11/21/21

Uma cidade moribunda: Crise económica e seguintes pandemias

 

Uma Cidade moribunda: Crise económica e seguintes pandemias

Gonçalo Furtado (Mai-Nov 2021).

 

Foto: Ricardo Lima

 

 

Uma cidade moribunda.

Há dois anos, com o vírus, há décadas, com a crise, ou à séculos, com invasões espanholas, francesas, ultimatuns ingleses, e germânicos conflitos. Por isto, isso, e mais aquilo. Por tudo, por nada, uma cidade moribunda.

 

Dito isto, Portugal territorializado no canto continental, junto ao mar. Com uma sensibilidade específica de castros, construções em redor de poderes políticos e religiosos, de renascimento ténue, forte barroco e demais. De modernidade interrompida, depois regionalizada.

Portugal. Que desafios às cidades, após uma crise económica, esquecida com dois anos de preocupações com algo, igualmente, pandémico.

 

Cidades, hoje, que parecem suspensas no tempo?

Cidade lugar de encontro de privados e público, lugar do polikitózôon (Aristóteles). Cidade emersa da sedentarização civilizacional, de escala humana medieval, idealização da renascença, do flaneurismo moderno, do planeamento hierárquico, da crítica anti-urbana, da metrepolização policêntrica, da desdensificação dos subúrbios e shoping-malls. Da hoje global- city, de ambientes artificiais, de simulacros espectaculares (Debord), de não-lugares (Augé), de excessos icónicos (Gencks), e de fluxos (Castells).

 

E as cidades deste Portugal?

Cidades de arruamentos alinhados, embelezamentos, de arruamentos e planificações, de instrumentos e políticas, programas e estratégias.

Cidades, que se deviam desejar, humanas. De habitações, óikos gregas, domus romanas, palácios renascentistas e prédios modernos. Pré-fabricação, standartizações, máquinas de habitar (Corbusier). Lofts sussurrando enigmas: “a house is not a home”? (Banham).

 

E as habitações deste Portugal?

De challets afrancesados em novas avenidas, de confrontos entre casas modernas e casas portuguesas (Lino), dos bairros e habitações sociais, dos blocos plurifamiliar e casa de férias.

Arquitetos que se digladiam com engenheiros e patos bravos por status social. Associativismos pós- democráticos, crises do decreto lei 73/73, internacionalização com dois Pritzkers e, claro, a crise atual. Passagem de panfletins a revistas especializadas, memórias estéticas e críticas

 sociológicas e o radicalismo da total suspeição conceptuais. Escolas de belas-artes, reformas no ensino superior de meado do século, integração universitária e explosão de cursos públicos e privados, e recente adequação a Bolonha.

Elitismo para apetite burguês, consciência de um dever de papel social, ou desilusão em mero serviço. Cidade, objecto de discussão cultural, por todos. Após orgulhos e desvanecimentos.

Academia ou locus de reflexão sobre outras histórias e futuros possíveis, que não esse fim da história que alegam inevitável (Fukuyama).

 

E, neste conspecto, pode a crise económica propiciar a reflexão sobre o transacto século, no que tange a uma cultura do habitar?

Uma crise económica, também esta de 2008, que não veio senão demonstrar a falência de uma perspectiva só mercantil sobre a cidade e a habitação.  Passámos de cidades virtuais (Mitchell), a criativas (Florida), das requalificações de baixos e espaços públicos (Polis etc), ao alarme de uma não sustentabilidade planetária e demais. Mas que perspectivas cumpre avançar, face a actuais estratégias assentes na mera competitividade e marketing urbano, que pouco mostram poder vir a sedar?

 

Após o conhecimento do Censos 2011 e 2021, quantos não têm habitação condigna? Quando tantas casas permanecem a flutuar no mercado da especulação imobiliária? E comos e comportarão as nossas casas quando, outra pandemia quando, se, nos chegar? Futuro, de Inteligência artificial e realidade digital, robótica e data crowd-sourcing. Futuro que não deve descurar uma dimensão humana.

 

Passadas 2 décadas do inicio deste século, quais as políticas da cidade de  futuro para este pequeno país, de industrialização tardia, litoralização, desigualdades e globalização. Que compromisso, social senão politico, podemos ainda tecer, numa comunidade fragmentada, de espetáculo publico a que serve um star system sedento de superficialdiades estéreis?

Vamos ainda a tempo de contribuir, em conjunto, para um debate, que urge, quanto à qualificação das nossas cidades e habitações.

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