações entre um curso e outro, até do ponto de vista… são parecidas. [JC] – Não tenho acompanhado as Dissertações de Mestrado em Coimbra. Creio que são iniciadas no 4º ano, tendo como base o exercício de Projecto. [GF] - E agora, na altura da direcção de Carlos Guimarães, corresponde a isto que estás a dizer da redução. [JC] - Haverá diferenças de estilo entre directores. Tenho apreço por quem esteve na direcção da Faculdade, nos diversos momentos. Ou seja, estou certo de que têm sido sistematicamente feitos esforços para a adaptação do plano de estudos aos desafios que as mudanças de contexto têm colocado. É reconhecido por todos que o processo não tem sido sempre fácil. Mas a realidade é dinâmica. As necessidades mudam. [GF] - E agora, como é que tu percecionas a organização da Faculdade? Esta transição agora para gerações mais novas… e uma nova direção? [JC] – Toda a organização do “edifício” universitário está distinta. O paradigma mudou, até na própria Faculdade. A componente da investigação está mais forte. O próprio CEAU ganhou outra presença. Há um novo debate acerca do ensino, do financiamento, etc. Haverá dificuldades neste processo? Acontece sempre que alguma coisa muda num processo; sobretudo quando se trata de um meio tão complexo, plural, com tantos agentes. São certamente dores de crescimento, num momento que ainda é de adaptação, como reacção ao que já se sabe sobre a mudança de contexto. Por isso, digo-te que a minha resposta reflecte a minha ideia de que o que me parece necessário é convergência. Falo da Faculdade como um todo. A Faculdade está numa fase de transição por vários factores, entre os quais está a saída de muitos dos docentes que foram nossos professores, que promoveram a notoriedade da Escola. Sempre preservando a pluralidade, o desafio que se coloca é o de poder encontrar respostas, com o propósito de potenciar o legado e permitir a adaptação a novos desígnios, à realidade actual e futura./ Noutro plano da vida e da organização da Faculdade, havia a ideia de que, antes, os estudantes tinham mais tempo disponível, não é verdade? Aliás, tu passaste por Projecto... parece que o tempo agora está mais curto, que não chega. [GF] - Há alteração no perfil dos estudantes também, ou não? [JC] – Há uma percepção de que haverá alguma mudança, mas não é nada que resulte de dados inquestionáveis. Provavelmente, isso merece um estudo mais atento. [GF] - Parece que Projecto ocupava mais o quotidiano dos estudantes. [JC] – Há a ideia de que temos carga horária a mais. É um debate muito presente na Faculdade. Sem dizer se os trabalhos eram melhores ou piores, se eram mais bonitos ou mais feios – isso é outra conversa - o que me parece é que os ditos trabalhos estavam mais presentes no quotidiano dos estudantes. [GF] - Mas dizes isso em relação há 20 anos ou em relação há10 anos? Desde que eu saí de Projecto contigo, acho que em 2003?.../ Desde então, consegues fazer um paralelo? Na altura ainda estavam muito presentes. [JC] -Vamos colocar o assunto deste modo: falando do 1º ano, os estudantes passam 29 horas por semana na Faculdade. Com excepção da quarta-feira -sem aulas à tarde – e da sexta-feira – com o final das aulas às 16h30 -, nos restantes dias, os estudantes entram na FAUP às 9h00 e saem às 18h30. Isso faz parte do debate entre docentes e, pelo que sabemos, entre estudantes. [GF] - Nessa altura ainda estavam muito presentes. [JC] – Em 2003, os trabalhos? Creio que sim./ Eu não sei se notas alguma coisa diferente na Teoria. O perfil dos estudantes era a outra coisa que tu estavas a questionar. [GF] - Quanto a isso, não tenho esse contacto no quotidiano a que te referes. [JC] - O que penso é que estamos numa época em que se procura muito os caminhos da eficácia. Isto de modo geral, e não me focando exclusivamente nos nossos estudantes e na FAUP./ Creio que, como resultado disso, nos afastamos daquela deriva que acontece sempre na activação da imaginação e nos processos de descoberta, e que com toda a certeza acontece na prática de projecto: uma pessoa perde-se em caminhos que depois até podem não dar grande fruto, mas são sempre campos de experimentação que é preciso trilhar. Isso é fundamental na aprendizagem. [GF] - Para conseguir descobrir o melhor. [JC] – Haverá outra forma de lá chegar?/ Não quero fazer um discurso catastrofista. Seria errado e injusto. É necessário ter consciência de alguns riscos, quando existam, e fazer o necessário para continuar a induzir o questionamento e o aprofundamento. Ou seja, alguma tendência - quando exista, se existir - de ir de um ponto de partida a um ponto de chegada com eficácia, sem experimentação, tem de ser sempre evitada. [GF] - Descreves bem, é mesmo isso. [JC] - A aprendizagem faz-se através de um processo assente no questionamento, vive de perguntas constantes. Não de certezas e resultados imediatos. É preciso fazer um esforço para a abertura ao erro e à consequente disponibilidade para a frustração que resulta de não se encontrar respostas para as perguntas após cada tentativa – e isto não é válido apenas para o processo de projecto. Claro que isso implica iniciativa e disponibilidade para arriscar. Sem receios, o foco deve ser o processo de descoberta e não no resultado imediato. [GF] - Antes era um acesso ao conhecimento, que era outra coisa, que não era... [JC] - É preciso tactear lentamente a procura de resposta, para poder vir a encontrá-la. E, falando de modo amplo e para além do contexto de ensino e aprendizagem, o tempo está muito acelerado. Parece-me muito isso. É um lugar-comum inevitável. [GF] - E é assim que tu caracterizaste a mudança de perfil com estes termos que estás a usar, não é? [JC] - Creio que há uma mudança de contexto, no mundo em que vivemos. Agora, também te digo uma coisa: é também verdade que os estudantes têm mais referências, conhecem muito mais coisas, têm mais mundo do que sinto que nós tínhamos. Há mais comunicação, viaja-se mais. Isso é óptimo. Mas também pode ter um efeito negativo: a ideia de que se conhece muitas coisas, com mais facilidade, de que se tem acesso facilitado à informação, pode levar a que se desconsidere… pelo menos, que não se valorize o suficiente, as oportunidades. Por exemplo, as conferências… era inimaginável para nós não ir. (Risos). Havia uma conferência e íamos todos, porque de facto era o modo como a informação nos chegava. [GF] - A biblioteca era quase um templo sagrado. [JC] - Sabes que isso já não acontece tanto… não estou a dizer-te isto como uma nota totalmente negativa, porque de facto a informação está muito mais disponível. Circula muito mais, e isso é muito positivo. É mais fácil viajar dentro e fora do país. O que eu quero dizer com isto é que há uma maior capacidade de ter acesso às coisas. Também é mais fácil comprar livros./ Se calhar, não é sentida tanta necessidade... A vertigem ou urgência já não existem do mesmo modo. [GF] - Porque têm disponível muito mais informação. Nós pedíamos livros emprestados a colegas. [JC] - Aquilo que todos dizemos é que a relação com o livro mudou. Mas vejamos: comparativamente com aquilo que nós fazíamos... dizemos frequentemente entre alguns de nós, docentes, que os trabalhos de projecto dos estudantes actuais são melhores, têm até mais ar de arquitectura, entendes? Provavelmente, há uma mudança de processos que tem a ver com os tempos, que são necessariamente diferentes. Estaremos em adaptação? Vamos ver… De qualquer modo, a biblioteca tem de continuar a ter um papel importante na formação dos estudantes. É fundamental. [GF] - A nossa relação com a informação também é diferente hoje em dia. [JC] - É natural. Tens razão./ Nós transformámo-nos ao longo deste tempo. Os estudantes já cresceram com esta mudança, já conheceram a vida deste modo. Já se formaram enquanto pessoas, assim. Se calhar, também sentem menos a necessidade de andar a tactear porque, além de outros factores que mudaram o modo como nos relacionamos com o mundo e a incerteza, também sentem que têm mais acesso à informação./ Sem deixar de ressalvar que é preciso estar vigilante relativamente a essas facilidades, eu arrisco a ideia, como te disse, de que os trabalhos de projecto são melhores. E há, de facto, estudantes extraordinários. Há estudantes muito bons, que aliam a capacidade de realização a um maior conhecimento... [GF] - Quando tu vieste para a Faculdade, percepcionaste este ambiente como uma coisa de excelência? A nível dos professores e alunos? [JC] - Quando vim, falei com o Luís Urbano que já tinha entrado antes, um ano antes de mim. E ele dizia exatamente isso, que o Porto era a referência do ensino. [GF] - Ficaste orgulhoso de estar aqui. [JC] - Os nossos professores vinham do Porto. Portanto.... Era uma espécie de Olimpo. [GF] - Era uma espécie de Olimpo. (Risos). [JC] - Ou saíam do Olimpo e iam a Coimbra dar aulas. (Risos) Depois nós começamos a contatar com a realidade e vimos que o Olimpo… se calhar, é mais terreno do que nós o imaginávamos. Havia era uma coisa fantástica, no Porto. Já havia uma sedimentação do ensino de muitos anos. [GF] - Por outro lado, estavam inseridos num meio onde havia mais cultura arquitetónica. [JC] - Coisa que em Coimbra não havia de todo. Mas depois nós começámos a entrar na prática pedagógica, na prática quotidiana da Escola./ E vemos que as coisas.... Tirando essas diferenças de haver um lastro de ensino de décadas, de reformas de ensino com frutos, etc., as coisas não eram assim tão distintas quanto isso nas questões da didáctica e quanto aos objectivos. Na verdade, o Porto tinha melhores instalações e as pessoas conheciam-se há muitos anos e, portanto, quase se entendiam sem ter que falar. São coisas fundamentais no ensino. [GF] - Hoje já não é assim porque a Escola é muito mais plural. [JC] - Quando tentas encontrar aqui modos de pensamento comuns, talvez consigas encontrar um método, se quiseres. Mas há figuras muito diferentes, mesmo no corpo docente… já para não falar daquelas que a Escola tem vindo a formar. A sociedade está muito diversa, plural, o país está mais aberto ao exterior. É inevitável que as pessoas formem o seu leque de interesses a partir da sua própria mundividência, de referências mais distantes, e não necessariamente como resultado imediato do contacto com os mais próximos no quotidiano e tendo apenas em conta a partilha de um projecto comum. [GF] - Enquanto profissionais. Notas essa transformação ao longo destes 20 anos?/ Seguramente./ [GF] - Uma Escola mais plural? [JC] - Uma Escola com pessoas cuja formação aconteceu num país já perfeitamente integrado na União Europeia, que fizeram Erasmus, que se iniciaram profissionalmente num tempo de viagens baratas, com mais facilidade de acesso a informação muito diversa... nota que não estou a fazer um juízo qualitativo…/ Passaste do papel de estudante para o papel docente: não notas?... O corpo docente já não é tão coeso, se pensarmos no que foi o papel dos nossos professores e daqueles que os antecederam para a construção da Escola. As pessoas estiveram juntas para lutar por determinadas causas. E com isso sedimentaram um projecto de escola. As pessoas que vieram numa geração a seguir, talvez ainda sejam um pouco fruto desse envolvimento, desse ambiente…/ Não há aqui qualquer valoração!... É normal. O “edifício” estava construído. Sentindo-se essa calma, as diferenças afirmaram-se. E uma outra coisa que não é exclusiva do Porto, é sentida noutros lados, com outros amigos com quem conversamos, os parâmetros, métricas e definições das carreiras universitárias vieram acelerar essas diferenças./ Sem que deva esquecer-se a diversidade saudável, creio que neste momento há necessidade de alguma convergência... [GF] - Mas os que vieram a seguir, da nossa idade ou pouco mais velhos, já não tiveram essa experiência. [JC] - Já não tiveram aqui uma espécie de luta comum que as unisse, como um corpo docente tão uno, tão coeso. Quando olhamos de fora – pode ser uma percepção errada – parece que eram todos amigos. Creio que não é uma percepção totalmente falsa. Já ouvi Alexandre Alves Costa dizer, num debate, que eram amigos. [GF] - Mas quando vês agora a Escola plural, a proveniência das pessoas, é muito diversa. [JC] - Isso tem o seu peso. O que são enquanto pessoas, enquanto profissionais de arquitectura, enquanto arquitectos que observam a Arquitectura e gostam de Arquitectura, é uma condicionante. Como dizíamos há pouco, viaja-se muito mais. As pessoas lidaram com outras realidades. Desenvolveram interesses próprios. Portanto, essa pluralidade existe com toda a certeza. [GF] - Já é impossível haver uma tendência tão forte nas referências, no ensino, na pedagogia. [JC] - Acredito que haja pontos de vista comuns. Mas tem muito mais a ver com o entendimento de um método, com o entendimento da prática arquitetónica como uma aproximação muito intuitiva ao projecto. Menos conceptual, se quiseres. Essas são marcas que creio que se mantêm. [GF] - É a procura da solução de uma forma, de um modo progressivo, através do desenho. [JC] - …tentando um entendimento das premissas, das possibilidades, do local, numa aproximação gradual à solução…. embora isto não tenha nada a ver com a crença num contextualismo dogmático. [GF] - As pessoas, independentemente de terem referências diferentes, têm esse método comum, que tem a ver com o seu próprio tempo, com os instrumentos de desenho. [JC] – Talvez seja isso./ Mas também falas com arquitetos de outros contextos, de outras paragens em Portugal, com aqueles que nos interessam... Manuel Mateus, por exemplo, diz coisas análogas: afirma que o contexto das cidades, na Europa, onde as cidades têm séculos, é com toda a certeza importante, no propósito transformador da Arquitectura. Cito-o de memória, tendo presente a entrevista que concedeu ao Expresso na sequência da atribuição do Prémio Pessoa. O que retiramos das suas palavras é que a Arquitectura deve propor novas camadas de significado, não a anulação de significados como resultado de desatenção ou de leituras apressadas das circunstâncias./ Podemos extrapolar para o restante território, é verdade, notando como esta formulação é, porventura, um terreno comum na Arquitectura Portuguesa. É uma hipótese… [GF] - Portanto, dizes que o contexto e a história são dados fundamentais para o projecto, porque o projecto tem que lidar com realidades consolidadas. [JC] – E, portanto, não deve ser desatento em relação a esse substrato onde vai intervir./ Fechando a questão dos estudantes, acho que eles de facto podem não ter umas coisas, mas têm outras, seguramente. Têm muito mais informação do que nós tínhamos. Os estudantes têm à sua disposição meios que nós não tínhamos. Há uma mudança de substância naquilo que se passava antes e que se passa agora. Eles já não dependem tanto de nós para ter acesso à Arquitectura. A liberdade comporta sempre alguns riscos, mas ninguém será capaz de negar o valor da liberdade. A aprendizagem implica livre-arbítrio. Isto é especialmente verdade numa disciplina criativa. [GF] - Nós, da escola. [JC] - Exactamente. Encontram outros caminhos. Correndo o risco de me repetir, através de viagens, dos Erasmus, etc. [GF] - E este tipo de reflexão, estes espaços de discussão, já não há muito frequentemente. [JC] - Tudo isto, também nos mudou a nós, na verdade. Anda tudo na correria das aulas. Não se pára o necessário./ Por outro lado, a tua referência mais sólida pode não ser aquela que está ao lado. Vou fazer uma analogia. Lembro-me do conceito de“território arquipélago” - Álvaro Domingues referia-o nas aulas de mestrado. O conceito diz-nos que as cidades não estabelecem as suas relações mais fortes, culturais, comerciais ou outras, com outras cidades, necessariamente como resultado de relações geográficas de proximidade, de contiguidade, etc. Pelo contrário, diz-nos que o podem fazer a partir de afinidades efectivas com outras cidades e tendo em conta as redes e infraestruturas que possam facilitar os contactos. É um processo independente da distância. [GF] - Connosco acontece a mesma coisa. [JC] – Como possibilidade, já não estabelecemos necessariamente relações mais fortes com quem está fisicamente mais próximo, a trabalhar ao nosso lado, mas com quem se estabelece maior empatia profissional ou outra, ou seja, pela existência de interesses convergentes (académicos, culturais…). E até pode ser a uma distância maior. É um processo análogo. III. [GF] - Sobre a tua prática contemporânea e atual… Há 10 anos, houve aqui um momento de crise. Como é que tu vês o que se está a fazer em Portugal, atualmente? Quando tu acabaste o curso, a arquitectura estava num ambiente de “star system”. [JC] - Sim, é verdade… [GF] – Depois disso, há cada vez mais arquitectos. [JC] - É verdade que sim./ Mas eu duvido que o panorama da arquitectura pós-crise das dívidas soberanas esteja diferente daquilo que era no período pré-crise./ Houve um momento em que se acreditava numa arquitectura mais “pobre” ou essencial, feita com menos meios. Até houve aquela representação portuguesa na Bienal de São Paulo de 2013, com o tema “Discrição é a Nova Visibilidade”. Foi uma iniciativa do Nuno Sampaio, que estava correctamente convicto, como, aliás, todos os envolvidos e também os que observavam de fora. Na mesma época, o Luís Miguel Correia, o Nelson Mota e a Susana Constantino, meus amigos e colegas de Coimbra, até ganharam o Prémio Nacional de Arquitectura em Madeira com a intervenção nuns campos desportivos em Coimbra [N10-II], utilizando muito poucos meios. A obra tem óbvios méritos, mas foi muito destacado o facto de ser realizada com uma enorme contenção./ Creio que os arquitectos já se esqueceram desse contexto. Não o digo como uma crítica. Felizmente, todos nos esquecemos. Os arquitectos não estão localizados à margem da sociedade. Os arquitectos trabalham com os meios que têm disponíveis. Claro que faz todo sentido ter um discurso que se foque no uso racional dos recursos, tendo em conta os constrangimentos ambientais. Aliás, um dos projectos que mais prazer me deu a fazer foi o do Campo Desportivo de Santa Cruz, em Coimbra, que fiz com o Luís Miguel Correia: justamente pela racionalidade das decisões e das soluções a que nos vimos forçados por questões orçamentais. Ou seja, não vejo que o facto de os arquitectos se verem forçados a uma certa contenção possa ser negativo; pelo contrário, tudo o que possa introduzir racionalidade no projecto e na obra é sempre um óptimo estímulo. Mas não nos esqueçamos que se tratou de uma época de enorme carência [resgate de Portugal pela Troika], muito difícil para o país. [GF] - Se houver ouro, faz-se em ouro. [JC] - Aceito a figura de estilo. Se a sociedade tem mais meios que pode disponibilizar, os arquitectos utilizam mais meios. Portanto, agora não falando especificamente de Portugal, eu não vejo que aquilo que se está a fazer internacionalmente seja totalmente distinto do que se fazia antes. [GF] - Houve aqui uns prémios para o Aravena, etc. [JC] - Sim, com certeza. Foi prémio Pritzker, mas isso já foi por volta de 2016./ Podemos ter uma consciência maior, de facto, de que temos que utilizar bem os recursos, que eles não são infinitos. Estou a falar dos recursos económicos, mas não só: a informação de que o planeta está ameaçado é bem conhecida. [GF] - Já se retorna a uma arquitectura de revista? [JC] - Não tão feérica, talvez. Mas acontece um pouco aquilo que aconteceu na banca. Há críticas ao modo como a banca voltou a remunerar os acionistas e os gestores. Houve uma certa contenção, num determinado momento… E isto é humano. A crise foi há 10 anos. O resgate em Portugal foi há 10 anos. Já nos vamos esquecendo do que aconteceu./ Na arquitectura, é a mesma coisa. Se nós queremos utilizar pedra, porque é que havemos de utilizar betonilha? A sociedade põe-nos ao dispor meios que nos permitem usar pedra… O discurso vai nesse sentido. Claro que isto é um pau de dois bicos. Não é só do ponto de vista ambiental que o planeta se ressente. Há pedreiras, em Portugal, que estão esgotadas. Os recursos são de facto finitos. É preciso olhar de outro modo. Tal como nós, a Arquitectura vai ter de se adaptar. [GF] - Voltando atrás, quanto às referências nas escolas, falámos de Herzog, Eduardo Souto Moura, Tadao Ando, nos anos 1980/90. Hoje, o que é que os estudantes seguem? [JC] - Eu tenho alguma dificuldade em responder-te a essa pergunta, porque estou no 1º ano, onde os estudantes têm necessariamente poucas referências. Mas observo, embora não tão sistematicamente como pediria o sentido da tua pergunta, que abordagens muito mais conceptuais, do centro da Europa, como da Suíça, têm grande peso atualmente. [GF] - Continuam a ter. [JC] – Creio que continuam a ter. Têm muito peso naquilo que os estudantes vêem. [GF] - Mas continua a ser uma arquitectura minimal, com muito vidro ou transparência, volumes... [JC] - Valério Olgiati é um arquiteto que os estudantes adoram. E essas referências de muito vidro, também, arriscaria dizer. [GF] - Eles ainda gostam das coisas de Siza? E de Eduardo Souto Moura? E das caixas de Herzog & De Meuron e de Peter Zumthor? [JC] - Já mudaram. Já não fazem essas caixas. São bastante mais experimentais e mudam de obra para obra… a dupla Herzog & de Meuron./ No 1º ano, Siza faz muito parte do discurso, desde logo enquanto referência metodológica. Além do mais, Siza é um arquitecto que toca com profundidade as questões do espaço, da luz, da forma. Mas se me perguntares… Como te disse, eu tenho alguma dificuldade em responder à pergunta porque não estou nos anos mais avançados, os anos em que os estudantes recorrem mais conscientemente à cultura arquitectónica que vão consolidando. Uma cultura mais rica, mais densa./ [GF] - No clima da crise havia muitos grupos pseudo-experimentalistas, e cruzamentos com a arte. Havia muitos estudantes que, quando acabavam o curso, estavam a fazer essas coisas porque não tinham trabalho e porque... [JC] - Haverá coisas mais meritórias do que outras. Num contexto de falta de trabalho, é natural que cada um experimente as vias que lhe parecem mais naturais, mais fáceis ou mais imediatas. [GF] - Antes disso, tivemos aquela geração do Nuno Brandão, etc. Em termos de arquitectura, independentemente da Escola e dos alunos, o que é que tu achas de… [JC] - De pessoas daqui que se afirmem? [GF] - Na arquitectura portuguesa, quais são os últimos arquitetos a surgir que tu achas que são interessantes? [JC] - Agora é uma profissão muito diversa, com muita gente. Até é difícil acompanhar. A crise também lançou muitos arquitectos, pessoas que conseguiam, com poucos meios, com poucas despesas fixas, lançar uma carreira. E não te esqueças que as redes sociais permitem aos novos arquitectos fazer a divulgação e promoção do seu trabalho, já sem necessidade da mediação dos campos especializados, tal como a crítica, publicações, etc./ Nós também começávamos todos com pouquíssimos meios! [GF] - Nós ainda precisávamos de menos meios, porque nem precisávamos, nem tínhamos que comprar computadores. [JC] - Mas, de facto, com o computador de trabalho, que já vinha da Faculdade, muitos arquitectos conseguiram começar. Não será só por isso, mas há muitos escritórios novos, de gente muito nova. Até já é difícil conhecê-los. Mas entre os arquitetos portugueses que mais me impressionam, de uma geração mais nova do que daqueles que são referidos como os mestres da Arquitectura Portuguesa - que já não é tão nova assim, porque já têm todos mais de 50 anos… como te dizia, entre eles estão o Manuel Mateus e o João Mendes Ribeiro. [GF] - Mas o João Mendes Ribeiro já tinhas há 20 anos, não é? [JC] - Sim, mas não tinha a obra que tem. O João começou a ter mais obra, e obra até com uma certa escala, em anos mais recentes. Estou a lembrar-me de obras com outra dimensão. Por exemplo, o CAV, o Chimico e o Edifício das Caldeiras. [GF] - Em anos mais recentes, o Arquipélago nos Açores. [JC] – Sim, sem dúvida./ Mas, de facto, é um arquiteto que tem feito sobretudo obra de pequena escala. As obras do João não têm a escala das dos Mateus. É um escritório com outra dimensão. [GF] - Estamos a falar de um escritório que tem 8 pessoas e outro escritório que tem 40 a 50 pessoas. José, Obrigada. [JC] – Gonçalo, antes de acabar esta conversa, que te agradeço – foi uma óptima forma de reflectir sobre alguns assuntos que nos interessam a todos e também de reavivar algumas memórias - queria sublinhar duas ou três ideias. Quando me perguntas quais as diferenças que encontrei entre Coimbra e Porto, é preciso clarificar o contexto em que ingressei e frequentei o curso, entre 1988 e 1994. Os meus colegas e eu - juntamente com os professores - estávamos a iniciar alguma coisa do zero, que não se sabia bem o que iria ser. Hoje, a aposta está mais do que firmada, mas, na altura, cada passo era uma conquista. No 1º ano, havia uma incerteza grande, estávamos praticamente sozinhos com o João Mendes Ribeiro (que no final do ano letivo até acabou por ir para Viseu, para a Unidade Pedagógica da FAUP que ali funcionava) e não se pode dizer que houvesse envolvimento cultural/académico e ambiente de Arquitectura. Não havia sequer instalações próprias. As aulas de Projecto I funcionavam no edifício das Matemáticas, o que impedia a criação de um sentido identitário para o curso e para os próprios estudantes. As instalações próprias chegaram só no 2º ano, e foi nessa ocasião que, em 1989, vieram do Porto, como te contei, Fernando Távora, Alexandre Alves Costa e Domingos Tavares. Com a sua participação na Comissão Instaladora do Curso, pode dizer-se que se inicia um segundo momento no Curso de Arquitectura de Coimbra. E se nos faltava lastro e densidade, por falta de tempo do curso e de experiência - pode até dizer-se que faltava uma cultura e ambiente de ensino de Arquitectura na Universidade de Coimbra -, por outro lado, a experiência de estar a construir algo novo, depois dos momentos iniciais de incerteza… será que este curso irá no bom rumo, perguntávamo-nos no início, com especial apreensão, até porque eu tinha ingressado ali por manifesta e normal ignorância sobre o que seria a Arquitectura, já que o fiz por opção: a minha média, de 17,3, tinha-me permitido ingressar em qualquer curso de Arquitectura que tivesse escolhido… Por outro lado, dizia-te, foi uma oportunidade única e criava uma ânsia de participação e envolvimento imensas. Refiro-me à participação na construção do curso, refiro-me ao envolvimento com os professores, com quem tínhamos uma relação muito próxima. Também estavam a passar pela experiência de construir algo novo, além de que éramos muito poucos. E havia, de facto, muito bons professores, muito dedicados, com a capacidade de nos motivar superlativamente. Alguns desses professores estavam também a iniciar-se no ensino - Bandeirinha, Walter Rossa, José Fernando Gonçalves, João Paulo Providência, João Mendes Ribeiro, Pedro Maurício Borges, Nuno Grande, que tinha tido uma passagem como monitor, creio, no Porto. E, mais tarde, Jorge Figueira. Isso motivava-os também de um modo muito singular, já que aliavam essa experiência inaugural ao início de um curso. Era, por assim dizer, um duplo início. Havia também figuras incontornáveis do ensino e da Arquitectura, pessoas extraordinárias e muito cultas. Naquele contexto era uma oportunidade imperdível e representava uma esperança nova numa formação sólida. Estou a falar-te de Fernando Távora (no 4º ano de Projecto), apaixonante e sábio, que prendia a atenção mesmo dos mais distraídos. Fernando Távora enchia uma sala. Domingos Tavares (em História do 3º ano), tinha grande capacidade de motivar os estudantes, com um discurso fácil, fluído, mas rigoroso. José Aguiar (em Teoria da Arquitectura do 2º ano) revelou-nos a magia da Arquitectura logo no início do curso, através da Arquitectura Contemporânea. Foi como uma epifania. Alexandre Alves Costa (em Projecto 2 e, no 5º ano, em História de Arquitectura Portuguesa) dava-nos a ver a Arquitectura de um modo culto, clarividente, com imensa paixão e rigor, motivando os estudantes para a história como matéria operativa, como o Alexandre sempre a viu. Manuel Mendes Tainha era um homem grande, mas muito delicado (em Projecto 3) - lembro-me de um exercício, de grande radicalidade e atualidade, de projecto de um anfiteatro de ar livre, que lançou no início do ano, para aquecimento, digamos. Consistia num exercício de escavação e aterro: a terra que era retirada do solo tinha que ser depositada contiguamente ao local dessa primeira operação - e lá vinham as referências de Francesco Venezia, em Salemi, etc. Gonçalo Byrne (em Projecto 5), que, com grande generosidade para partilhar a sua cultura, sempre de modo simpático e com grande sensibilidade no modo como abordava mesmo os trabalhos mais frágeis, tinha grande capacidade de nos por a trabalhar imenso: o início do ano fez-se com uma espécie de workshop, rápido, que visava o tratamento de um percurso entre dois pontos na cidade como meio de lançar a estratégia para o desenvolvimento do exercício de Projecto e, não sendo determinante, chegámos mesmo a fazer uma direta para entregar o trabalho o melhor possível; Paulo Varela Gomes (em História da Arquitectura Contemporânea), de trato fácil e cujas capacidades de comunicação e a erudição são mais do que reconhecidas, tinha efeitos notórios em nós. Mais tarde juntou-se-lhes Raul Hestnes Ferreira (Projecto do 1º ano), que eu já não tive como professor, mas que contribuía de modo decisivo para o ambiente do Escola e para o ensino, não só nas salas de aula, com os seus alunos, mas noutros âmbitos, em debates com os outros professores. No início da nossa formação, João Dixo e Alves Martins, arquitecto – um óptimo arquitecto, embora com pouca obra… segundo o IAPXX, é dele o edifício da Emanha, na marginal da Figueira da Foz… dizia-te que João Dixo e Alves Martins fizeram de Desenho um instrumento fundamental para nos despertar para uma nova disciplina. Ou seja, vivemos um contexto que pelas circunstâncias de partida e pelo privilégio que tivemos de conviver (mais do que ser ensinados) com esses professores - os nossos metres… esse contexto, com as suas especificidades despertou em nós a ânsia de aproveitar tudo que nos era disponibilizado. Cada sala de aula que era reabilitada e integrada nas instalações era um acontecimento; as conferências dentro ou fora da Escola, eram momentos obrigatórios. Em contraste, quando vim para o Porto, primeiro como estudante do mestrado e, mais tarde, como docente de Projecto 1, encontrei uma Escola já consolidada, com um corpo docente já estabilizado. Refira-se que vim para aqui muito novo. Pouco tempo tinha passado após ter terminado o curso, em 1994, com 24 anos. Para o Mestrado vim em 1996, com 26 anos. E ingressei em 1999, com 29 anos, no 1º ano, a dar aulas numa turma prática de Projecto sob a regência de Sergio Fernandez. O Sergio foi um outro mestre para mim, com quem fiz uma segunda escola... Ou seja, estava tudo ainda muito fresco. Há que dizer que o Porto era para mim, para nós, em Coimbra, uma espécie de mito; aliás, alguns dos nossos professores iam do Porto a Coimbra. Estou a enfatizar o significado que dávamos ao valor do Escola do Porto e a esses professores. Mas os mitos desvanecem-se. Felizmente, para que os possamos habitar. Isto não retira qualquer importância ao valor da Escola. Simplesmente, para que me sentisse em casa e pudesse participar no quotidiano da Escola, teria que abandonar essa ideia de mito. Isto leva-me à pergunta sobre a especificidade ou identidade. É uma questão difícil, já que as questões identitárias são sempre de difícil circunscrição e formulação. É assim em termos pessoais e também com os povos. Há um sentimento que nos faz situar perante os outros, mas de difícil tradução em palavras ou numa ideia simples e clara. Pode apontar-se alguns aspetos identitários, quando alguém ou um povo tentar definir-se, mas nunca se chega a uma definição global e satisfatória. Podemos recomhecer que o corpo docente (e discente, também) é já heterogéneo, com pessoas de gerações, proveniências, experiências de vida e porventura com culturas diversas. Podemos admitir a existência de um modo de ver o ensino da Arquitectura partilhado, transmitido como um legado entre gerações. Isso não terá impedido evoluções, saudáveis dissidências, modos de entender ou fazer Arquitectura particulares. As diferenças não terão anulado a possibilidade de se admitir uma base comum. Uns dirão que a mesma vem do desenho. Outros dirão que se trata de um entendimento mais intuitivo do Projecto de Arquitectura, segundo uma aproximação gradual à solução - que articula determinações intelectuais (a formulação de uma ideia prévia, referências, pensamento abstrato, etc.) com a descoberta e a revelação cuidada das circunstâncias pela proposta ou através da estruturação da proposta. Não sei explicá-lo muito bem, também nunca ouvi uma definição muito convincente e a que de um modo consensual todos aderissem dizendo "é isso mesmo". O que acabo de dizer é muito incompleto e pode não ser exclusivo do Porto. Em síntese, no Porto, as pessoas partilham um qualquer terreno comum, mas o que o torna tão fascinante e rico é o facto de ser de alguma forma indizível, indefinível. Mendo Castro Henriques disse, numa conferência na FAUP, que a Filosofia da Consciência se define pelo que não é. Coerentemente, enunciou o que a mesma não é, para circunscrever o que possa ser. Talvez, por analogia, se deva procurar o que o ensino na FAUP não é, para procurar enunciar a sua melhor definição… isto se o tema for suscetível de preocupação, porque, verdadeiramente, pode não ser. A ambiguidade faz parte da vida. É um terreno riquíssimo! Em suma, era isto. Obrigado, Gonçalo.