writings on architecture, design and cultural studies (incl. cedric price, gordon pask and many other stuff)
12/20/24
CONVERSA SOBRE ARQUITECTURA E ESCOLA DO PORTO _ MAIO 2024 (Hugo Natário com Gonçalo Furtado).
CONVERSA SOBRE ARQUITECTURA E ESCOLA DO PORTO _ MAIO 2024
(Hugo Natário com Gonçalo Furtado).
I .
[GF] - Começava por te perguntar em que ano entraste para a faculdade. E se podias partilhar as memórias - do ambiente, das matérias, dos colegas, etc - que guardas dos anos em que frequentaste o curso.
[HN] - Portanto, entrei em 2001. Foste o Professor de Projecto nesse ano, o teu primeiro ano como docente?
[GF] - A coluna de Projecto é nuclear ao longo do curso.
[HN] - Sim, sem dúvida, O curso teve sempre essa incidência no(de) projecto.
[GF] - No primeiro ano também a aprendizagem do desenho?
[HN] - Desenho foi muito importante. Tivemos a sorte de ter tido o Prof. Joaquim Vieira nesse primeiro ano.
[GF] - Como professor mesmo, assegurou também a tua turma prática?
[HN] - Sim.
[GF] - Ele era o regente.
[HN] - Sim, a Professora Raquel Pelayo iniciou a licença parental um pouco depois do início do ano, e o Prof. Joaquim Vieira veio substitui-la. A turma era fraca, e o Prof. Joaquim Vieira conseguiu dar a volta, posso dizer, com muita persistência da parte dele, e muito trabalho da nossa.
[GF] - Os teus colegas eram?
[HN] - Ricardo Oliveira, Pablo Rebelo, Luís Pita, Catarina Marques, Bruno Costa...
[GF] - Claro que lembro.
/Desse ano, és o único que está na faculdade?
[HN] - Não, está mais malta desse ano: Diogo Aguiar, Ana Neiva, Mariana Sá,...
[GF] - Retomemos aos tempos da tua formação./
Aludias a essa importância do projecto e desenho, nos dois primeiros anos./
E outras matérias? Por exemplo história no quarto ano?
[HN] - Sim, do Alves Costa. Sim, talvez História da Arquitectura da Arquitectura Portuguesa…
[GF] - Com o Alves Costa e com a Marta Peters Oliveira…
[HN] - Sim.
[GF] - Que memórias guardas?
[HN] - Sim, eram aulas interessantes. Às vezes um bocadinho monótonas, porque eram um pouco cansativas. Uma hora e meia ali a debitar, mas era interessante. Ambas as aulas eram interessantes, mas na verdade, e em geral, tínhamos muito pouco tempo para a disciplina.
II.
[GF] - E a área da construção ao longo do curso?
/Ainda era o professor Teles? Em que se começava com o estudo do sistema construtivo da casa do século dezanove.
[HN] - Não. Já não era com o Professor Teles.
[GF] - Portanto já era com o Joaquim Teixeira.
[HN] - Sim, e no Pavilhão Carlos Ramos. Era frequente abordarmos os vários elementos construtivos do pavilhão.
[GF] - Quando dizes elementos, queres dizer a presença de exemplos no próprio edifício. O edifício da FAUP ser tomado per si como um artefacto pedagógico.
[HN] - O Pavilhão Carlos Ramos é um excelente artefacto pedagógico, para além de permitir que todas as turmas do ano estejam juntas naquele espaço. É muito importante, a vários níveis. Pelo facto de Construção iniciar no 2º ano, fará mais sentido ser esse o ano a ocupar o Pavilhão Carlos Ramos.
[GF] - Eu ontem estava a falar com o Madureira, e ele partilhava-me a sua experiência quando começou a dar construção. Talvez nos anos oitenta… muito interessante./
E por exemplo o Siza também deu construção, talvez antes…
[HN] - Sim, tivemos o Madureira em Construção II, no 3º ano.
[GF] - Acho que foram estas personagens: o Siza, o Soutinho, o Gigante, etc. Imprimiram consistência… Parece que antes aparentemente não se daria tanto valor à construção, quando se estudava nos anos sessenta ou antes… Eu achei que pudesse ser o contrário, e ele explicou-me que não.
[HN] - Para a geração do Siza, o Jorge Gigante e o Francisco Melo eram as referências do saber construir.
[GF] - Também falámos na transformação ao nível dos materiais de construção. Talvez ainda anos oitenta, não sei agora exactamente quando, mas o impacto que isso teve na construção. E, consequente e progressivamente, no ensino.
[HN] - É muito interessante verificar o impacto de novas tecnologias da construção e novos materiais na arquitectura./
[GF] - Ensina-se mais os princípios. Ou seja, não interessa se a aplicação é uma janela de PVC, porque o que se ensina é a lógica, enfim como se constitui…/
Como é que era o ensino na tua altura, o ensino da construção? Eu lembro-me que a gente chegava ao 4º ano, um bocado ansiosos com adquirir competências que viabilizassem a concretização dos projectos, enfim, com a transição para o mundo real.
[HN] - Ah
[GF] - Uma ânsia, devido a estar eminente o nosso contacto com o mundo da vida real.
[HN] - O ensino da construção era semelhante, reforçava-se os princípios. Paralelamente, perceber como certos arquitectos “trabalhavam” essa lógica.
[GF] - Há alunos que não querem saber ou não estão tão preocupados com isso. Outros acham que devia haver sempre e mais.
[HN] - É frequente dizermos nas aulas que, nos nossos gabinetes, não dedicamos as manhãs a Projecto e as tardes a Construção. Não é possível. Talvez haja necessidade de uma aproximação entre as duas unidades curriculares.
[GF] - Mas a minha questão é, como é que foi no teu curso em particular?/
Há duas décadas como é que era?/
Eu estudei nos anos noventa, ingressei em 1993.
[HN] - Eu entrei em 2001.
[GF] - Portanto eu poderia falar sobre a década de noventa, mas diz-me como é que era na década seguinte
[HN] - Por exemplo, a Construção, e ao contrário de agora, existia um primeiro exercício analítico.
[GF] - Do Pavilhão da Quinta da Conceição, o pavilhão de ténis, etc.
[HN] - Sim, e também a Piscina de Leça e o Pavilhão da APDL..
[GF] - Deve ter sido quando se começou o estudo pela arquitetura moderna e não por uma arquitetura mais antiga.
[HN] - Era uma introdução ao exercício da casa burguesa portuense, mas de grande importância.
[GF] - A análise da casa burguesa. Do século dezanove.
/Tiveste ao contrário que nós. Isto é, na minha altura a ordem era inversa.
[HN] - Ultimamente não temos feito a casa burguesa.
[GF] - Os alunos não podem aceder às casas, para proceder ao levantamento. Ter contacto directo com esse sistema construtivo base.
[HN] - E no 3º ano encontrámos o Madureira.
[GF] - O 3º ano era com o António Madureira.
[HN] - Lembro-me que os exercícios práticos eram feitos nas aulas.
[GF] - Faziam um fascículo A4, percorrendo diversos elementos e sistemas construtivos
[HN] - Por exemplo, uma determinada aula era dedicada às fachadas ventiladas. Então desenhávamos um pormenor de uma fachada ventilada a tinta da china e entregávamos no /final dessa aula. Na aula seguinte era devolvido, com as devidas anotações.
[GF] - No fim do ano obtinha-se uma compilação de umas trinta folhas A4.
[HN] - Sim, ficávamos com um pequeno atlas da construção.
[GF] - E no 4º ano?
/Aparecem as Estruturas e Redes.
/Paralelamente também existiam outras disciplinas, em que se providenciavam matérias técnicas. Há um corpo de professores vocacionado para tal. Como a Clara Vale, entre muitos outros.
/Estruturas era lecionada pelo Rui Póvoas.
[HN] – Sim. A Professora Clara estava com as redes e infra-estruturas.
[GF] - E no que tange a outras áreas? Por exemplo as matérias de urbanismo etc, foram importantes para ti?
[HN] - O projecto urbano (planeamento urbano) era no ano que estávamos em Erasmus, portanto…
[GF] - Ah pois, se calhar metade dos alunos usufruía do Erasmus.
[HN] - Sim, metade talvez.
III.
[GF] - Tinham, então, 6 meses de estágio académico.
[HN] - Sim, no primeiro semestre do 6º ano…
[GF] - Salvo erro acho que foram dos últimos a fazer isso.
[HN] - Talvez.
[GF] - Nos seis meses seguintes estavam dedicados à prova final. Eram seis meses para o estágio e seis meses para a prova final.
[HN] - Sim. Mas a maioria não conseguia fazer em seis meses.
[GF] - Quase ninguém fazia em seis meses.
[HN] - Porquê? Porque entrávamos na dinâmica de escritório, e dependia do escritório não é?
[GF] - Ficavam logo um pouco envolvidos, na dinâmica dos escritórios.
[HN] - Eu estava no João Álvaro Rocha, tínhamos bastante trabalho, projectos interessantes, era sempre complicado interromper.
[GF] - Presumo que uma parte dos alunos procedessem à entrega em épocas posteriores, ou mesmo no ano seguinte.
[HN] - Optei por entregar a tese no ano seguinte, fazendo a tese à noite, e aos fins-de-semana, sempre que o trabalho no João permitia. Foi uma fase de muitos concursos, não foi fácil conciliar.
[GF] - O João Rocha faleceu pouco depois de eu ir à América do Sul, onde admiravam a sua obra, e pediram que lhe trouxesse algo.
/E como professor, tens alguma ideia?
[HN] - Quando entrei na faculdade ele já não estava.
[GF] - Tenho ideia que em determinado ele deve ter lecionado também nos EUA?
[HN] - Sim, Cornell.
IV.
[GF] - E o ambiente da escola? Na minha altura tínhamos os churrascos, depois fizeram-se umas manifestações por causa da prova final, etc. Devem ter havido mudanças curriculares, talvez, que comportassem impacto nos últimos anos curriculares.
[HN] - E tivemos que fazer o exame da ordem, …umas formações por força disso…
[GF] - A atribuição de um espécie de atestado de competência às Faculdades de arquitetura não é?
[HN] - A Ordem dos Arquitetos não confiava na competência do ensino nas faculdades, então nós tínhamos que fazer um conjunto de formações…
[GF] - Pois. Eram então requeridas formações pela Ordem, e exame de acesso.
[HN] - Formações em diferentes matérias, e depois tivemos um exame, que era no fundo o exame de entrada na ordem.
[GF] - E como é que vocês vivenciaram isso?
[HN] - Foi um absurdo completo. Para além da questão da formação em si, do tempo, havia o custo. As formações e o exame eram bastante caros, para além das deslocações para quem não residisse no Porto ou em Lisboa.
[GF] - Não foi entendido de forma pacífica pela geração de então, a forma como estava estruturado esse último ano, e a passagem à Ordem.
[HN] - Foi uma situação muito contestada, foi uma tentativa de talvez se se financiarem rapidamente através dos novos membros…
[GF] - A formação é longa, mas estariam à vontade para fazer esse exame… comparativamente?
[HN] - Existiam temáticas que não eram lecionadas na Faculdade (Higiene e Segurança no Trabalho). Outras já o eram (Acessibilidades ou SCIE, por exemplo). Mas não sei exactamente o que se passava nas outras Faculdades.
[GF] - Deontologia etc.
/Sim, um dos módulos era Deontologia, directamente relacionada com o exercício da profissão.
/V./
[GF] - Referes-te a regulamentos que já se percecionavam como relevantes.
[HN] - Estavam a entrar no domínio do projeto.
[GF] - Penso que também como eco de uma homogeneização na europa.
[HN] - Sim.
[GF] - A lei da acessibilidade é de 2008, será?
[HN] - 2008. Durante o curso abordávamos superficialmente o tema.
[GF] - Cada vez mais um projecto teve de cumprir mais regulamentos, alguns surgiram durante as últimas décadas. Comportou mudanças, em termos de exigência da prática profissional.
[HN] - A Arquitectura é cada vez mais multi-disciplinar, a exigência aumentou necessariamente.
[GF] - A práctica profissional reflectiu essa sobrecarga de exigência necessária, e é necessário acompanhar com permanente actualização.
[HN] - Hoje, todas as equipas intervenientes num projecto devem estar o mais actualizadas possível, mas é um processo que deve começar pela Universidade.
[GF] - São coisas que, naturalmente, tem vindo a ganhar protagonismo, e tornam o projecto numa realidade cada vez de maior complexidade.
[HN] - O que explica, de certa forma, uma certa uniformização das soluções.
[GF] - Acresce o regulamento da térmica, de atender-se à eficiência energética, etc.
[HN] - Ele tem vindo a sofrer várias alterações.
[GF] - O regulamento da térmica acho que é de também dessa altura.
[HN] - Sim, 2006.
[GF] - E com este “boom” da reabilitação e do turismo?
[HN] - Acho que a nossa geração não estava minimamente preparada.
[GF] - Para este tipo de exigências ou intervenção?
[HN] - Fomos “treinados” a fazer sempre “novo”, nunca em contexto de reabilitação ou adaptação do existente.
[GF] - Com a relevância actual do “património”, exige-se intervenção em contextos cada vez mais sensíveis. Em casos como o Porto falamos de um património mundial não é?
/Na escola são feitos exercícios na cidade consolidada, em projeto, mas há muitos exercícios de alguns anos dirigidos para a construção de raiz-expansão.
[HN] - Porque é que não se faz um exercício de intervenção num edifício histórico por exemplo?
[GF] - Há muito trabalho projectual centrado na reabilitação!?
[HN] - A legislação para reabilitação tem sido extremamente permissiva, sobretudo em contextos não protegidos. Se por um lado, se simplificaram processos e agilizam investimentos, em benefício da renovação urbana, por outro, temos assistido a uma destruição do património, diria, sem precedentes.
[GF] - Em determinado momento surgiu uma Pós-graduação na faculdade.
[HN] - Sim, o CEAPA.
[GF] - Também à escala do espaço público, etc.
[HN] - Sim.
VII.
[GF] - Onde é que tu estiveste, quando estiveste fora?
[HN] - Estive em Estugarda, na Alemanha.
[GF] - Caracteriza-se por um enfoque mais técnico, não?
[HN] - Sim, apesar de se produzir excelente arquitectura.
[GF] - Usufruir do Erasmus, aporta enriquecimento pessoal.
[HN] - Sem dúvida.
[GF] - Correspondes à geração em que se iniciou o “low cost” não é?
[HN] - Os voos “low-cost” permitiram estarmos em mais sítios, uma vez que tínhamos colegas em vários pontos da Europa.
[GF] - Permitia que viajassem com mais facilidade pela Europa.
[HN] - Sim, por exemplo, íamos um fim-de-semana a Estocolmo ou a Oslo por 20 euros.
[GF] - Vocês experienciaram realidades académicas bastante diferentes, ou nem tanto?
/ O Erasmus permite vivenciar experiências arquitectónicas não tidas de onde se vai. Falas-me da Alemanha onde estiveste?
[HN] - Um aspecto que me marcou foi a abertura da Universidade à sociedade. Por exemplo, grande parte dos exercícios de projecto correspondiam a necessidades reais de determinadas cidades ou bairros, e alguns desses projectos académicos foram posteriormente construídos. E estamos a falar de um país rico. É um tema que gostaria que fosse considerado aqui.
[GF] - Permite experiências de intercâmbio transnacionais.
[HN] - Sim, alguns dos projectos eram resultado de parcerias com outras Faculdades de Arquitectura. Por exemplo, tive um projecto em Santiago do Chile e outro em Istanbul. O intercâmbio de docentes entre Universidades também já era uma realidade.
[GF] - Se calhar hoje também aqui está a começar não é?
[HN] - Aqui ainda é muito restrito.
/VIII.
/[GF] - E a prova final?
/Ou o estágio académico, porque tiveste essas duas experiências.
[HN] - Tinhas dois, tinhas um estágio académico antes da tese.
[GF] - E depois tinhas o exame.
[HN] - De acesso, exacto.
[GF] - Já não têm o estágio académico e têm o estágio… dois anos não é? Como é que é?
[HN] - Não faço ideia.
[GF] - Eu acho que eles agora têm o acesso à ordem, não têm o exame. Talvez tenham que obter um conjunto de créditos?
[HN] - Não sei.
[GF] - Portanto em inícios dos 2000, já se afigurava como um dos problemas dos estudantes de arquitectura?
[HN] - No final do curso, veio a confirmar-se.
[GF] - Em determinada altura, surgira grande quantidade de cursos…
[HN] - Sim, abriram imensos cursos, sobretudo privados.
[GF] - Para a minha geração, em 1999 ainda havia trabalho, digamos.
[HN] - A dificuldade começava logo com a procura de escritório para o estágio académico…
[GF] - A vossa esperança era continuar no mesmo escritório em que tinham conseguido estágio?
[HN] - Sim, por isso é que o regresso à Faculdade para fazer a tese não era uma decisão fácil.
[GF] - Nessa geração está muita gente desempregada?
[HN] - Grande parte da minha geração está na Suíça.
[GF] - Houve muitos arquitectos que ficaram no estrangeiro.
[HN] - Nós entramos no mercado de trabalho em plena crise.
/A precaridade foi-se mantendo.
[HN] - A precaridade persiste por cá, o que justifica, não totalmente, a emigração massiva de arquitectos.
[GF] - Para um recém licenciado por exemplo é mais atractivo?
[HN] - Por exemplo, na Suiça os salários são tabelados, logo há uma ideia de progressão e aqueles salários são cumpridos. Portanto, e apesar do custo de vida, há um retorno. E o que é certo é que essa malta que imigrou em 2008, 2009, ficou toda lá. Já constituiu família, alguns já compraram casa…
/Lembro-me da aula de abertura do meu 1º ano, em 2001, em que o Domingos Tavares já alertava para o problema do desemprego. Naturalmente, nós ficámos um pouco assustados, mas essa profecia cumpriu-se totalmente, agravada pela crise de 2007.
/IX./
[GF] - Lembras-te assim….
/Percorreste há bocado os anos curriculares de construção, das cadeiras de teoria lembras-te de alguma coisa?
[HN] - Lembro-me das aulas do Manuel Mendes, teóricas, muito difíceis de acompanhar…
[GF] - Eu lembro-me de ti, como teu professor de projecto, de no início do primeiro ano de já seres muito técnico. Eras dos únicos já com bom desenho técnico, rigoroso.
[HN] - Sim, muito rigor…
[GF] - Na turma em que eu era professor lembro-me, no início do ano, tu já com um traço muito fininho e com uma mina adequada.
[HN] - Era um desenho super rigoroso.
[GF] - Mas as cadeiras de teoria. O que é que…
[HN] - No 1º ano marcou-nos as aulas de TGOE, com o Graça Dias. Sempre com muita assistência, apesar de serem à sexta à tarde.
[GF] - Agora não sei quando é que o Graça Dias ingressou na FAUP… Nos primeiros anos obteve logo considerável aceitação pelos alunos.
[HN] - Só posso falar das aulas teóricas, eram muito porreiras…
[GF] - Conseguia de facto proximidade e chegar aos alunos, cativar.
[HN] - De facto, aquilo entrava e provocava alguma coisa.
[GF] - A disciplina de Métodos e linguagens - da arquitectura contemporânea - era do 2º ano.
[HN] - Segundo, já era no 2º ano.
[GF] - Com o Botelho e o Salgado?
[HN] - A minha turma tinha o Botelho.
/E foi muito interessante. Há pouco tempo reencontrei-o e falei-lhe da responsabilidade dele pelo facto de o Kahn ser uma das minhas referências…
[GF] - Quer dizer, no Khan encontramos uma coerência, lembro-me de ter visto alguns edifícios.
Falava do Khan e/ou italianos?
[HN] - O Botelho falava muito no Kahn, lembro-me de ele nos perguntar: “Vocês sabem como é que a luz entra nestes espaços?” Mais tarde, quando vivi nos Estados Unidos, as primeiras viagens foram para visitar obras do Kahn. E de facto, são edifícios notáveis.
[GF] - São muito boas não é? Construtivamente e simbolicamente.
[HN] - Sim, por exemplo os espaços da residência da Pensilvânia são místicos, emocionam qualquer um.
[GF] - Sim. Aquilo afetava, e as pessoas sentem que estão numa coisa especial.
os Estados Unidos aliás houve um professor que me ofereceu um livros, era um especialista em Khan.
/Privilegia formas puras.
/Acontece nem sempre se percebe todas as dimensões em Khan. O doutoramento do professor que te referia foi publicado em livro. Focava um dos projectos principais, acho que o Salt Institute.
/Recordo-me desse corte da fachada sofisticado, em termos das entradas de luz.
[HN] - Existe um livro na biblioteca muito interessante do August Komendant, que foi o Engenheiro de Estruturas do Kahn.
[GF] - Uma coisa que eu acho fundamental do curso é as viagens. Por exemplo a viagem do 1º ano: a viagem das casas.
[HN] - Sim, quando estive no 1º ano como docente, até se falou em antecipar essa viagem, porque essa experiência mexe muito com os alunos.
[GF] - Tinha muito impacto.
[HN] - Para a maioria, sem dúvida.
[GF] - Permite visitar edifícios singulares ou outros contextos. Neste caso era escala doméstica.
/Permanece na memória de muitas gerações, incluso mais velhas. A minha geração teve depois uma outra viagem ao norte…
[HN] - Até…
[GF] - Até Vigo e Santiago de Compostela. E vimos o marcante Museu de Santiago, etc.
/X.
/[GF] - Hoje. Uma das coisas que eu acho que agora acontece é ocorrerem muito mais coisas…
/Antes havia uma conferência por um qualquer arquitecto especia e ia-se a correr…
/Agora ocorrem muitas coisas, de exposições a aulas abertas, etc.
/E há poucas décadas, a arquitectura era menos falada ou discutida no domínio público.
[HN] - Sim.
[GF] - Actualmente, a arquitectura constituiu um assunto omnipresente.
/ E na verdade hoje existem uns vinte e tal mil arquitectos no país.
[HN] - Em, 2009, quando me inscrevi na Ordem, já eramos 20 000 arquitectos inscritos.
[GF] - Também encerraram alguns cursos privados, acho eu.
[HN] - Talvez.
[GF] - Muitas pessoas acho que tiveram de fazer outras coisas que não arquitectura?
[HN] - Inevitavelmente. Também por culpa da precariedade na profissão.
/XI.
/ [GF] - Deves ter terminado o curso, num período coincidente com a transição da direção da escola para o Francisco Barata.
[HN] - Penso que sim.
[GF] - Era regente no 2ç ano.
[HN] - Sim, ele era o Regente de Projecto II.
[GF] - Ele assegurava e fazia muitas vezes críticas entre turmas.
[HN] - Pegava em determinadas maquetas dos alunos e percorria as turmas, abordando um conjunto de temas…
[GF] - Tinhas já colaborado com o Centro de estudos? Num trabalho pontual, com o José Manuel, o Nuno Valentim ou com?
[HN] - Já tinha acabado o curso quando colaborei num trabalho pontual no CEFA: a reabilitação da cobertura da Faculdade de Economia, do Viana de Lima, cuja coordenação pertenceu ao Alberto Laje.
[GF] - E para a Fundação Marques da Silva. Não sei se à data a coisa já estava constituída como uma fundação, talvez.
[HN] - Após esse trabalho, ajudei num projecto de execução para a Fundação Marques da Silva.
[GF] - Tratou-se do edifício na rua Alexandre Braga.
[HN] - Sim, em frente ao bolhão, do Arquitecto Marques da Silva.
[GF] - Era o Francisco Barata que tinha a responsabilidade desse projeto?
[HN] - Sim, o Francisco Barata foi o responsável do projecto, o Nuno Valentim coordenava as equipas de projecto.
[GF] - Foi distinguido com o “Prémio João de Almada”, em 2012 talvez.
[HN - Sim, foi um projecto muito importante para o CEFA, e para a Faculdade.
[GF] - Credibilizou. E tentou trazer projectos para a faculdade?
[HN] - O Francisco Barata trouxe vários projectos, vindos sobretudo da Reitoria e das suas Faculdades. Foi um dos grandes defensores do CEFA, enquanto unidade de projecto e investigação.
[GF] - A tua ida aos Estados Unidos surgiu pelo usufruto de uma bolsa.
[HN - Sim, existia uma bolsa - “InovArtes” - que permitia estagiar um ano no estrangeiro. Na altura eu queria ir para fora e candidatei-me. Depois das fases de selecção, fui colocado no David Adjaye, em Londres. Nesse momento, o David estava a iniciar o escritório em Nova-Iorque e eu acabei por ir para lá.
/ XII.
/ [GF] - Já mais tarde, em 2016 ou…, surge a experiência em Construção com a Graça Correia, o António Neves ou o Joaquim Teixeira?
Mas chegaste a dar aulas de Projecto com o José Manuel Soares depois de teres actuado como monitor a Construção. Voltaste, novamente, mas como é que viste a faculdade, as experiências, etc. E como é que vês hoje?
[HN] - O meu estágio académico foi com a Graça Correia. Mantivemos sempre o contacto, e após regressar dos Estados Unidos, a Graça convidou-me para monitor de Construção. No ano seguinte, fui monitor com o António Neves.
[GF] E a tua experiência com Projecto? O José Manuel Soares ainda estava no 1º ano quando foste assistente em Projeto 1. Primeiro vieste substituir a Filipa Guerreiro e…
[HN] - Fui substituir a Filipa Guerreiro no segundo semestre, e no ano seguinte convidaram-me para continuar com uma turma.
[GF] - Meio ano e depois ficaste no anos seguintes, em Projecto 1.
[HN] - Sim.
[GF] - Portanto até 2018.
[HN] - Sim.
[GF] - O José Manuel teve depois regência partilhada com o Hélder Casal Ribeiro.
[HN] - No ano lectivo após a minha saída, ou seja, 2018/2019, deu início essa regência partilhada.
[GF] - E relativamente à altura em que eu fui teu professor de Projecto 1, em que o regente era o Sérgio Fernandez.
[HN] - Existem algumas diferenças…
[GF] - Diferenças em que sentido?
[HN] - Uma das diferenças diz respeito à disponibilidade de informação.
[GF] - Pois, hoje eles acedem de imediato a uma imensidão de informação.
[HN] - A nossa investigação passava sobretudo pela biblioteca…
[GF] - Livros ainda havia, e revistas.
[HN] - Ah.
[GF] - Hoje em dia tem-se disponível uma informação brutal, mas muita informação não é sempre sinónimo de conhecimento…
[HN] - A minha geração é a geração do “MIRC”, um programa de “chat online” que apareceu um pouco antes da nossa entrada na Faculdade. A “internet” dava os primeiros passos.
[GF] - Com “nicknames”.
[HN] - Certo!
[GF] - Hoje os alunos ou professores constituem grupos em torno de projeto ou outras disciplinas, etc.
[HN] - Ah.
[GF] - Quando a Filipa estava a ser substituída, o José Manuel assegurava mais presença na tua turma.
[HN] - Naturalmente. Apesar da turma estar muito bem preparada pela Filipa Guerreiro, o Zé ajudou-me muito.
[GF] - Na altura que estávamos em Projecto 1, apesar de tudo havia as teóricas de Projecto pelo regente, que não deixavam de constituir um momento de reunião de todas as turmas.
[HN] - Hum. Sim.
[GF] - Se calhar não havia tanta envolvência do regente nas aulas/turmas práticas todas.
[HN] - Nesse ano as turmas estavam fisicamente distantes, umas numa torre, outras noutra, isto acaba por isolar mais. No entanto, e como era também o teu primeiro ano, o Sérgio Fernandez visitava-nos com bastante frequência.
[GF] - Parece-me positivo que pessoas experientes lecionem no 1º ano.
[HN] - Sem dúvida, é muito importante.
[GF] - Porque o 1º ano tem características, circunstâncias, muito próprias.
[HN] - São miúdos de 17, 18 anos que encontram uma realidade totalmente diferente. Deve existir uma sensibilidade muito própria, que está ligada também à experiência.
[GF] - E o docente tem de despender muita energia, em prole de obter todo o potencial dos alunos.
[HN] - Ao mesmo tempo é muito interessante, porque a criatividade ainda tem poucos limites…
[GF] - Paralelamente também há esta ideia de pôr professores “archi-stars” no 4º do ano, no fim do curso.
[HN] - No meu 4º ano já era assim.
[GF] - Acho que o José Manuel Soares é exemplo paradigmático do que pode ser um professor do 1º ano, ou de um adequado acompanhamento ao aluno de um ano inicial. Ele tem a sensibilidade para, e a experiência para isso.
[HN] - Totalmente de acordo.
[GF] - Decorreram dois anos de pandemia.
[HN] - Só estive no último ano da pandemia (2019), enquanto assistente de Construção 1.
[GF] - Coincide com o ano de uma sabática do Joaquim Teixeira não é?
[HN] - Sim, fui substituir o Joaquim, que tinha sido meu professor de Construção.
[GF] - Muitas competências.
/ XIII. /
[GF] – No outro dia recordei-me de ti e do Daniel.
[HN] - Nas férias, no teu escritório.
/ O projecto era uma farmácia, se bem me lembro.
[GF] - Desenvolvia projectos tanto reais e experimentais, que incluíam o de uma farmácia para a Maia.
[HN] - Lembro-me de uma maqueta que fizemos, em acrílico.
[GF] - Aguns projectos eram experimentais, e fazia alguns concursos, exposições, publicações etc. Lembro-me daquela exposição com recentes “práticas arquitectónicas” que depois fizemos no espaço “Maus hábitos”.
[HN] - Sim.
[GF] – Nós expusemos um edifício megaestrutural com piscinas suspensas. Consta publicado numa das ediçõeses das Páginas brancas.
[HN] - Foi. Só habitação?
[GF] - Possuía um sistema distributivo constituído por galerias e escadas, com habitações evolutivas e pátios pelo meio… e cobertura com árvores. Era todo preto, rugoso, metálico, com piscinas tipo aquários, fachadas em vidro e material vegetal pelo meio.
[HN] - As escadas salientes na fachada, como o Kitagata da Sejima…
[GF] - Acho que tu tiveste menos tempo lá a colaborar não foi?
[HN] - Sim, eu entrei mais tarde.
XIV.
[GF] - Entraste na escola já quase na direção do Carlos Guimarães, ou no período…
[HN] - Não, entrei no período do professor Domingos Tavares.
[GF] - O que é que constataste de diferente na escola e seu ambiente? O edifício foi arranjado…
[HN] - Encontrei uma estrutura talvez mais bem organizada…
[GF] - Relativamente ao Centro de Estudos?
/ Conseguia-se fazer projectos?
[HN] - Sim, nessa época o Centro de Estudos tinha alguns trabalhos.
[GF] - Há bocado referiste colaborar em projetos com o Francisco Barata, referias-te ao CEFA.
[HN] - Sim, eu trabalhei com o Francisco Barata no CEFA-UP.
[GF] - Ainda há bocado vi o Zé Luís, Gomes, que trabalha lá há muito tempo. Trabalhaste com ele?
[HN] - Sim.
[GF] - Será uma pessoa que está a coordenar ou pelo menos responsável. Mas achas que agora haverá menos trabalho? Têm um projeto ou outro.
[HN] - Acho que agora há mais encomendas.
[GF] - Era importante que a faculdade usasse esses projectos até mesmo como oportunidade de investigação.
[HN] - Privilegiar a investigação.
[GF] - Podia eventualmente assentar ou providenciar financiamento, também.
/ E quiçá mesmo ser aproveitado como local onde pessoas que têm exclusividade pudessem também talvez fazer experimentação ou projectos sim, mas eu diria mais investigação…
[HN] - Alguns dos projectos que fizemos, enquadram-se perfeitamente num perfil ou grupo de investigação da Faculdade.
[GF] - Sim quiçá envolvendo os estudantes.
[HN] - Sim, envolvendo estudantes do Mestrado.
[GF] - Também a faculdade desenvolver se possivel prestação de serviços.
[HN] - Seria uma forma de autofinanciamento, naturalmente. Mas exclusivamente para a unidade de investigação correspondente.
[GF] - Integrando pessoas que sejam orientadas e acompanhadas talvez por docentes ou investigadores.
[HN] - Ah.
[GF] - Focas o período então coincidente com a coordenação do Barata Barata…
[HN] - Sim, é o período com o qual contactei.
[GF] - Era o diretor do CEFA.
[HN] - Sim.
[GF] - Actualmente a direção encontra-se assegurada pelo João Pedro Xavier.
/ Mais pessoas, não?
[HN] - Sim, há mais alunos, se comparado com o meu tempo de estudante.
[GF] - E mais nacionalidades.
[HN] - O número de alunos internacionais tem vindo a aumentar.
[GF] - Agora temos ingresso de muitos estudantes brasileiros.
[HN - Sim.
[GF] - Também acho que temos de outros países da américa do sul.
[HN] - Sim, Equador, Colômbia…
[GF] - Continua a haver pouco espaço, para trabalhar, sendo que algumas salas têm um défice de espaço.
[HN] - As salas estão no limite, acima daquilo que consideramos adequado.
[GF] - Obrigado.
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
No comments:
Post a Comment