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Notas sobre Gonçalo Furtado, por Alexandra Saraiva

Notas sobre Gonçalo Furtado, por Alexandra Saraiva (ISCTE( Mesa Redonda – Apontamentos escritos e desenhados. 04.01.2025|16h. Lugar do Desenho, Fundação Júlio Resende. O processo criativo da arquitetura, agrega 3 modos distintos: por palavras, através de textos; por fotografia, registo para memória futura; e por último, por desenhos e modelos, rigorosos ou esquiços e apresentados a par com as maquetes. / Propor um ensaio sobre a forma como o Gonçalo Furtado exerce a sua prática profissional, através da escrita, foi um desafio. Arquiteto e Professor na FAUP, teve sempre uma relação de proximidade com as artes plásticas, e antes de ingressar no curso de arquitetura, teve uma forte ligação que perdura até atualidade, com a música e a fotografia. / Gonçalo Furtado é licenciado em Arquitectura pela Universidade do Porto (1999), Mestre em Cultura Urbana pela Universidade Politécnica da Catalunha e doutorado pela University College of London (2007), tendo ainda frequentado o Institut of architectural studies em Veneza (1994). No início da sua prática profissional de arquiteto colaborou com João Luis Carrilho da Graça, Arquitectos da Beira (Bandeirinha, Figueiredo e Mendes Ribeiro); Álvaro Leite Siza Vieira, Francisco Providência e João Francisco e Associados (Nova Aldeia da Luz). / A sua tese de doutoramento revela um histórico das trocas entre a arquitetura e os campos da investigação de sistemas e da computação, ao longo dos últimos 50 anos do séc. XX. Em particular, centra-se nos encontros dos profissionais britânicos - Gordon Pask, Cedric Price e John Frazer - e oferece um relato completo de dois projetos arquitetónicos de destaque, relacionados com sistemas e computação: Generator e Japan Net. / Com mais de vinte anos experiência científica, no seu currículo conta com uma vasta produção científica e um considerável número de orientações: 56 de mestrado e 4 de doutoramento. / É autor de múltiplos artigos sobre arquitectura, arte-design e pensamento cultural, em revistas científicas, nacionais e internacionais. / Da vasta produção científica, o Gonçalo, conta com: 40 artigos em atas de conferencias de âmbito nacional e internacional, entre 2008 e 2023; é autor e coautor de 14 artigos em jornais, o primeiro em 2000; e conta com 92 artigos em revistas de arquitetura entre 2000 e 2023. É ainda autor de 15 capítulos de livro, e autor ou coautor de 14 catálogos de exposição entre 2001 e 2023. / Dos seus 23 livros editados, sublinho o primeiro de 2002 sob o título Notas sobre o espaço da técnica digital e o último editado com o título: Na arquitetura portuguesa e escola do Porto: algumas notas dispersas. Vol. 2, (2024) estando já pronto para edição o volume 3 desta coleção. Da vasta lista de livros, posso referenciar alguns títulos: Arquitectura: Prótese do Corpo (2002); Architecture and Information Society, (2002); Notes on the Space of Digital Technique (2002); Marcos Cruz: Unpredictable Flesh (2004); Off Fourm: Postglobal City and Marginal Design Discourses (2004); Interferências: Conformação, Implementação e Futuro da Cultura Digital (2005); The Construction of the Critical Project (2005); Architecture: Machine and Body (2006); Generator and Beyond: Encounters of Cedric Price and John Frazer (2008), Cedri Price’s Generator… (2009), Gordon Pask… (2009), Envisioning an evolving environment (2011); O futuro da cidade pós-industrial (2021); América (2022), Escola do Porto: Notas dispersas" (2023), "Na arquitectura portuguesa e escola do Porto" (2024), "Trajectos: Do pensamento em arquitectura" (2024), "Apontamentos sobre arquitectura portuguesa e escola" (2024), etc. / Não posso deixar de referir o seu contributo ao integrar o corpo editorial ou científico de revistas como a Unidade 5, Nada, Arq/a, The Radical Designist, BAc e Budownictwo i Architektura. Tendo igualmente sido reviewer de múltiplas entidades e eventos, incluindo o American Collegiate Schools of Architecture Colloquium, em Helsinquia, e o Metropolis in Urban and Metropolitan Studies, Master Program da UAB. / Lecionou em programas de graduação e pós-graduação na FAUP, FEUP e IADE, e foi professor visitante na ETSAB (2010). Enquanto palestrante esteve em diferentes países da Europa, América do Sul e América do Norte, e concebeu variados eventos, tais como o plug-in para a Experimenta Design 2003, a exposição Tracing Portugal na Architectural Association apoiada pela Gulbenkian, ou o seminário O corpo enquadrado em Serralves (em conjunto com Pedro Gadanho), o Espaço e Pensamento na Fundação Marques da Silva, entre outros. / Em 2010 e 2012 foi finalista no concurso internacional para Director respectivamente da escola de arquitectura da Clemson University e da Iowa University nos EUA Durante o seu percurso académico foi bolseiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia e da Fundação Luso Britânica, tendo sido distinguido com vários prémios nacionais e internacionais, incluindo o Prémio Florêncio de Carvalho, Kybernetes: Outstading paper award, Scholarly contribution award, bem como com o estatuto honoríficio de Fellow pelo International Institut of Advanced Studies, etc / O trabalho de Gonçalo Furtado propõe uma nova experiência temporal, uma temporalidade renovada que evoca um arquétipo coletivo emergente. Ele redefine a disciplina arquitetónica como criadora de espaços vivenciais, capazes de estimular sensações e promover reflexões profundas no ser humano. Por meio de novos signos e de uma simbologia renovada, propõe uma dinâmica em termos psicológicos, sociais e culturais. O modo como explora novas metodologias mentais e ferramentas instrumentais no processo criativo, mantendo sempre o controle sobre esse percurso, é interessante. A abordagem, por ele defendida procura estabelecer uma nova dinâmica voltada para uma poética inédita, ao mesmo tempo redefinindo a disciplina da arquitetura como uma prática orientada por valores éticos e morais. / Ao longo de sua trajetória, Gonçalo Furtado, enquanto teórico da arquitetura, defende a ideia de uma nova ucronia, entendida como uma relação renovada entre o objeto e o humano. Ele explora novas possibilidades para o ato criativo enquanto processo, propondo uma reformulação ética da disciplina. Sua abordagem visa um "devir" profundamente enraizado em um novo sentir, como pode ser percebido nas suas obras. / O Gonçalo Furtado privilegia, a relação da figura humana com o objeto arquitetónico, a sua linguagem assenta em signos e símbolos, que reinterpreta, sublinhando a relação temporal, pela definição de imagem ténue, como cristaliza-se a memória desse momento e espaço. As relações e interações entre imaginário e linguagem, e perceção e pensamento são fundamentais para compreender a mente e a criatividade humana. Segundo Pallasmaa o imaginário poético da música, da poesia, da pintura ou da arquitetura, resulta de uma base existencial e experimental atemporal, vista e experienciada desde a sensibilidade contemporânea. Nesse sentido, as imagens constituem um veículo essencial para a perceção, o pensamento, a linguagem e a memória, e no conjunto do imaginário que configura as nossa mentes, as imagens poéticas e corpóreas evidenciam-se como categorias fundamentais, pelo que são a raiz de toda a expressão artística. (Pallasmaa, 2011) / Para além dos seus livros, artigos científicos e textos bastante ecléticos, o Gonçalo mantém um blog desde 2007, onde partilha reflexões, críticas e ideias. / Depois de revisitar o percurso do Gonçalo, percebemos que as palavras registadas em texto, reveladas e reinterpretadas por Gonçalo Furtado, tem uma presença continua e constante entre a teoria, a pedagogia, a reflexão, a criatividade, os paradigmas, o desenho, o regionalismo crítico, e arquitetura do século XX. Nos últimos anos, os seus textos tendem a centrar a temática na arquitetura portuguesa e na escola do Porto. / E é partir deste reconhecido conhecimento, que em 2024, tivemos oportunidade de começar a trabalhar juntos, ao integrar a equipa de comissariado da nova edição do programa Habitar Portugal, dedicada à celebração dos 50 anos do 25 de abril de 1974, juntamente com Célia Gomes, Rui Leão e Victor Mestre. / E termino com uma citação de Lina Bo Bardi que em parte ilustra também a inquietude do Gonçalo Furtado: / Mas o tempo linear é uma invenção do Ocidente, o tempo não é linear é um maravilhoso emaranhado onde, a qualquer instante, podem ser escolhidos pontos e inventadas soluções, sem começo nem fim. BIO Alexandra Saraiva é arquiteta, mestre e doutora em Arquitetura, com a tese Influência da obra de Louis I. Kahn na obra de Hestnes Ferreira, e investigadora auxiliar no DINÂMIA'CET-IUL do Iscte. Publicou vários artigos em revistas especializadas e conferências internacionais, tendo experiência em curadoria de exposições. É especialista em processamento documental de arquivos de arquitetura, consultora da Fundação Marques da Silva, e responsável pela Coleção Hestnes Ferreira. É professora auxiliar na Universidade Lusíada do Porto desde 1996

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