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CONVERSAS SOBRE A ESCOLA DO PORTO_ Nº29 _ Rui Braz (com Gonçalo Furtado)

CONVERSA SOBRE ARQUITETURA E ESCOLA DO PORTO _ MARÇO 2020 (Rui Braz, com Gonçalo Furtado) I. [Gonçalo Furtado] - Propunha que falássemos sobre eventos relacionados com a tua vida e a Faculdade. Fizeste o teu curso de Economia em Portugal, um Doutoramento em Itália e outras pós-graduações. [Rui Braz] - Eu fiz Economia na Universidade de Porto. Acabei já depois do 25 de Abril. [GF] - Andaste muito envolvido com o movimento cooperativo. [RB] - Fui ajudante do administrador por parte do Estado, com algumas empresas que tinham sido ocupadas pelos trabalhadores e que, portanto, precisavam de alguns apoios. Mas os patrões não estavam (como a gente dizia, “fugiram"). Acho que isso provocou um grande movimento de solidariedade com as pessoas e com todo o que era este movimento. [GF] - Já eras do PC? [RB] - Eu fui sempre do grito do povo. A minha filiação foi sempre o povo. [GF] - Depois foste parar ao SAAL (Serviço de Apoio Ambulatório Local). [RB] - Através de duas linhas, fui parar ao SAAL, Serviço do Fundo de Fomento da Habitação, que na altura era no 15º ou 16º andar daquela torre na Rua Gonçalo Cristóvão, naquele prédio em frente ao Jornal de Notícias. Tinha uma vista fantástica sobre o mundo. [GF] - Nessa altura entraste por duas vias? [RB] - Uma, um amigo meu, que era um desenhador que tinha trabalhado com o Serôdio e com o Agostinho Ricca. [GF] - O Serôdio pai. [RB] - Sim, o pai. Com o Ricca, com o Magalhães Carneiro, o chamado William Graham do foco, e tinha trabalhado no Vértice. Portanto pertencia àquele grupo do PC. O Vértice esteve sempre constituído por muitos arquitetos e sobretudo desenhadores. O Mourão, o Henrique, o Humberto Vieira, etc. Pessoas que depois apoiaram os arquitetos, por exemplo, o Eduardo Souto Moura. [GF] - O Eduardo Souto Moura na cadeia da relação (obra). [RB] - Portanto, com a Margarida Coelho, etc. [GF] - Essa foi a primeira via. E a segunda? [RB] - A outra foi que o consultor jurídico do SAAL era o Mário Brochado Coelho. [GF] - Mário Brochado Coelho penso que também foi “consultor” da Faculdade. [RB] - E que foi colega de curso do meu irmão em Coimbra. E portanto, digamos, foi uma espécie de apadrinhamento. [GF] - O teu irmão estudou Direito. Estamos a recuar aos anos 60. Ele envolveu-se? [RB] - Sim claro, esteve envolvido. O meu irmão faleceu há uns 4 anos. Depois obviamente mais tarde no SAAL interessei-me muito por essa questão. Eu tento neste momento fazer uma espécie de currículo da minha vida, e recordo quando a Rainha da Inglaterra veio a Portugal. [GF] - Foi em 1957 que a Rainha Inglesa nos visitou. [RB] - Sim. Os meus pais foram nessa ocasião a Lisboa. Trouxeram um jogo, que eu ainda hoje tenho, que eram umas construções de casas a partir da planta. Ou seja, é um conjunto de... É uma placa com ferros, no meio dos ferros mete-se umas peças que simbolizam tijolos, janelas, portas, etc. Portanto, desde os 5 anos, estava habituado a olhar para os catálogos, e isso ajudou muito a minha entrada no SAAL. Porque eu vinha de Economia. [GF] - Mas vinhas de Economia, vertente/especialidade do Planeamento. À qual se associavam as tuas preocupações sociais, etc. [RB] - Sim, mas eu vinha de Economia na vertente/especialidade de Planeamento. Não da Contabilidade, digamos. Por um lado, o meu pai, quando eu nasci, tinha 47 anos. Eu era um neto, não é? (Risos) Portanto, passava a vida a mostrar-me coisas interessantes; Castelos, ruínas romanas, tanta coisa. E sempre na base cartográfica. Portanto, eu cheguei ao SAAL e tive esta coisa de ler cartografias. Ainda hoje, não é? Depois, acabei por ir para o Urbanismo também, acho. Aquilo é tudo feito na escala de 5.000, não é? Não posso muito baixar, porque não tenho condições aqui no 4º ano, no máximo 1000. [GF] - Esse jogo chama-se Bayco? [RB] - Envolvia a construção de uma casa, depois outra casa. Também tinha a sua parte mecânica. Na verdade, em toda a minha geração, e sobretudo a geração anterior à minha, havia um Meccano para fazer pontes e carrinhos. Isso tudo, digamos, proporcionou-me uma facilidade da leitura dos documentos gráficos. Chamemos assim. E, por outro lado, obviamente, a questão social, não é? [GF] - Andar envolvido com as Brigadas. [RB] - Sim. Porque eu pertencia àquilo que se chamava, no SAAL, a Brigada Volante. [GF] - Pertencias a uma Brigada que tinha como diretor o Vítor Abrantes? [RB] - Tinha várias pessoas, entre as quais, eu. O Vítor Abrantes foi a primeira pessoa a que eu passei recibos verdes na vida. (Risos) [GF] - Penso que o Vítor Abrantes pertencia ao setor de Gestão Social, cujo chefe era o Mário Brochado. [RB] - Não. O Vítor Abrantes pertencia ao Planeamento, se bem me lembro. A gestão social tinha vários elementos, cujo coordenador era o Mário Brochado. E era eu que tratava de questões económicas, porque vinha de Economia. Tratei de muitos empréstimos às associações de moradores. Tratava de negociar empréstimos, fazer relatórios para justificar taxas de juros baixas, que eram sempre zero. Por outro lado, nas coisas mais ligadas à obra, nunca entrei muito. Foi sempre na relação entre a associação e a obra. Mas com a obra, propriamente, havia o desenhador que vinha ter comigo, e às vezes os arquitetos... [GF] - Sobre o clima pós 25 de abril, há a ideia de que houve euforia e desejo de consumo. E depois, o FMI, etc. Como é que foram economicamente os anos 70 e 80? [RB] - Eu acho que os anos 70 e 80 começam com uma grande esperança. [GF] - A “primavera Marcelista”? [RB] - Ou seja, quando o Marcelo Caetano substituiu o Salazar como Primeiro-Ministro, criou uma equipe de técnicos relativamente progressistas. [GF] - Inclusive o Veiga Simão, que fez a reforma do ensino. Ainda foi, durante muitos anos, o Decreto que regulou o ensino superior. [RB] - O Rogério Martins, como Ministro da Indústria. O Avelãs Nunes, etc. Uma segunda linha, que era o João Salgueiro, o Portas, os tipos católicos-progressistas, o Movimento GRAAL, e essa gente toda, não é? E, portanto, criaram uma certa expetativa naqueles anos. Não posso deixar de falar na ação do Nuno Portas, decisiva e com grande implicação na vida humana quotidiana, que é o Fundo de Fomento. [GF] - O Fundo de Fomento de Habitação. [RB] - Fez 40 mil casas em 4 anos, num país em “guerra”. Ou seja, projeto e concessão de vários programas, desde 1969. O Nuno Portas é aquele tipo da “frentex”, que saía daqui e ia para Nova Iorque. Esteve em Nova Iorque, trouxe o Turner em 1972, num congresso, no LNEC, E o homem que inventou o Bloco LNEC, Artur Ravara. [GF] - É uma geração que já viajava. [RB] - O Domingos Tavares, antigamente tinha uma frase muito engraçada, que era: “Anteontem fomos a Helsínquia, ontem a Milão, hoje ficamos em casa”. Nos anos 60 ia-se a Helsínquia. Nos anos 70 e 80, quando eu cheguei à Escola, ia-se a Milão. [GF] - Mas a Milão ia-se ver a Torre Velázquez e etc. [RB] - Era proibido olhar para as outras coisas. (Risos) [GF] - Iam ver o Gallaratese do Aldo Rossi, de um complexo com o Carlo Aymonino. [RB] - Sim, porque o do Rossi ia-se ver, mas o do Aymonino que estava ao lado não se olhava. (Risos) Portanto, eu acho que é o momento em que as pessoas viajaram e trouxeram... Aliás, às vezes aparecem aqui provas académicas sobre isso. [GF] - Trouxe uma certa frescura, porque o país estivera fechado durante muito tempo. Quando abriu, nos princípios dos anos 70, houve uma certa esperança e expetativa. [RB] - Por exemplo, os livros da Centelha, foram uma coisa fantástica. [GF] - A Centelha era uma editora de Coimbra, que publicava livros com o acordo do regime. [RB] - Ainda está vivo quem nos vendia no Porto, que era o Mário Moutinho. Aliás, acho que ele é mais novo que eu. Mas, o que diziam é que não podias pôr lá o Lenine, mas se pusesses Vladimir Illich, o livro podia circular. Portanto, este é, para mim, o melhor retrato daquele período da Primavera Marcelista. Era “sim”, mas para todos não. Lenin não, porque no PC havia muitos com dificuldades culturais. A ideia do regime era essa. Eram os operários, e os marinheiros, e os camponeses e tal. Porque os cultos sabiam muito bem quem era Vladimir Illich. Era também uma forma de compensar, acho, e de contentar a minha geração. [GF] - Tu entraste na Universidade em 1969. Quem fez parte da tua geração? [RB] - A minha geração, eram os tipos que estavam a nascer, não é? [GF] - Saíste após o 25 de abril. [RB] - Saí em 1976, porque chumbei dois anos. Portanto, foi possível criar uma espécie de ambiente propício a que quando o regime, a propósito do livro do Spínola. [GF] - O livro do Spínola, “Portugal e o Futuro”. [RB] - Na minha versão da história, houve uma reviravolta. [GF] - Portanto, o regime endureceu, despediram os ministros de Estado progressistas. [RB] - E voltou a chamar a Brigada do reumático. Por exemplo, na Escola de Belas Artes, tinha gorilas à porta que não deixavam entrar. E na minha Escola também, que era ali nos Leões. Depois, cria-se uma certa revolta, e há muita gente que vai para fora. Que é uma coisa, aliás, que explica porque é que a Universidade em Portugal é de direita. Não há país melhor a dizer isto, com exceção do ISCTE e da nossa Escola. Os das Ciências, de Letras, o Arnaldo Saraiva, a Manuela Fleming, o Quintanilha, estava tudo fora. Porque tinham “fugido”, exatamente, por esses anos. [GF] - Com o acréscimo da obrigação de ir à tropa, a imposição a que muita gente fugia. [RB] - Portanto, tomou conta e condicionou, claramente, o nascimento desta Faculdade. A Universidade. [GF] - Com o 25 de abril, há grandes esperanças e uma emigração acentuada. [RB] - Mas, o período do SAAL foi fantástico. Porque, como sabes, há um projeto na Câmara de 1972 para deitar abaixo a Ribeira. [GF] - O Plano Ribeira-Barreiro, atrás do Comissariado para a Renovação Urbana da Ribeira-Barreiro. [RB] - Eles tentam deitar abaixo, como faziam as cidades francesas, não é? Como, aliás, diz o Paulo Portas: “As elites culturais portuguesas sempre tiveram a mania de copiar as piroseiras das elites culturais francesas”. É o que ele diz, e eu estou de acordo. Portanto, iam a França, ver aquela cidade de plástico, onde por trás não há empenho, Não há materiais nobres, não há nada. Não é por acaso que o Príncipe Carlos é o mentor dessas coisas. Portanto, nasce um movimento de salvaguarda do património, World Heritage, que chega a Portugal. E eu acho que aqui no Porto os primeiros movimentos tinham como alunos o Nicolau Brandão, talvez o Manuel de Sá, etc. O Távora punha todos na rua a desenhar a cidade, a entender a cidade histórica. [GF] - Por exemplo, como na Ribeira. Consideras que nasce aí um movimento. Estamos a falar de 1972/73. [RB] - Com o movimento repressivo de 1973, a República... [GF] - Com a revolta do regime, o fim da “primavera Marcelista”. [RB] - Mas ainda durante o Marcelo Caetano. [GF] - Que implicações teve este período na Escola? [RB] - Dura pouco, mas tem uma carga simbólica muito grande. Por exemplo, na Escola despediram tudo o que era progressista. Aconteceu que antes do SAAL, já havia este movimento. Aliás, o Comissariado (CRUARB) tem a criação oficial em Janeiro de 1975. O Gigante contou muitas vezes a história. [GF] - O Gigante pai foi o primeiro comissário do CRUARB. [RB] - Porque era engenheiro, portanto, sabia mais de construção. Não era arquiteto só. [GF] - Era arquiteto, mas era também engenheiro de minas. [RB] - Sim. O Gigante era engenheiro de minas. Apoiou a ideia de não mandar abaixo, de estudar o que se podia fazer, a recuperação. Muito inspirado, penso eu, nas coisas inglesas. Mas também depois com o Távora a por tudo na rua a desenhar a cidade. [GF] - E quando é que tu entraste? [RB] - Obviamente, os alunos daquela época, vinham todos para as Brigadas. No meu tempo de Brigada, era eu um dos que controlava isso. Havia 30 Brigadas. [GF] - Portanto, 30 pedidos de moradores. [RB] - Os moradores chegavam e diziam-me: “Eu vivo numa ilha que está a meter água, está tudo podre. Venham lá ver”. [GF] - Abria-se um processo e o serviço nomeava uma Brigada. [RB] - Havia uma Brigada a atuar logo. Os serviços nomeavam uma Brigada, com algumas pessoas. [GF] - Compostas por arquiteto, engenheiro, desenhador, topógrafo, escriturário e sociólogo. [RB] - Às vezes com variantes. E o serviço FFH, não é? Ia-se ao sítio, abria-se um processo de declaração de degradação, etc. Ora, o que é que acontece? Há aqui outra coisa que eu também preciso dizer, que ajudou muito que este processo tivesse sucesso no Porto, e que no Porto fosse diferente do resto do país, que é o Movimento dos Bairros Camarários. [GF] - O Movimento dos Bairros Camarários. [RB] - A base era no Paço Episcopal da Sé, com a cobertura do Bispo D. António e sucessores. Era a obra diocesana de promoção social que ainda hoje existe. Foi criada pelo Bispo D. António, para complementar a promoção social; Como os infantários, os lactários, a mortalidade infantil, que na altura era 5 por cento. Agora é 5 por mil, ou 8 por mil, mas na altura era 5 por cento. E isto foi tudo feito na base, não se fez por cima, fez-se de baixo para cima. Não é como aqui que se põe um vidro na parede a dizer: “Tenha cuidado e lave as mãos”. Não, na altura tinhas de ir lá ensinar e lavar-lhes as mãos. E portanto, atuava sobretudo nessas vertentes dos Bairros camarários, na degradação, em casos de incesto, essas coisas terríveis que eu vi. E essa obra do Bispo de promoção social ajudou-me muito com o apoio do Instituto de Serviço Social, que mandava os assistentes sociais, do qual depois aparecem muitos portuenses. Como a cunhada do Manuel Correia Fernandes, por exemplo, o Alberto Martins, etc., gente ligada depois ao GRAAL, católicos progressistas. As condições eram terríveis. [GF] - O argumento era para evitar a subocupação e a sublocação. [RB] - A primeira manifestação, a seguir ao 25 de abril, de 27 de abril, 1974, resultou em partir os vidros da Câmara do serviço dos Bairros Camarários, na esquina do Cinema Trindade. Quando apareceu o SAAL, os moradores não queriam mais ser tirados do centro da cidade. [GF] - Tratava-se de casos empurrados para as periferias. Os bairros camarários faziam isso. O SAAL teve sucesso porque não fazia isso. Permitia que ficassem no sítio, pelo que muita gente aderiu. Criou uma nova dinâmica interessante, durando 2 anos, sendo extinto em 1977. [RB] - Construiu muito poucas casas, mas, enfim... [GF] - Todas as casas construídas, com exceção das do Alcino Soutinho, foram em terrenos públicos. [RB] - Nunca se conseguiu expropriar nada. A expropriante era a Câmara, só que a Câmara não ia ao ato da expropriação. O tribunal, dizia: “Não está cá o expropriante, nada feito. Então, a Câmara é que pede a expropriação, depois não se apresenta para tomar posse?”. [GF] - Quando dizes que a Câmara não aparecia, queres dizer que nunca tomou posse administrativa em nenhum terreno expropriado. [RB] - Exceto o do Soutinho, na Ilha da Maceda, porque fez um acordo com o proprietário. [GF] - A Operação nº 1 do SAAL é a Ilha da Maceda, da autoria do Soutinho. E a Operação nº 2 é o Bairro de São Vítor. [RB] - Quando acaba, eu vou outra vez para as cooperativas. Fui para a Fábrica Nacional de ar-condicionado, que no Porto se chamava Copro-Termo, que vinha de uma coisa chamada Termonor, portanto, que tinha as obras todas em Portugal na generalidade. O ar-condicionado existia na generalidade da construção, pensava-se que não havia outra coisa. Portanto, tudo o que tinha ar-condicionado, desde os estúdios da RTP, à Ponte Móvel do Porto de Leixões, e a generalidade dos Bancos, nos anos 60, 70. Estive lá, mais ou menos um ano, até que... Eu gosto muito do Mário Soares, mas o Soares entregou a FACAR, a Fábrica de Leça, aos Carvalhos (que pediram ao Pedro Ramalho para fazer aquelas torres fantásticas que lá estão), e eles acabaram com a fábrica. [GF] - Era uma fábrica/indústria tecnologicamente muito avançada. [RB] - Fazia coisas que mais ninguém fazia. Tubos com costura, coisas esquisitas que se usavam muito nos ar-condicionados e nas caldeiras de calor, que precisavam de um tubo especial para vapor por exemplo. Portanto, quando o Mário Soares entregou a fábrica, foram por arrasto uma carrada delas. Vai a mãe, os filhos caem todos. Nessa altura, telefonou-me o Sérgio e disse: “Anda para a Escola, que é fixe”. II. [GF] - Vieste para a Escola em 1978. [RB] - E lá fui parar eu à Escola. Quando eu cheguei à Escola, pronto, tiraram-me as férias. (Risos) Vim em 1978, fez ontem 42 anos. [GF] - É interessante que recordes a data. (Risos) [RB] - Claro, 9 de Março. Não é 8, é o dia seguinte. Portanto, é fácil. [GF] - Foste para a Análise Económica. [RB] - Atiram-me para aquilo que vinha inspirado do Departamento de Análise Económica e Social do Território, DAEST, de Veneza. O Domingos vinha, digamos, inspirado em Veneza. O Departamento de Análise Económica e Social do Território era muito famoso em Veneza. [GF] - Que aqui chamou-se “Análise do Território”. [RB] - Entrei para um grupo onde, aliás completei o doutoramento. Estava o Manuel Sá, consultador no Conselho da Revolução, tinha sido destacado pela Revolução. Quem mandava aquilo era o Nuno Guedes Oliveira, penso eu. E eram os urbanistas, mas havia poucos. [GF] - Faziam Análise do Território, AT. [RB] - Depois não posso deixar de reconhecer uma coisa. O Alexandre, que é uma pessoa fora de série, que me chamou para fazer uma série de conferências. E eu andei a fazer conferências que acompanhavam e “auxiliaram” as dele. Ele montou um curso de História da Arquitetura Portuguesa, a começar no período do D. Afonso Henriques. Pediu-me a mim para eu fazer uma série de introduções de meia hora, sobre a História Económica daquele tempo que ele ia falando. [GF] - Essas conferências eram no anfiteatro da Escola, nas quartas-feiras de tarde. [RB] - Quarta-feira à tarde, que era o dia das conferências. Pronto, e isso integrou-me completamente, sem ter de fazer grande esforço. [GF] - Mas ainda não tinhas um contrato. [RB] - Não, o contrato era o de 9 de Março de 1978. Por acaso foi assinado mais tarde, o diploma é de Abril. Fui parar sempre aos últimos anos. [GF] - Foste para o 5º e 6º ano, na época havia 6 anos. [RB] - O que eu fiz, basicamente, foi orientar teses sobre Bairros Camarários. [GF] - Eras professor “especialista” em Bairros camarários. [RB] - Porque não havia nenhum professor especialista nisso. Talvez um bocado o Alexandre, mas... Portanto, orientei tudo o que era Bairros Camarários. Depois apareceu uma estudante de nome Lurdes, com uma tese sobre “a casa bomba” do Siza. E portanto, comecei também a ver arquitetura no meio dessas orientações. Além da parte sociocultural e física formal, comecei a ver também a Casa Bomba, a “Casa da Póvoa”... Isso foi-me integrado. Fui-me integrando até que fiz parte. [GF] - Tu e o Rui Póvoas hoje são dos contratos mais antigos da Escola. [RB] - Sim. Da Escola, não há ninguém mais antigo. [GF] - Em 1979, acho que se desenvolveu uma nova direção, um pequeno período de transição. Depois, a Comissão Instaladora. [RB] - Penso que não. Depois, eu integrei-me nesse grupo do território. Quero lembrar o Jacinto, que me empurrou para a observação do mundo! Tenho uma bela memória das aulas. Havia um dia por semana em que todos os professores estavam juntos, em 1986, nas cavalariças, já no edifício “cubo”. Porque havia um dia por semana, a quarta-feira, em que todos discutíamos tudo. Isso vem de trás, da Escola, e perdeu-se. [GF] - Dizias que na Escola, em 1986, havia esse dia por semana em que todos se juntavam a discutir temas nas cavalariças? [RB] - Eu aprendi muito com isso. Aprendi a ouvir as críticas. E a ver uma coisa que eu acho que foi muito importante, que é a possibilidade de seres chamado para dar aula. Por exemplo, lembro-me sempre desse ano... O Siza convidou-me para fazer uma aula com ele, em que ele fez a questão dos mercados no mundo e eu fiz a questão dos mercados no Porto. Na realidade, fiz uma pequena investigação sobre as formas e a história. Fui com o gravador debaixo do braço para os mercados às 5h da manhã, ouvir e gravar os barulhos. Uma investigação social muito à Escola de Chicago, ainda. [GF] - Em 1979, o Governo de Maria de Lourdes Pintasilgo decretou as Faculdades de Arquitetura, em Lisboa e no Porto. E eram precisas as Comissões Instaladoras. [RB] - Se não me engano, o Reitor era o Prof. Campos e Matos, e propôs uma Comissão Instaladora que eram só os engenheiros. Tinha o Távora, mas eram só os engenheiros. E o Távora era figura decorativa. A Escola entrou em greve e propôs, então... O Alexandre foi buscar o Portas a Lisboa. O Portas, apesar de ter feito o curso em Lisboa, acabou o curso cá, porque havia sempre este problema. O Domingos foi ao contrário. [GF] - Fez o curso cá e foi acabar a Lisboa. [RB] - Porque havia mesmo muita gente que ia acabar em Lisboa. Porque aqui demorava imenso tempo, e em Lisboa era algo mais expedito, não é? Pronto, então foram buscar o Nuno Portas a Lisboa. Porquê? Porque o Portas e o Távora eram os únicos Professores de nomeação definitiva. E o Reitor aceitou que assim fosse. E, portanto, a primeira Comissão Instaladora, a seguir à dos engenheiros, que nos fez entrar a todos em greve... Eu, nessa altura, com a Beatriz... [GF] - A Beatriz Madureira, que penso que foi Presidente da mesa da Reunião Geral de Professores. [RB] - Ela era Presidente e eu Vice-Presidente da Mesa da Reunião Geral de Professores. E o que fizemos foi apoiar essa coisa. Portanto, era o Távora e o Portas, que eram os dois Professores de nomeação definitiva. E o engenheiro Campos e Matos começou a aceitar que talvez o Pedro Ramalho pudesse ser também, porque “era filho do engenheiro Almeida D’Eça”. [GF] - Mas, entretanto, mudou o Reitor? [RB] - Não sei se foi o Alberto Amaral, se foi o Oliveira Ramos. [GF] - Mas, em suma, aceitou-se uma composição da Comissão, que tivesse maioria de arquitetos. [RB] - Mas tinha que ter um engenheiro e um geógrafo. Então, o Portas já não era preciso, não é? (Risos) E, portanto, encostaram-no. [GF] - Ficou o Távora, o Alexandre e o Domingos. [RB] - Que equilibravam as duas tendências. Depois, o Engenheiro Sampaio, porque era o engenheiro da Pousada do Convento da Costa. E ainda o Prof. Pereira de Oliveira, que vinha das letras de Coimbra, da geografia, que introduziu uma pancada de cadeiras de geografia no curso. Geografia humana, geografia terrena, geografia urbana, geografia demográfica, geografia... E o Alberto Amaral, tinha uma assistente que se tinha casado com um Inglês, que é o Filipe Brebner. [GF] - Portanto, Távora, Alexandre, Domingos, Engenheiro Sampaio e Pereira de Oliveira. O Filipe Brebner foi o primeiro doutorado na Escola? [RB] - Sim, é o primeiro doutorado da Faculdade de Arquitetura. [GF] - A área dele era... [RB] - Era “Physical Planning”. A tese dele é sobre cidades marroquinas. [GF] - De que ano é essa primeira tese? [RB] - Deve ser 1986, 1987... Mais do que 1988, não. [GF] - Na altura deviam estar a fazer as cavalariças, e o pavilhão Carlos Ramos, etc. [RB] - Pronto, isto foi normalizando. Acabou o regime experimental, e as notas, as críticas finais da nota de Projeto que eram discutidas por todos, deixou-se de fazer isso. Cada pessoa passou a dar as suas aulas, as suas notas. Deixou de haver encontros entre História, Projeto e Urbanismo, Encontros entre áreas, discussão... Depois, o Portas inventou uma coisa que eu acho que foi fundamental... [GF] - Que foi o CEFA. [RB] - Que ninguém dava valor, mas foi o Portas que inventou, com o trabalho inicial da Universidade de Aveiro. [GF] - Acho que há um ainda anterior à Universidade de Aveiro, que é o Teatro Viriato em Viseu... [RB] - Nessa altura veio cá o Aymonino, e a Teresa Fonseca foi trabalhar com ele. E ganhou uma certa dimensão esta ideia. Era também uma ideia do Alberto Amaral, pôr a nossa Escola a produzir para a Universidade: “Já que são todos tão bons, digam lá”. E há tantos projetos para aí. [GF] - O Planetário, a Escola de Medicina Dentária, são todos projetos aqui do Centro de Estudos da Faculdade de Arquitetura. [RB] - Acho que o CEFA foi fundamental. Antigamente, ou seja, até ao CEFA, a experiência profissional era a experiência profissional de cada um. Para o escritório, para a obra, etc. O aluno ouve falar um professor que já construiu, que está a construir, que está a projetar, etc... Mas com o CEFA não. [GF] - O CEFA trazia para cá a prática. [RB] - Eram os alunos que trabalhavam, e eram alunos sob a direção do Nuno Portas, que constituíam matéria de estágio. O ensino aqui é, apesar de tudo, muito abstrato. Portanto, aquilo era concretizável. Fizemos muitos Planos Urbanos aqui. [GF] - Quando é que começaram os Planos Urbanos? Nos anos 90? O Pólis, por exemplo, foi no início dos anos 2000. [RB] - O Pólis foi o último grande trabalho. O trabalho do Nisa foram 500 mil euros de contrato, geridos por mim. O Município de Nisa tem 6 barragens. A EDP... [GF] - Foi sobretudo o de Aveiro? [RB] - Fomos consultores da Câmara para o Pólis da Aveiro. Durou 3 anos. [GF] - Entre 1999/2000 a 2002/2003, a seguir à Expo. [RB] - Porque o Polis é uma resposta para as ideias da Expo. Começou pelas 18 capitais de província. [GF] - Sim, depois é que se alargou às cidades médias. [RB] - Onde a política tinha força, foi buscar dinheiro. O Sócrates, que era o grande mentor disto, queria primeiro resolver o know-how da Expo, porque quem fazia o Polis era o gabinete técnico da Expo. As Câmaras só eram sócias, mas o sócio maioritário era a Expo. 40% de Câmara, 60% do Ministério do Ambiente. [GF] - Consistia na requalificação dos Centros Urbanos, o espaço público, o ambiente, etc. [RB] - Tinham de fazer zonas para o jogging, que as cidades não tinham zonas para o jogging. Os supermercados estavam a cair de sapatilhas a vender e não as vendiam... (Risos). Era preciso resolver o problema de uma forma drástica. [GF] - E quem fazia parte do CEFA? O Pessoal do Urbanismo? O projeto do Teatro Viriato tinha autoria do filho do Pedro Ramalho, o Sérgio Ramalho. [RB] - O Urbanismo todo. O Portas, o Manuel Sá, eu, o Álvaro. [GF] - O Álvaro Domingues penso que entra efetivamente em 2001. [RB] - Quando se demite da comissão do 2001, da Comissão do Porto 2001. Ele não estava no Pólis Somos os 3 que aparecem sempre nos primeiros livros. Depois começaram a aparecer estes nomes mais jovens. Eu fui o segundo doutorado, já agora. [GF] - Depois deste verão? [RB] - Sim. Eu doutorei-me no IUAV. [GF] - Foi em 1992, no Instituto Universitário de Arquitetura de Veneza. [RB] - Foi com o Luigi Mazza. E depois, em 1994, no Porto, sou Doutorado em Arquitetura. Na especialidade de Urbanologia - é assim que aparece escrito. Fui o segundo Doutor em arquitetura da Faculdade. Depois a terceira foi a Teresa Fonseca. [GF] - Portanto, tiraste um 2º Doutoramento aqui em 1994? [RB] - Sim. Depois a partir daí nasceu o Mestrado, que foi outra coisa também muito importante. [GF] - O chamado Mestrado em “Planeamento e Projeto do Ambiente Urbano”, criado penso que em 1994. [RB] - Até esses anos do Portas, a experiência que era trazida para o ensino, era uma experiência pessoal dos arquitetos que trabalhavam nas obras e que traziam as obras. Que não deixa de ser fundamental. Mas o Portas trouxe outra experiência, que é a de dentro. Trouxe, sobretudo, uma unifracionalização disto. [GF] - E o CEAU. [RB] - Do qual eu fui secretário durante dez anos, passei uma vida a fazer aqueles relatórios... (Risos) Isto coincide com o grande movimento do Portas... [GF] - O CEAU foi criado em 1996. [RB] - O Portas foi a Lisboa, e falou com alguém: “Há aqui uma coisa bestial para fazer investigação, nós não temos investigação”. Portanto, foi ele que trouxe a investigação. Foi ele que trouxe os trabalhos para dentro, não é? O José Quintão também passou lá. Portanto, o que é que acontece? De repente, o Portas diz: “Temos que formar aqui um corpo docente, se não isto nunca vai dar bem”. E então nasce o Mestrado em Planeamento e Projeto do Ambiente Urbano, em 1994. O Portas queria fazê-lo com várias Universidades do país. Portanto, Coimbra, Aveiro e Porto. E não conseguiu porque as Universidades não podem... Que é uma estupidez, não é? O meu tinha três Universidades, Veneza, Milão e Turim. Sede IUAV e sedes associadas como o Politécnico de Milão e o de Turim. [GF] - Não foi possível. Portanto, ficou só a Universidade de Porto. [RB] - Portanto, em 1994 o Portas fez isto para criar um corpo interno, uma fornada com o José Miguel Rodrigues e o Luís Viegas. [GF] - E o João Francisco Figueira, do Porto, que foi para Lisboa. [RB] - Sim, o irmão do Miguel. Foi a primeira fornada. III. [GF] - Trabalhaste 3 anos com o Fernando Távora, de 1980 a 1983, no Plano de Guimarães? [RB] - Trabalhei primeiro com o Bernardo Ferrão, de 1979 a 1980 no Plano de Esposende. E depois 1980 a 1983, com o Távora no Plano de Guimarães. Falar sobre isso demorava um dia... Aliás, no livro amarelo da Taschen sobre o Távora, ele pôs-me em segundo lugar como autor. Antes do Matos Ferreira. (Risos) Fui comprar o livro, custa 250, 350 euros... Não sei do meu... [GF] - Eu ainda tenho o que então comprei. [RB] - Isto também foi-me integrando mais no Urbanismo. Depois o Portas queria também uma outra coisa que é bestial, que é um projeto de investigação para o João Cravinho, sobre a reforma da lei urbanística, no qual o Portas era o chefe. Eu e o Manuel Sá tínhamos duas ações: Eu mais a questão da gestão urbanística, e o Manuel Sá mais a questão arquitetónica. Tinha dois estagiários, que eram o Rui Barros e o Rui Cardoso. E trabalhámos aí todos, 3 ou 4 anos nisso. Pelo menos eu fiz um bocadinho. Percorremos o país todo a entrevistar presidentes e engenheiros de Câmaras e a ver os arquivos e tal, a ver como é que andava o sistema de planeamento e... Isso criou uma grande... [GF] - Na altura dos PDM’s? [RB] - Também. Nós íamos ver os Planos de Urbanização, mas também muitos PDMs. [GF] - Portanto, anos 90. Tens essas dadas? Dos PU’s, dos PDM’s, e dos Decretos? [RB] - É o D/L 69-90, o primeiro, que diz que é obrigatório durante um ano... Se tu fores ver o nosso relatório, que está na biblioteca, verás que 10 anos depois ainda faltavam 20. [GF] - Era obrigatório... [RB] - Ter planos, se não não tinhas financiamentos. Isso foi ainda na altura do Cavaco. Claro que ninguém respeitou, só havia 8 ao fim da data, que eu acho que era 1 de janeiro de 1992. [GF] - Porque é depois da adesão de Portugal à CE. [RB] - Foi 1 de janeiro de 1992, não foi 1986, não. Portanto, em 1992 tinhas que ter um plano. O que é que dizia o plano? “Pode construir ou não pode”. Atribuiu o valor aos terrenos, que até aí não havia. Era tudo muito casuístico. [GF] - E os PDM’s... [RB] - Os PDM’s obrigavam a dizer “sim ou não”. Quando chegas aos anos 2000, isto vira completamente. Primeiro porque vira o Plano de Estudos. Agora não sei exatamente o ano. Portanto, o Plano de Estudos, são 5 anos, e não 6 anos. Depois veio a pressão de Bolonha para reduzir para 4 anos. Lá se conseguiu que Arquitetura, Engenharia e Medicina ficassem com 5. A Annie Gunther sempre disse que foi uma luta de tentativa, não é? Uma luta contra o tempo. Digo-te, como Presidente do Conselho Pedagógico, que uma parte importante dos professores aqui, ainda não percebeu que não tem as semanas que tinha antes. E quer fazer o mesmo, não pode. Eu, por exemplo, cortei. Sabes quantas aulas eu tenho? 8. [GF] - Eu cortei 1/3 dos exercícios em relação ao que tinha antes. [RB] - Eu tenho 8 aulas, o que é que eu faço em 8 aulas? Fiz 2 aulas teóricas e agora 2 práticas. No 2º período faço 2 teóricas e 2 práticas. Depois 2 no fim para animar, não é? As cadeiras complementam-se e tudo, a I com a II e etc., mas é muito difícil ter essa possibilidade aqui... [GF] - Houve um período em que havia internamente reuniões com o Nuno Portas, e reuniões sobre o papel do Urbanismo no Plano de Estudos. [RB] - Sim, e perdeu-se desde que ele foi embora. O Álvaro tem uma visão diferente, não é? Eu encostei-me ao meu cantinho. [GF] - Houve uma redução. [RB] - Toda a gente acha que a cadeira de Urbanística do 4º ano é facultativa, optativa. Não, mas é obrigatória. Até pela maneira gráfica como é apresentada no Plano de Estudos, parece uma optativa. No outro dia, o José Maria Lopes, perguntou-me sobre isso, pensava que era optativa. [GF] - Começaram a reduzir o 6º ano, o Projeto para semestral... O Mestrado também começa a funcionar pior e menos aqui. Por causa da FEUP, pelo que eu percebi... [RB] - Aquilo que também começou a ser usado. Isto foi dado por ordem da FEUP. Nós não temos condições aqui. Se não tens outra hipótese, como é que fazes? A FEUP quis, levou. Portanto, nem eu falo de nenhuma questão. Agora, o Urbanismo está reduzido. É uma coisa que existe no CEAU. Na prática, na Escola, não se nota o Urbanismo. Porque é o 5º ano, é o velho 5º ano. [GF] - Há algum pessoal docente formado nesse Mestrado em Urbanismo. [RB] - Sim há. Mas as três coisas fundamentais, eu acho que é o CEFA, é o Erasmus já agora, de que sou fundador, e o CEAU. [GF] - O programa Erasmus, penso que foi fundado em 1989. [RB] - Fez-se isto há 30 anos. Fez-se uma festa, até, em Milão. [GF] - O Erasmus aqui no Porto começou com esses contactos na Europa. [RB] - O primeiro Erasmus na Europa em Arquitetura foi o nosso. Era Porto, Delft, Milão, Valladolid em 1989. [GF] - O primeiro Erasmus da Arquitetura que existiu na Europa, foi o nosso? [RB] - Sim. Fizemos a candidatura, e foi aprovado. Foram 2 alunos no primeiro ano. Portanto, o Erasmus é uma coisa que abriu as cabeças e trouxe novidades, outras formas de pensar. Mostrou, como dizia o Jorge de Sena: “Se eu mandasse, punha cada português, pelo menos 15 dias no estrangeiro, sozinho" Não é nos grupos da camioneta para Benidorm”. [GF] - O Erasmus teve essa qualidade. [RB] - Pois, foi muita gente quase sozinha - embora tivéssemos tendência a enviar aos pares. E depois alguns ficavam lá a trabalhar em escritórios. [GF] - Neste momento, quase 60% dos alunos faz Erasmus. [RB] - Isso é outro problema. Foi mal gerido. Foi gerido para resolver a questão do espaço. Não havia espaço para meter um ano, portanto foi o ano inteiro. Foi muito fácil. [GF] - Portanto, dizias o Erasmus e o CEFA, etc. [RB] - Esta coisa que na Faculdade existe, que é a possibilidade dos estágios serem feitos cá dentro. Por exemplo, o CEFA, e o CEAU. A Faculdade está cheia de tipos com bolsas a fazer estágios, e que ajudam a didática. A didática também melhorou qualitativamente com isso. E o Urbanismo ainda tem muito isso; O Nuno Travasso, a Ana Fernandes, a Teresa Calix. Há todo um leque de pessoas a dar aulas. Todos, exceto o do Rui Mealha, que está ligado à profissão, estão ligados ao CEAU. Portanto, isso foi fundamental. [GF] - Portanto, o Erasmus, o CEFA, e os estágios cá dentro. [RB] - Sim, é um tipo de debate. O debate não é o que vem nos livros. O que vem nos livros é a consolidação de 20 anos depois. Cada vez mais, cada vez menos há livros. O livro é um clássico que passa. [GF] - Já há menos livros e revistas, tudo transitou para o online. Houve aqui umas mudanças. IV. [RB] - Eu fui o presidente do júri de 1003 alunos. Puseram-me lá porque eu tinha uma boa relação com os alunos. Lembras-te de quando os alunos fizeram o muro, e veio a SIC? Ficou tudo a tremer. Era o ano do André Tavares. [GF] - Sim, foi na minha altura. [RB] - De repente, toda a gente começou a investir nas provas. [GF] - O muro se calhar não teve a ver só com as provas... Mas acho que pelo que contribuíram para o somatório de classificação final [RB] - Era contra o sistema de classificação! O Relatório de estágio não era a última coisa do curso. Era feito antes e valia o dobro da média de curso. Podias fazer cadeiras depois. E o Távora disse. “Não senhor, o relatório de estágio vale o mesmo que uma cadeira normal.” E o muro nasceu por isso. E depois eu é que arranjei um sistema para percentualmente ir reduzindo. [GF] - Todos os anos diminuía um bocadinho. [RB] - Foi uma altura bestial, em que a biblioteca ficou cheia de conhecimento - não tinha conhecimento próprio. Portanto, são estas 3 frentes. Mandámos alunos para fora, pô-los a ajudar cá dentro e a ajudar a didática, sempre capaz de desenformar o corpo docente que começou com o Luís Viegas, então no Mestrado. E, por fim, esta coisa da prova final. De repente, todas as pessoas, toda a gente, tu próprio... Eu, como era presidente, estive sempre mais puxado para trás. A Escola passou a ter um grande património disciplinar, que está na Biblioteca, encerrada a 7 chaves (muito pouco consultado). [GF] - Eu orientei uma prova sobre as provas que tinham sido feitas até a data coincidente com o período de direção do Barata. [RB] - Depois, a nova mexida no Plano de Estudo, que acaba com esta última. [GF] - O Nuno Portas já saiu há 15 anos. Nascera em 1934. [RB] - O Portas tem mais 18 anos que eu. Vai fazer este ano 86. Ele tem 85 anos. Ele saiu quase exatamente há 15 anos. Portanto, quando o Portas saiu, o Manuel Sá não aguentou. [GF] - O Manuel Sá nasceu em 1943, tem mais de 9 anos do que tu. [RB] - Também saiu já há 7 anos. Nota-se mais o peso, não é? [GF] - Depois, ficaste tu e o Álvaro Domingues. [RB] - O Álvaro veio aqui para este cantinho. Eu fiquei sozinho. Autoisolante também, parcialmente, mas não me posso queixar. E o que é que eu fiz? Comecei-me a meter a fazer Planos, não é? [GF] - Qual é o ano do primeiro Plano em que trabalhas? Será o “Plano do Nisa” em 2003? [RB] - Fiz Nisa, Belmonte, e dirigi ainda outros. [GF] - Tudo a partir do CEFA. [RB] - Sim. Agora estamos a fazer uma coisa sobre cidades de fundação. [GF] - Fizeste também um projeto em Vigo, na fronteira. [RB] - Sim. E outras coisas pelo caminho. [GF] - Mas a imagem a passar, é de que havia aqui um corpo de Urbanismo. E falaste de várias plataformas que quanto a ti abriram na Escola nos anos 90. Eu no início da conversa comecei por te abordar sobre os anos 70, 80. Depois avançaste para a década de 90. Referiste o Programa Erasmus, o CEFA, o CEAU, etc. [RB] - E formação pessoal em Urbanismo. Por exemplo, o José Miguel não era de Urbanismo. Tu podes dizer que aquele Mestrado é de Urbanismo. Mas, o José Miguel não é propriamente de Urbanismo. [GF] - Tu estavas no júri da Prova do José Miguel? [RB] - Sim. Há muita coisa que ficou dessa formação. Mas há muitos que seguiram o seu caminho. Por exemplo, a Ana Alves Costa, o Alberto Lage, o Rui Cardoso... Se te começo a dizer quem é que passou por esse Mestrado aqui da Escola... São dezenas. [GF] - Depois desenvolveu-se o Doutoramento, que constituía outra fase. [RB] - Há o Doutoramento. Mais uma vez, foi o Portas, não é? [GF] - O nosso PDA começou em 2008, mas a linha de Urbanismo só surgiria muito depois. [RB] - Acho que foi o Portas. Estava já formado, mas foi ele que trouxe a ideia. O Doutoramento não começou em Urbanismo, começou em... Acho que História e Projeto. Era o A e o B. [GF] - Pois. Exatamente, começou com os perfis A e o B. Um era dirigido pelo Domingos Tavares e outro pelo Alves Costa. [RB] - E lentamente, o Portas disse: “Então vamos lá fazer também um, já com a tradição do Mestrado em Planeamento e Projeto de Ambiente Urbano”. Que era o Mestrado de 2º nível, não é? [GF] - Essa linha do PDA em Urbanismo, penso que abriu por volta de 2010. [RB] - Sei quem são os primeiros alunos ainda. [GF] - Percorremos uma história que tem a ver com os primórdios da Faculdade. Há bocado disseste que falar sobre o Távora “demorava um dia”. Depois fizeste um par de comentários sobre o Domingos Tavares e sobre o “Plano da Póvoa”, etc. De facto, a tal história da Escola pintada pela sequência de direções. Tu estiveste uns anos na direção da Faculdade, mais especificamente no 1º mandato do Domingos Tavares. Quais eram os desafios que tinham nessa altura? [RB] - O 1º grande desafio então, fora de resolver o 25 de abril, e dar credibilidade à Escola. Eu entrei ainda no fim dessa frase. O 2º desafio foi dar credibilidade à Faculdade de Arquitetura. E controlá-la. (Risos) Porque a Faculdade de Arquitetura funcionou ali na Reitoria, não é? Portanto, foi o segundo grande desafio. Eu acho que o 3º grande desafio foi, talvez, Bolonha. [GF] - Bolonha também deve ser em 2008. [RB] - Bolonha pôs em causa isto tudo. [GF] - Esta coisa do ensino de massas. Há aqui alguma... [RB] - Eu estava a ler o relatório do PDA, porque tenho de dar um parecer. E, pronto, há com cada uma... Eu, o ano passado, no Doutoramento, tinha 6, 7 alunos. Dois portugueses e uma inglesa, cinco brasileiros, dos quais 2 tinham algumas dificuldades. Acho que agora são 5 alunos. Curiosamente, eu acho que ali tem mais teses, não do Urbanismo, mas de outras áreas. Por exemplo, a questão das Escolas abriu muito. O Paulo Lousinha estava a trabalhar assim. Estava a fazer o Doutoramento comigo sobre as Escolas. Não é do Urbanismo. V. [GF] - Podemos retomar à altura em que estiveste na direção, no início dos anos 2000? [RB] - Em 2003. [GF] - Quais eram os desafios nessa altura? [RB] - Os desafios nessa altura? Não havia, assim, grandes questões, para dizer a verdade. A questão da massa chegou mais tarde. [GF] - Quando chegou a questão das “massas”? [RB] - Chegou... Eu penso que já lá não estava quando chegou. Portanto, já foi para aí em 2005. O primeiro a apertar o dinheiro, assim, que se sentisse, foi o Durão Barroso. [GF] - O Governo do Durão Barroso... [RB] - Foi o primeiro Governo que apertou, realmente. Isto, começou a apertar por volta dessa altura. Aliás, ele próprio dizia que o país estava... O que aconteceu foi que, realmente, o Estado estava em crise. [GF] - A crise foi em 2008. [RB] - E começou a apertar. Portanto, começou com o Durão Barroso, e depois o Governo de Sócrates, com a crise dos empréstimos externos. [GF] - É aí que começa o “subprime”. Não é esse o termo económico? [RB] - Sim, mas não foi por isso. [GF] - É os bancos a emprestarem dinheiro a quem não pode pagar. [RB] - E agora estamos a pagar. Olha, mais um milhão para o Espírito Santo. Quer dizer, venderam o Espírito Santo, e todos os anos lhe dão dinheiro... Venderam a um fundo Americano. E todos os anos têm que lá pôr mil milhões. Ou seja, temos que pôr nós, não é? [GF] - Acho que está no Orçamento de Estado? [RB] - É menos serviço. Ou menos qualquer coisa... É menos várias coisas. Agora, isso é que é a política. Menos o quê? Por exemplo, olha a situação laboral aqui na Faculdade. Onde chegamos, não é? Alguns a ganhar... [GF] - Acho que houve... [RB] - Ainda hoje estava a ver. A população cresceu, a nível mundial... Era sobre Madrid, a propósito desta questão do vírus. A população da região de Madrid, a comunidade... Além da cidade, tem outra cidade. A cidade municipal tem outra. Entre 2010 e 2018, aumentou 500 mil pessoas, e perdeu 5 mil trabalhadores sanitários. Isto tem que se pagar. Não há dinheiro? [GF] - Retomando à história específica da FAUP. Ao período de direção pelo Alexandre Alves Costa, sucedeu-se o período pelo Manuel Correia Fernandes, que antecedeu o período de direção do Domingo Tavares, de que participaste no 1º mandato. Recordas alguma coisa desse período? [RB] - Eram as discussões habituais, mas... Só não liguei as duas coisas. O centro de investigação com o Portas como diretor e o Manuel Correia Fernandes no diretivo da Faupfui eu responder pelo CEAU perante a Comissao de Avaliaçao Eu apanhei uma dose.. O Fernando Gil é que me salvou. O Nuno Portas estava em Barcelona e o Manuel Correia Fernandes disse que tinha que fazer no escritório. E portanto, fui lá eu. Perguntaram-me: “Então, e o Portas?”, “Ah, o Portas está em Barcelona, no UIA”. “Ah, mas eu também sou da UIA e estou aqui. Então, o chefe não está cá?” Eu sempre me sujeitei, porque se o Portas me mandava deitar ali ao poço... Nem discuto. Mas compreendemos que é uma pessoa de generosidade. Mas à parte disso, houve sempre assim coisas... Foi sempre com a certa continuidade. É capaz, se tu fores esmiuçar à miudeza... Eu acho que o primeiro grande golpe foi a passagem do sistema de provimento. Portanto, há um orçamento do Estado que te dá 100 para papel higiênico. E no princípio do ano tens 100. Todos os dias tiras. Quando falta, vais buscar ao papel de fotocópias... Porque já tinhas posto mais no papel de fotocópias, que era mais fácil de justificar, porque havia quem se calhar levasse papel higiênico para casa, etc. Enfim. Bem, o que é que se fazia? Como a fatura era do mesmo fornecedor, “O que é quer na fatura? Só o papel higiênico ou também o papel A4?” [GF] - Dizes que era a mecânica orçamental da Escola... [RB] - Havia uma lotação que era sempre igual de ano para ano, ou aumentava relativamente com a taxa de inflação, umas coisas assim. Isto acabou com o meu estímulo na direção. Não é para me elogiar, eu não quero. É uma coisa que foi sempre ligada às questões da gestão. A gestão foi sempre feita “à padeiro”, “à mercearia”. Eu tentei introduzir e consegui, por exemplo, na Biblioteca, uma gestão previsional. Portanto, eu dizia: “Quanto é que é preciso gastar por ano?”. Até porque quando entrou o sistema... [GF] - Portanto, entrou um sistema de contabilidade “comercial” na gestão das contas da Escola? [RB] - Foi um golpe porque, por exemplo, metade do pessoal não sabia trabalhar com aquilo. Não te lembras da questão do Tesoureiro? Eu tive que “mandá-lo embora”. O homem foi, porque não queria mexer na máquina de pagamento no multibanco por causa das propinas. O homem fazia as propinas à mão. Já viram o que é registar tudo isso... Nunca foi ao banco, nem para abrir a conta. Os homens do banco não sabiam quem ele era, nunca lhe viram a cara. [GF] - O que recordas do período de direção do Domingos Tavares? [RB] - O Domingos, com uma grande sensibilidade humana, apoiou muita gente a subir na vida. Por exemplo, a tesoureira entrou a tirar fotocópias. Ele mandou-a fazer uns cursos, e foi subindo. Como o caso de mais gente, o Jorge por exemplo, a Conceição... [GF] - Dizes que o Domingos Tavares introduziu melhorias também a nível da administração? [RB] - Tinha que ser. Deixou de ser possível fazer gestão de merceeiro. Tinha que se fazer previsão. Depois há outra coisa. O sistema das faturas deixou-os loucos. Não sabiam o que era uma fatura. A função pública pode funcionar assim: “Traga já o recibo, que depois logo lhe pagam”. Não existe isso, no mundo comercial, não existe. [GF] - E era um período em que se crescia em complexidade. [RB] - Pois. O segundo choque foi um choque, que depois não se normalizou. O aparato da casa não funcionava. Eu tive que ensinar a fazer aquelas coisas, com a ajuda fantástica do Domingos Tavares, que promoveu as pessoas certas, do meu ponto de vista. [GF] - Ao período da direção pelo Domingos Tavares, seguiu-se o período da direção pelo Francisco Barata. [RB] - O Domingos tinha outra coisa, que era, só tratava de assuntos que ele achava que eram essenciais para a cultura disciplinar. A miudeza, deixava andar. Pior, muitas sobravam para mim. O Francisco Barata, no meu ponto de vista... Era um tipo com algum medo que a Escola fosse associada a não sei o quê... Fez coisas que eu acho que não haviam de ter sido feitas. Por exemplo, entregar a Livraria aos estudantes, que eu sempre resisti, e que acabou por ser entregue. Lixou-se a divulgação da produção da Escola. Não há hipótese de divulgares um livro. Eu acabei de desistir de fazer um livro. Eu estava para fazer um livro em Milão. Gostava mesmo, mas tinha que ser traduzido. Descrevi à senhora do Politécnico, e andaria aí, penhorado um mês ou dois. E disse. “Para quê? Para ficar no armazém, aqui?”. Porque antigamente a FNAC comprava. Mas quando os alunos tomaram conta daquilo, começaram a fazer 20% de desconto. A FNAC começou a deixar de vender. Porque a FNAC... Nós fazíamos 30% de desconto à FNAC. Mas eles não podiam, com esse 30% concorrer com os 20% que os alunos fazem a todos, a qualquer um. Eu também sou sócio, portanto também usufruo desse desconto. [GF] - Durante o período de direção pelo Francisco Barata, não se deixaram de enfrentar desafios, por exemplo Bolonha, entre outros. [RB] - Deixou de haver aquela facilidade de gerir dinheiros. Depois ele, no princípio, acho que devia ter tido mais cuidado com o pessoal. Coisa que o Domingos tinha sempre toda a gente a aplaudir. O Domingos era um Deus, não é? Depois o Carlos Guimarães tentou recuperar isso. [GF] - Em determinado momento foi desenvolvido o Mestrado em Património. [RB] - Ele começou por um curso que dava acesso, a não sei o que... Aliás, ele nasce depois do Urbanismo. Eu acho que os desafios foram menos, do ponto de vista... Tem 4 fases. Do ponto de vista administrativo, é a redução drástica do Durão Barroso em 2004/2005. É o Domingos que apanha essa dificuldade, com o Madureira. O segundo grande desafio está a ser agora, no fim do Carlos Guimarães e no princípio do João Pedro Xavier. [GF] - Foi no período coincidente com a direção da Escola pelo Francisco Barata. [RB] - Com o Barata, a Escola deixou de ter autonomia financeira. Defendi sempre que devíamos ter um número de contribuinte próprio... Temos o número de contribuinte da Reitoria. Houve casos em que o dinheiro tinha ido parar à Faculdade de Medicina porque o contribuinte era o mesmo. Por acaso descobriu-se, mas porque eu mexi... Não faz sentido. A Faculdade de Engenharia tem números próprios. Isto implicava também ter um gestor próprio. Depois tivemos um gestor que veio tratar da contabilidade na passagem do choque de... Não há dinheiro, e não se arranja a Faculdade. Um gestor que veio se calhar a aumentar a tela do choque entre a passagem da contabilidade de mercearia para a contabilidade comercial. [GF] - Na altura do Carlos Guimarães a Faculdade foi reabilitada e pintada. [RB] - Sim, sim. [GF] - E agora mais recentemente? [RB] - Eu sou membro do Senado. Cada vez que vou ao Senado, tenho de ouvir o discurso do Reitor a dizer que não há dinheiro. Que o Governo tirou mais 10%, mais 1%, etc. No fundo, estão a dar à investigação e a tirar o ensino. Acabaram por tirar à investigação também. Aliás, o Reitor, na última sessão do Senado, disse: “Preparem-se todos para ter que ir a aulas partilhadas com outras Universidades. Você é especialista em quê? Teoria de Arquitetura? Põe-se ali na História da Arte. Não vai ser muito fácil, mas vai acontecer, vamos ter que começar a andar”. Depois dizia: “Olha, hoje vais dar aulas em Belas Artes, amanhã vai dar aulas a Ciências, conforme as tuas competências”. [GF] - Mas nos Planos de Estudos, teriam desenvolvido discussões, e não se identifica grandes alterações... Falava-se há bocado da minimização do Urbanismo... Mas a questão do tempo excessivo para terminar as provas finais constituía aspetos já identificados há algum tempo. [RB] - Acho que temos tentado discutir a questão, mas é muito difícil, porque há muitos interesses misturados, há muitas opiniões contraditórias, não há aliança. Eu sempre pergunto à Escola... O principal problema da Escola, neste momento, é que não há aliança. Foi-se embora o Portas, foi-se embora o Alexandre, o Domingos, encostaram-no à boxe. Começaram a dizer que o que ele escrevia não era completamente verdade. [GF] - O legado da História? O Domingos Tavares é impressionante, a obra que foi escrevendo. [RB] - É impressionante, não é? O Doutoramento... Porque é que quase não tem alunos portugueses? Para já só tenho 3. Eram 5, depois eram 4, agora são 3. Alguns dizem que estão a fazer o Doutoramento apenas para ir para a docência. Ninguém contrata ninguém que não tenha um Doutoramento. VI. [GF] - Tens estado no Conselho Pedagógico? Mas passaste por outros órgãos. [RB] - Em todos. Conselho Representante... Para já, a Mesa da Reunião Geral de Professores da Escola de Belas Artes, depois a Assembleia de Representantes da Faculdade. [GF] - Em que posições? [RB] - Vice-Presidente na Mesa da Reunião Geral de Pessoas da Escola de Belas Artes e estive como membro da Assembleia de Representantes da Faculdade durante bastantes anos. Depois fui Vice-Presidente - embora Presidente em exercício, porque o Domingos esteve doente, embora me ajudasse e colaborasse. Depois, foi para o Pedagógico em 2005, quando saiu o José Salgado. Eu era primeiro suplente e ocupei o lugar dele. [GF] - Enquanto a Annie Gunther era Presidente? [RB] - Sim. E eu fui para o lugar dele como membro. [GF] - Depois, em 2009-2012, és eleito para o C.P. e tornas-te Presidente do Conselho Pedagógico. [RB] - Sim, há 10 anos, por eleição. [GF] - A discussão dos Planos de Estudos é algo que tem sido feito pelas diversas direções. Promoveram-se algumas discussões. [RB] - A semana passada diziam: “Vocês andam a perseguir o PDA”. Esta é a imagem... E porquê? Porque o Conselho Pedagógico ouve os alunos. Houve uma altura em que eu fazia... [GF] - Referiste as práticas de “monotorização” pedagógica, que se continuam a fazer paralelamente aos “inquéritos” propriamente ditos. Mas agora, sobre o futuro. Falámos de direções, de eventos a nível científico, a nível pedagógico, falaste de pessoal. A 2 anos de te reformares, como planeias o futuro? [RB] - O futuro... [GF] - Sim. Já é noite, e estamos numa sala a olhar para o jardim do pavilhão Carlos Ramos. O que imaginas como o futuro científico e pedagógico deste meio? [RB] - Ainda tem, idealmente, Projeto. As Públicas têm o melhor processo de ensino. Há até, algumas parecidas, como o caso de Coimbra. Mas ainda batemos os pontos de todas as outras. [GF] - Sobretudo em Projeto, ou todas as áreas do Plano de Estudos? [RB] - Não, sobretudo em Projeto. As pessoas vêm para cá por algum motivo também. (Risos) Quem quer vir, eu penso que seja pela metodologia de ensino de Projeto. Em Milão, não tinha nada a ver. Sabem muito de História, pensam na história de maneira diferente. A Teoria anda mais ou menos a par com o nosso curso. O Politécnico de Milão, onde fui professor convidado entre 2014 e 2018, é a 10ª Escola nos Rankings do mundo. [GF] - Dizias que não estamos mal no campo de Teoria na Faculdade? [RB] - Nem a Teoria nem a História. História da Arquitetura Portuguesa é difícil, perdeu um grupo de interessados forte. [GF] - Rui, ficamos por aqui, a noite está a cair. Obrigado.

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