6/20/23

Notas a proposito do espaço da imagem _ Gonçalo Furtado

O ESPAÇO DA IMAGEM/ (por Gonçalo Furtado) / I. ESPAÇO/IMAGEM / Anteriormente sugeri enfoques ao tema espaço/imagem / Em dias de preparação de sessão “O espaço da imagem” para ciclo da FIMS, revisitei notas anteriormente redigidas ou artigos com relação com a questão em apreço. / Há 2 décadas atribuiu como título de um texto “O ESTATUTO DA IMAGEM ARQUITECTÓNICA E A ALASTRAÇÃO DO PODER"./ Na abertura refere-se: “‘Tal como o corpo de um doente que sofre se arrisca a desaparecer (sendo substituído por imagens que os médicos acompanham atentamente) em função das múltiplas representações visuais, a humanidade e o seu futuro correram risco de se perder nas suas imagens?’ A nossa sociedade, categorizável pelo consumismo, a informação e a globalização, encontra-se também rodeada por imagens e suportada por uma cultura visual. A imagem intervém na nossa visão do mundo com o poder da reprodutibilidade e verosimilhança e, adquirindo protagonismo central, alerta para a necessidade de indagar acerca do seu papel e estatuto”. O texto é estruturado numa sequência de pontos: No primeiro capítulo intitulado “O UNIVERSO DAS IMAGENS - INTERMEDIAÇÃO E À APREENSÃO DO REAL” – sumariamente refere-se que: • O termo imagem tem multiplicidade de usos comuns (vd. eg Maurice Joly) e sempre foi objecto de debate; • E foi abordada por campos como a Semiótica (de Charles A.Pierce a Roland Barthes) em que uma semiótica da imagem se estabilizou a meados do seculo • Sendo que a Arquitectura é passível de ser vista como sistema ed comunicação; podendo salientar-se e.g. o potencial da função-signo de Barthes e a distinção entre figura primeira e segunda de Umberto Eco)./ • Mais interessa não deixar de atender à existência de funções/intenções da comunicação, e o seu estatuto numa sociedade do espetáculo e/ou controle (Foucault, Deleuze etc) • Gombrich percepcionou a História da arte, como uma sequência de fases construtivas de imagem convincente (Grécia, renascença, impressionismo?). • Sendo sabido que as vanguardas iniciaram uma anti-mimésis da realidade./ Nas palavras então redigidas, que infra se reproduz integralmente: “Objecto de reflexão desde a antiguidade, a imagem remete para domínios que vão da comunicação a religioso-filosófico. Tal como as religiões judaico-cristãs problematizaram o seu estatuto, também a oposição platónico-aristotélica pensou a sua relação com a verdade./ Apesar da constatável multiplicidade de usos comuns, a teoria semiótica pareceu-parece auxiliar ao estabelecimento de uma. definição unívoca e à compreensão do seu funcionamento. A tentativa Peirceana de uma teoria geral possibilitou outros sistemas de signos que não a linguagem verbal. A imagem Visual reporta para a iconicidade e entende-se como um enunciado comunicativo, um sistema de signos “que estão em lugar de outra coisa”/ Uma semiótica da imagem, incidente sobretudo sobre sistemas gráfico-visivos, estabilizava-se a meados deste século. “Como é que o sentido vem até à imagem”, questionará Roland Barthes. “Quando “qualquer objecto compenetra-se de sentido” , os processos de inferência são também explicitamente considerados de significação. “Uma coisa é um signo só porque é interpretada como signo de alguma coisa por um intérprete”, referia Morris./ Para uma análise da arquitectura como sistema de comunicação , salienta-se entre outros, a pouco explorada operatividade da função-signo de Barthes e a distinção entre figura primeira e segunda de Eco./ Por outro lado, o signo como “entidade mínima que pareça ter um significado preciso", participa na formação do discurso, o que permite compreender os usos e funções comunicativas que Ihe são conferidas. Referimos o persuasivo, a que recorre o poder e que consciencializa a necessidade de considerar a intenção do emissor e as intenções que este quer que o destinatário lhe atribua. “Verdade, suspeita e argumentação" . de Maria Carrilho, por si só um título sugestivo, [Sabendo-se que muitos autores procuraram …percorre resumidamente aquilo a que poderíamos chamar a história da verdade para reconciliar a argumentação./ Remete-se igualmente para uma problematização acerca da formação de uma envolvente cenográfica que, simulando ilusoriamente um outro real e condicionando a cognoscibilidade, silenciosa e opressivamente instaura um sistema intangível, mas omnipresente que, alienando, nos controla e domina. [É nítido o contributo de Michel Foucault pelo que salientamos, bem como a Gilles Deleuze “Postscript on the societies of control” no nº52 da October, publicada pelo MIT em 1992]./ A história da arte, enquadrada teoricamente pela psicologia a representação e da percepção visual, é posta em Gombrich como “uma história de criação das imagnes. Três etapas são identificadas na Grécia com “(…) o aparecimento do project de criar uma imagem convincente, aquilo que apelidará “princípio da testemunha ocular, acabar-se-á por introduzir a ilusão das imagens” , revolução que a Renascença de Giotto retomará, e posteriormente “(…) pensando ter chegado ao ponto onde veriam a natureza como ela é, o impressionismo”. Esta abordagem esclarece como “(…)“(…) não há olho inocente, nós somos certamente influenciados pelo conhecimento" A representação e percepção da imagem constituiu-se paralelamente ao conhecimento e, desta forma, reconfigura-se o nosso olhar sobre o mundo./ No capítulo – intitulado “DE RECPTÁCULO A ESPECTÁCULO - A ARQUITECTURA COMO VELADURA” – sumariamente refere-se que: • A arquitectura como produtora de significados parece se tornado numa produção de imagens epidérmicas desresponsabilizadas politicamente [por vezes alienante – vd. Anestética da arquitectura em que o excesso estético ase associa a uma anestesia política]. • E havendo uma envolvente de comunicação (do mundo de consumo globalizado); a este acresce um layer paralelo habitável do ciberespaço (que “compete” com o mundo físico da arquitectura). • [Como aparte, e Em prole da liberdade criativa do produtor de imagens, aproveitamos para salientamos um impressionante ensaio (pós Susan Sontag e talvez contemporâneo a Rosalind Krauss) , de Vilém Flusser, especificamente intitulado “ensaio sobre a fotografia” mas com subtítulo “para uma filosofia da técnica”.] • Botey por exemplo alertou para deste reducionismo na arquitectura, onde um vazio signico serve um poder silencioso mas oculto neste final de século. [No seguimento de reiteradas ocorrências anteriores, como a titulo meramente exemplificativo exposto em “Art and Power”]. / Nas palavras então redigidas, que infra se reproduz integralmente: “Nesta tentativa de compreender a época em que vivemos ‘abrir uma via entre o niilismo é o positivismo contemporâneo’ , a arquitectura não invalidando à sua complexidade é passível de ser abordada como imagem, aspecto para que resvalou a sua actividade. “As distintas formas de olhar e representar (..) foram o motor de uma evolução contínua./ Em “Mimésis, la imagenes y las cosas” expõe-se a evolução do conceito de mimésis, originado na Grécia, exponenciado no classicismo e neoclassicismo, e superado pelo imaginário das vanguardas artístico-arquitectónicas da viragem do século XX que evitam uma relação mimética com a realidade. Se a máquina e seus predicados imbuíram o Racionalismo, actualmente a “mimésis tecnológica” extremeia os seus limites. A representação, que tão central foi para o projecto da ilustração (de Piranesi a Ledoux), constitui-se hoje como problemática nuclear ao tornar-se aspecto predominante no fazer arquitectónico./ A arquitectura, enquanto produtora de significados e de imagens, está englobada nos meios que a imagem recorre para realizar o seu programa - o velamento que preconiza à alienação contemporânea. produtora de sentidos passou predominantemente a produtora de imagens. Tanto no que respeita à construção concreta, com uma arquitectura epidérmica desresponsabilizada político-socialmente, até ao ambiente digital onde participa a construção de um mundo paralelo. Na contemporaneidade “(..) a produção, tratamento “distribuição de informação assume posição central“ , intermediando e regendo todos os processos sociais, enquadrados também pelo ciclo vicioso do consumo e pelo nível de organização advindo da Por outro lado, as alterações tecnológicas e a expansão do conceito de comunicação com a figura da rede levam, num contexto de fluidez, ao destaque físico das funções criando um novo de layer de conexões que se sobrepõe à cidade física. Tomando-se tudo objecto potencial de digitalização, a passagem de átomos a bits que Nicholas Negroponte refere, progressivamente a experiência torna-se extra-analógica, atenuando o contacto com objectos e pessoas no estado físico. A formação do ciberespaço, altera a visão do mundo e as formas de relacionamento social. Habitado, pelas práticas quotidianas de sujeitos telepresentes (que entre outros Sherril Turkle tem analisado) , e construído de forma análoga com o mundo físico e com princípio de “arquitectura, este mundo compete com o real e interfere decisivamente no campo da arquitectura./ O digital, não apenas como instrumento, mas como suporte e meio, cria um contexto. (onde se debate a representação como objecto e território da “arquitectura e, remetendo para o cognitivo e perceptivo, se questiona a fronteira entre representação e coisa representada pela coincidência entre imagem-significante e coisa-objecto. Botey parece identificar na produção arquitectónica das três. últimas décadas um reducionismo do feito arquitectónico ao visual. Do interesse comunicativo de Venturi ao enriquecimento o Internacional pelos. pós-modernismos de Jencks. Da cenografia bucólica de Krier e Cuiot até à “Strada novissima” que explicitará “(…) os aspectos mais característicos da arquitectura produzida (…), o seu carácter cenográfico, a sua condição decorativa e a vontade representativa (…)”. O privilégio conferido ao conteúdo formal torna passível generalizar o referido a respeito de Boffil, “(…) formes cujo conteúdo vazio é o signo mais ameaçador do poder neste fim de século (…)”. Silencioso, omnipresente e oculto, a que a arquitectura presta (também) servidão neste fim de século./ Na continuidade de relacionamentos com o poder (da contra-reforma às ditaduras deste século), que constituíram motores do seu desenvolvimento, a produção actual não é alhela às forças económicas e políticas, baseando em critérios de rentabilidade e controle. Abandonado o projecto social, reduzida à formalização cenográfica de programas acríticos, a arquitectura assiste à diluição da sua especificidade e arrisca a sua sobrevivência./ Repete-se o referido no final do capítulo: “Na continuidade de relacionamentos com o poder (da contra-reforma às ditaduras deste século), que constituíram motores do seu desenvolvimento, a produção actual não é alhela às forças económicas e políticas, baseando em critérios de rentabilidade e controle. Abandonado o projecto social, reduzida à formalização cenográfica de programas acríticos, a arquitectura assiste à diluição da sua especificidade e arrisca a sua sobrevivência”./ Procedido por capítulo conclusivo intitulado “ABERTURA INSTÁVEL E PROVISÓRIA - A DESALIENAÇÃO” – que se reproduz integramente: “A recuperação da coqniscibilidade das imagens apresenta-se como o único caminho que podemos ambicionar e o derradeiro projecto de desalienação possível. No limite, urge e ambiciona-se constituir uma metalinguagem que possibilite analisar as leis que constituem a primeira linguagem - a imagem e a jusante a arquitectura como vem aqui vista”./ Repete-se o referido no final do capítulo: “Na continuidade de relacionamentos com o poder (da contra-reforma às ditaduras deste século), que constituíram motores do seu desenvolvimento, a produção actual não é alhela às forças económicas e políticas, baseando em critérios de rentabilidade e controle. Abandonado o projecto social, reduzida à formalização cenográfica de programas acríticos, a arquitectura assiste à diluição da sua especificidade e arrisca a sua sobrevivência”. 1 - Acréscimo esclarecedor meu entre parêntesis - Maurice Joly, Introdução à análise da Imagem, Edições 70, 1999 (original de 1994), p.25. 2-- Barthes citado em - Umberto Eco, O signo, Editorial Presença, Lisboa, 1986 (original de 1978), p.36. 3 - Como Eco em 1968, por exemplo - Umberto Eco, La Struttura Assente. Bompiani Milão, 1968. 4 -- Como Eco em 1968, por exemplo - Umberto Eco, La Struttura Assente. Bompiani Milão, 1968. 5 - Manuel Maria Carrilho, verdade, certeza e argumentação, Editorial Presença, 1990. 6 - Emst Gombrich, Art and Illusion. A Study in the psycology of picterial representation. Phaidon Press, Oxford, 1966 7 - Emst Gombrich e Didier Erihon, Ce que L’image Nous Dit, Ed. Adam Biro, Paris, 1991, p 71-72. 8 - Emst Gombrich e Didier Erihon, Ce que L’image Nous Dit, Ed. Adam Bira, Paris, 1991, p99 9 - Salientamos a utilização da expressão de Ruskin na citação de Gombrich - Ernst Gombrich e Didier Eribon, Ce. que L’image Nous Dil Ed. Adam Biro, Paris, 1991 Gombrich, p.102. 10 - Apropriação de uma expressão de Maria Carrilho – Vd. Manuel Maria Carrilho, verdade, certeza e argumentação. Editorial Presença, 1990, p.114 11 - Josep Maria Montaner, La modarmidad superada- Arquitoctura arte y pensamianto, Editorial GG, 1997, p.9. 12 - Reportamos para o artigo de Bragança de Miranda em - Claudia Gianneti (ed.), Ars Tetemática, Telecomunicações, Internet e Ciberespaço. Relógio d'Água, Lisboa, 1998. 13 - Vilém Fusser em Claudia Gianneti (ed.), Ars Telemática, Telecomunicações, Internet e Ciberespaço, Relógio U'Água, Lisboa, 1998, Salientamos um impressionante ensaio sobre fotografia (pós Susan Sontag), de Vilém Flusser, Ensaio sobre a fotografia - para uma filosofia da técnica, Relógio de Água, 1998 (original de 1983). 14 - Nicholas Negroponte, Ser Digital, Lisboa: Caminho, 1995. 15- Sherry Turkde, A vida no Ecrã, Ed. Relógio d'Agua, 1997 (original 1995). 16 - José Luis Sanz Botey, La arquiectura como lenguage y comunicación em Arquitectura en el siglo XX 1996, p.142. 17 - José Luis Sanz Botey, La arquiectura como lenguage y comunicación em Arquitectura en el siglo XX 1996, p.144. 18 - Refere-se a publicação da exposição “Art and Power”.

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