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9/9/25
CONVERSAS SOBRE A ESCOLA DO PORTO_Nº30_ Fernando Pimenta (com Gonçalo Furtado)
CONVERSA SOBRE ARQUITETURA PORTUGUESA E ESCOLA DO PORTO _ MAIO 2020
(Fernando Pimenta, com Gonçalo Furtado)./
I.
[Gonçalo Furtado] - Fernando Pimenta, em que ano nasceste?
[Fernando Pimenta] - Nasci em 1994. Vim para a Faculdade em 2012.
[GF] - Que posições ocupaste na Associação de Estudantes, ou em órgãos da Faculdade?
[FP] - Já no final do meu 2º ano fazia parte da lista dos estudantes para o Conselho de Representantes como suplente. Cargo que depois só ocupei quando voltei de Erasmus no 3º ano. Portanto, no 4º ano, é que entrei no Conselho de Representantes. Nesse mesmo ano letivo, portanto, em 2015/16, também fui eleito para a direção da Associação de Estudantes.
[GF] - Como coordenador do Departamento de Políticas Educativas da AEFAUP?
[FP] - No ano seguinte, já não era coordenador, mas continuava no Departamento.
[GF] - Passaste também pelo Conselho Pedagógico?
[FP] - Acho que foi nesse ano que entrei para o Conselho Pedagógico, onde estou ainda hoje.
[GF] - Estiveste 3 mandatos na Associação de Estudantes, até 2017.
[FP] - Foi em 2017 que deixei a Associação de Estudantes, porque já não fui eleito.
[GF] - Na prática, os anos que estiveste na Associação de Estudantes coincidiram com a direcção do professor Carlos Guimarães.
[FP] - Sim, praticamente. Aliás, quando entrei na Faculdade já era o Carlos Guimarães o diretor.
[GF] - Como é que recordas este período? Como estudante, e como instituição?
[FP] - É um bocadinho difícil dissociar ambas as coisas, porque foi tudo uma constante descoberta e também aprendizagem daquilo em que me “estava a meter”, digamos assim. E claro, quanto mais os anos passavam, mais desenvolvia de alguma forma o tipo de olhar que tinha em relação às coisas.
[GF] - A cada ano foi relativamente diferente.
[FP] - Quando entrei para o Conselho de Representantes, que coincidiu com a minha entrada na Associação de Estudantes, grande parte daquilo que eu tinha era uma motivação e entusiasmo. Por exercer este tipo de papéis e procurar exercê-los da melhor maneira possível, mas já com uma ideia do que seria necessário e que não seria fácil.
[GF] - Não seria fácil?
[FP] - De alguma forma, sendo estudante. Portanto, numa posição minoritária em quase todos os palcos institucionais. Quase como se houvesse uma espécie de constante contradição entre a grande vontade que tinha de pensar sobre o assunto, desenvolver as coisas, e tentar criar condições para que, enquanto estudante, outros estudantes pudessem também participar na vida ativa da Faculdade. Fui percebendo que isso seria cada vez mais difícil.
[GF] - Porque é que seria difícil a participação dos estudantes?
[FP] - Porque eram posições minoritárias. Digamos que cada vez mais me vou apercebendo que não dependia apenas do entusiasmo ou da vontade dos estudantes, para que eles realmente conseguissem fazer, influenciar, ou que algo acontecesse de acordo com o que pudessem pensar. E é um pouco neste equívoco que penso que se move grande parte daquilo que é o corpo estudantil que entra neste tipo de dinâmicas. Por várias razões. A razão talvez mais óbvia é, enquanto membro do Conselho de Representantes, a orgânica. 4 estudantes, e se não me engano, 12 professores e 1 representante dos funcionários.
[GF] - Alguma disparidade na composição de órgãos.
[FP] - Uma não paridade, digamos assim, da composição dos órgãos. Para além disso, também há a questão (que é da mesma natureza de questão) orgânica do funcionamento das instituições. Um carácter em determinado sentido pouco “democrático”, ou pelo menos, não representativo daquilo que é a comunidade. Por exemplo, o corpo diretivo ser constituído por um diretor e não um Presidente do Conselho Diretivo.
[GF] - Um diretor, que dirige um Conselho Executivo. Essa mudança de terminologia também tem algum significado?
[FP] - Sim. E para além disto, em paralelo, a questão de o pensamento do estudante estar à partida em causa precisamente por ser estudante. É alguém que está de alguma forma a prazo na instituição e também portanto não logra da mesma autoridade que um professor tem naturalmente nos órgãos de gestão. Quase como se fosse uma mistura entre as autoridades científica, pedagógica e política.
[GF] - Nesse momento a direção não era ainda assegurada pelo professor João Pedro Xavier? Recordas alguma diferença entre as duas direções, ou que caracterize esses períodos?
[FP] - Houve a reabilitação da Faculdade...
[GF] - Que outros eventos ocorreram?
[FP] - Bom, penso que eu entrei nestas dinâmicas num período relativamente dinâmico e agitado.
[GF] - Foi o período em que, por exemplo, se discutiu a revisão do Plano de Estudos.
[FP] - A tentativa de revisão do Plano de Estudos. E acho que esse foi realmente o momento mais marcante. Agora olhando para trás, depois desses momentos de debate e discussão do Plano de Estudos e depois da decisão do Conselho Científico de suspender, por tempo indeterminado, essa revisão... Deixou de haver realmente na minha perceção grandes assuntos de debate. Ou pelo menos, uma perspetiva de consideração comum na Escola, em palco aberto.
[GF] - Um projecto?
[FP] - Depois, claro, eu estive presente – como público – já não me lembro como é que se chama precisamente esse momento… No momento em que o João Pedro Xavier, como candidato a diretor, fez uma espécie de audiência pública.
[GF] - Quando são colocadas questões pelo Conselho de Representantes?
[FP] - Do qual eu já não fazia parte. Aí fui-me apercebendo do que é que pudesse significar a mudança do Carlos Guimarães para o João Pedro Xavier. E desde então, era assumido que se ia relançar esse debate em torno do Plano de Estudos.
[GF] - Integrou o Plano de atividades.
[FP] - E fez parte das declarações do professor João Pedro Xavier na sua candidatura./
Tenho reparado também numa diferença em relação ao mandato do Carlos Guimarães. O professor João Pedro Xavier, acredito, assegurou logo à partida nesses processos todos, – na definição de horários, mapa de instalações… – um eventual processo de revisão do Plano de Estudos.
[GF] - Haverá uma espécie de comissão reduzida, dessa fazendo parte a Associação de Estudantes.
[FP] - Eu por acaso então não estive presente, porque na altura não estava no Porto, mas acho que foi em outubro ou novembro que houve uma espécie de “debate zero” sobre isto.
[GF] - Sobre um relançamento da discussão do Plano de Estudos?
[FP] - Acredito que agora por causa também da pandemia a coisa tenha ficado ainda mais em suspenso, mas penso que essa é uma diferença estratégica que o professor João Pedro Xavier está a tomar.
[GF] - O que é que quer dizer a expressão “diferença estratégica”?
[FP] - Sempre que vejo que está aberta a participação de um representante dos estudantes numa espécie de comissão, composta, por exemplo, com mais elementos do Conselho Executivo, e depois eventualmente alguém do Conselho Pedagógico... Como foi o caso da Comissão dos Horários e Instalações. Até já tenho alertado para isso nas Assembleias Gerais quando as houve, e também foi a minha posição no Conselho Pedagógico.
[GF] - O quê?
[FP] - Esse tipo de participações acaba por significar não tanto uma abertura da discussão, mas um comprometimento à partida dos representantes nas decisões que iam ser tomadas, independentemente desses representantes concordarem ou não. Portanto, claro, acho que é talvez ingénuo da parte dos estudantes que alinham sem reservas neste tipo de dinâmicas de decisões que tendem a ser à porta fechada. Implicam um comprometimento pela pessoa daquilo que é a estrutura inteira que representam. Acredito que, se calhar, o processo de revisão de Plano de Estudos, que arrancará brevemente, tomará os mesmos moldes, que tornarão mais difícil de alguma forma a tomada de posições contrárias ou complementares em relação aos assuntos que estão a ser debatidos.
[GF] - E opinas uma diferença em relação a…?
[FP] - Sim, apesar de, em alguns momentos muito pontuais, o anterior director da escola ter feito reuniões.
Lembro-me, por exemplo, de uma reunião lá em setembro ou junho, nem sei se foi no início ou se foi no fim do verão de 2016. Uma reunião com representantes da Associação de Estudantes, os membros estudantes do Conselho Pedagógico, sobre as possibilidades de um novo Plano de Estudos.
[GF] - Que ideias poderiam ter para um novo Plano de Estudos?
[FP] - Mas, na verdade, aquilo que depois aconteceu foi que efetivamente em outubro foi enviado à Associação de Estudantes um Excel, um simples Excel, que era a proposta de novo Plano de Estudos. De facto, é diferente ter de alguma forma os estudantes representados, numa comissão que trata o assunto, e que depois dentro dessa comissão acaba-se por estar comprometido. Na minha opinião, o anterior director da FAUP, colocando os estudantes de fora, possibilitou que depois acontecesse o que aconteceu. Que foi uma tomada de posição, neste caso da Associação de Estudantes, que possibilitou que pelo menos houvesse plenários abertos de Escola.
[GF] - Plenários para debate.
[FP] - E que acabou a ter como consequência a suspensão, por tempo indeterminado, da revisão.
[GF] - Houve contrapropostas pela Associação de Estudantes nesse debate, interno?
[FP] - Sim. Era um trabalho sempre conjunto. Mas foram, de facto, tempos agitados. Não considero que aquilo que surgiu por parte dos estudantes fosse uma contraproposta, apesar de o parecer. Sempre foi dito que não era uma contraproposta, mas estive envolvido nisso com outros colegas.
[GF] - Quem eram os colegas?
[FP] - Bom, na altura era um grupo alargado.
[GF] - Foi por livre iniciativa, ou pela Associação de Estudantes?
[FP] - Era um grupo de colegas, muitos deles que pertenciam à Associação dos Estudantes e outros que eram membros de outros órgãos de gestão da Faculdade, como o Conselho Pedagógico e o Conselho de Representantes. Mas também incluiu estudantes interessados, que não pertenciam a nada disso. Como interessados, muito e bem participavam nesta discussão. Lembro-me, por exemplo, claro, da Presidente da Associação dos Estudantes de então, que era a Beatriz Saraiva.
[GF] - Houve muitos Presidentes da AEFAUP durante a tua passagem pela Associação de Estudantes?
[FP] - Eu fiz parte de 3 direções da Associação dos Estudantes, portanto três Presidentes diferentes. A primeira foi a Marta Moreira, e depois a Beatriz Saraiva.
[GF] - E depois da Beatriz Saraiva foi a Bárbara Miranda?
[FP] - Exatamente. Estive dois mandatos inteiros na Associação dos Estudantes. Era suplente na direção anterior, mas só entrei quando voltei do Erasmus, que foi a da Marta Moreira.
[GF] - A seguir foi? A Daniela Guerra?
[FP] - Depois da Bárbara Miranda foi a Daniela Guerra.
[GF] - Depois a Sara Rodrigues e, atualmente, é a Beatriz Rosendo. Mas durante os teus ano de curso, houve tantos Presidentes? Todos os anos muda de Presidente?
[FP] - Sim, os mandatos são anuais.
[GF] - Como é que tu vês os períodos coincidentes com estas direções?
[FP] - Foi muito intenso.
[GF] - Há eventos que tenham sido importantes em cada uma?
[FP] - Esta questão do Plano de Estudos despertou para mim e para um conjunto de pessoas a noção que a própria presidência da Associação de Estudantes não está necessariamente alinhada com aquilo que é, digamos assim, a generalidade dos estudantes mais “agitadores”.
[GF] - Alunos que pretendem promover determinados processos ou, em assembleias abertas, propor alterar alguma coisa?
[FP] - Mesmo durante a dinâmica, ou durante o processo de revisão do Plano de Estudos, durante várias vezes foi difícil. Lembro-me de ter connosco a própria Presidente da Associação de Estudantes. Coisa que na altura causava algumas dores de cabeça e era complicado gerir, porque depois, a certa altura em Assembleias Gerais, decidia-se que a Associação de Estudantes tinha determinado tipo de posição. Aquilo que foram as posições da Associação de Estudantes durante a revisão do Plano de Estudos, foram decisões que saíam de Assembleias Gerais e não diretamente da direção.
[GF] - Se dependesse só da presidência, se calhar algumas coisas não teriam acontecido?
[FP] - Muitas declarações não teriam sido feitas, se calhar nem o abaixo-assinado que se realizou teria acontecido. Ou Nem se calhar aquele cordão humano teria acontecido, se dependesse da direção da Associação de Estudantes. Isto para dizer que é relativamente normal, e também fruto das direções mudarem de ano a ano.
[GF] - Quem vem de novo está a re-descobrir coisas.
[FP] - Como podem funcionar, quais são os espaços de manobra, qual é no fundo a distância que vai entre a ideia que se tem e as condições para fazer aquilo que se pensa que se quer fazer. E sendo isso uma aprendizagem que parte quase do zero todos os anos, é difícil contar com uma continuidade na Associação de Estudantes para uma posição construída e amadurecida acerca de muitos assuntos.
[GF] - Não há hábito de diálogo com colegas anteriores?
[FP] - E de facto é verdade que quando foi este processo de revisão de Planos estudos em 2016, muitos dos estudantes que eram grande motor de discussão e debate foram estudantes que até já estavam envolvidos e tinham organizado a Quinzena 15, no ano anterior, em 2015. Falo da Beatriz Merouço, por exemplo, da Marta Nogueira, ou da Ana Fontainhas. A Marta Nogueira e a Ana Fontainhas são ainda do ano anterior ao meu, ou dois anos antes de mim. E depois, o Diogo Rodrigues, que ainda é membro do Conselho de Representantes, e que era o Presidente da Assembleia Geral durante este período.
[GF] - Beatriz Merouço, Marta Nogueira, Ana Fontainhas e o Diogo Rodrigues.
[FP] - E mais gente…
[GF] - Quem participou nessa Quinzena’15?
[FP] - A própria Marta Moreira, que era a Presidente da Associação de Estudantes durante a Quinzena’15. Eu ia acompanhando à distância, porque na altura estava de Erasmus. De estudantes mais novos lembro-me do Ricardo Naldinho, que na altura estava no 1º ano. E até mesmo estudantes que, entretanto, já acabaram os estudos há algum tempo, como o Nuno Reis Pereira, que também ia participando um pouco nisso.
[GF] - Era um conjunto alargado de pessoas? Durante o período da Quinzena’15 tu estavas em Erasmus?
[FP] - Durante a Quinzena’15, eu estava em Munique de Erasmus.
[GF] - Penso que no geral consistiu numa série de plenários, referentes a temáticas diversas, dos quais resultaria uma série de ideias “reivindicativas” no concernente a tais temáticas. Seja a orgânica da Faculdade e órgãos de gestão, seja a relação da Escola com a cidade ou com a profissão, etc.
[FP] - E tudo culminou depois numa Assembleia Geral de Estudantes, na qual votaram a proposta. Da proposta resultou um livreto, que tinha o que era cada uma das propostas e depois o resultado das votações.
[GF] - Condensaram o resultado das votações pelos estudantes num livreto.
Falando dessa Quinzena’15, como é que os alunos entraram nesse processo?
[FP] - A Quinzena’15 aconteceu como consequência de uma jornada pedagógica que foi organizada pelos que eram, então, estudantes do Conselho Pedagógico. E isto porque se sabia que estaria em curso e queria ser disputada esta revisão do Plano de Estudos.
[GF] - Foi uma tentativa de antecipação dos estudantes a qualquer tipo de proposta que, entretanto, aparecesse por parte do Conselho Científico?
[FP] - Ou do corpo docente em geral. A tentativa de criar condições de discussão aberta e partilhada sobre o assunto./
II.
[GF] - Terá surgido uma proposta por parte dos órgãos competentes da escola?
[FP] - Em 2016, o que aconteceu foi que efetivamente chegou essa proposta algo fechada de revisão do Plano de Estudos. Foi a partir daí que se deu início ao processo de tentativa de discussão pública do documento.
[GF] - Correspondia ao Excel referido antes?
[FP] - Era um Excel sem mais nada. Portanto, aquilo que sabíamos era apenas uma folha de Excel, que era a proposta do Conselho Científico para revisão do Plano de Estudos. Como sabemos, as atas dos órgãos de gestão não são sempre muito explicativas./ Aliás, na minha opinião, por vezes parecem memorandos que, por exemplo, dizem “Continuação da discussão do plano de Estudos”, ponto final. E não se sabe realmente o que é que se continuou a discutir, ou o que é que estava em causa.
[GF] - Como é que…
[FP] - Como é que o estudante vai ver o que é que é um tempo de contacto, quando recebe um Excel?
[GF] - Como é que se passa daí, a vocês apresentarem uma “contraproposta”?
[FP] - Foi muito complicado.
[GF] - Até porque não tinham que o fazer...
[FP] - Exatamente. Portanto, a questão é, legalmente, o que está escrito é que o novo Plano de Estudos é aprovado com consulta, com parecer, do Conselho Pedagógico e das Associações de Estudantes. O grande problema, que motivou o escalar das medidas de luta, foi o receio de que bastava um parecer.
[GF] - Independentemente do que dissesse o parecer da Associação de Estudantes, estes pensavam que a proposta avançaria?
[FP] - A proposta de revisão do Plano de Estudos compreendia essencialmente dois problemas, e foram estes dois problemas que nós de alguma forma lidámos. O primeiro era o problema que estive a falar até agora, que é o problema da falta de consulta e da falta de discussão aberta sobre o assunto. Portanto, era impossível ter uma tomada de posição informada sobre um documento difícil de descodificar. Nele percebiam-se ideias em relação às quais – e este é o segundo problema – éramos contrários, como, por exemplo, a geral supressão das unidades curriculares de Teoria, ou a mudança também no entendimento da organização das Histórias. E até dos diferentes pesos que as Histórias teriam, o peso que o Projeto passaria a ter, etc., Mas, era essencialmente a questão da Teoria que nos preocupava. E, portanto, a primeira preocupação da nossa parte, foi tentar parar isto.
[GF] - Mas… Tentar parar um processo?
[FP] - Já que escrever simplesmente um parecer, alertar para isto e dizer que somos contra não ia mudar nada. E o que fizemos foi um abaixo-assinado que, em praticamente 24 horas, pouco mais de 24 horas, recolheu 614 assinaturas. Foi um esforço muito grande, foi mesmo...
[GF] - Onde é que está esse abaixo-assinado?
[FP] - Foi entregue no serviço de expediente da secretaria, se não me engano.
[GF] - E o que é que era esse abaixo-assinado?
[FP] - Era um abaixo-assinado que exigia a suspensão imediata do processo de revisão do Planos de Estudos, resposta do Conselho Científico e reivindicação de que existisse uma abertura de discussão aberta a toda a gente.
[GF] - Queres dizer uma discussão aberta a toda a gente da proposta de Planos de estudos?
[FP] - E exigíamos que o Conselho Científico respondesse até às 18 horas do “dia x” (não me recordo com rigor qual), senão agravaríamos as formas de luta. Além do abaixo-assinado, espalhámos precisamente esta mensagem sobre a forma de cartazes por vários espaços da Faculdade. E por acaso coincidiu com o lançamento de um livro relacionado com Rabo de Peixe. Sei que estava lá o Siza e uma série de convidados. E o que foi muito interessante, e se calhar até teve mais força isso do que realmente o abaixo-assinado, é que toda a gente entrou na Faculdade e viu que afinal o ambiente não era completamente pacífico para todos.
[GF] - Porque olharam para os cartazes?
[FP] - Sim, que estavam por todo o lado, e a exigir que o Conselho Científico respondesse dentro de um prazo, senão os estudantes agravariam as formas de luta. Causou tanto impacto que, pouco tempo depois de colocarmos os cartazes, que coincidiu com o lançamento desse livro, o então director da escola veio ter comigo. E por acaso eu estava com a Presidente da Associação de Estudantes, a Beatriz, e reunimos os três lá no seu gabinete. Foi nessa reunião curta, mesmo antes do lançamento do livro, que conseguimos negociar com o então director da escola a série de plenários que acabaram por acontecer em novembro. Eu tenho ainda as cartas que fomos escrevendo para o Conselho Científico com todas estas exigências.
[GF] - No website da Associação de estudantes constam as coisas relativas à tal Quinzena’15?
[FP] - Sim. As respostas, as percentagens, etc. Mas ainda deve estar. Entretanto, quanto mais tempo passa, mais provável se torna estas memórias apagarem-se. Quem entra de novo na Associação de Estudantes – o que é natural – tem menos contacto com estas coisas, ganha mais distância. E parece que, entretanto, a Faculdade já é outra coisa e não tem nada a ver com este período./
Mas ia dizer que foi interessante, nessa reunião com o então director da escola, que nos perguntou o que é que nós queríamos. Atrevo-me a dizer que parecia mesmo uma negociação quase sindical. E pronto, fomos claros, “Queremos que haja diálogo entre o Conselho Científico, a direção da Escola e os estudantes, de forma que haja pelo menos uma base comum de entendimento e pensamento sobre a proposta de revisão de Planos de Estudos”. A primeira proposta por parte do então director da escola foi: “Então vamos fazer uma sessão de esclarecimento em que posso eu e o diretor de curso do MIArq, explicar a quem quiser aparecer, a proposta que foi feita”. Na altura, o diretor do MIArq era o que antecedeu a actual.
[GF] - Dizes que a primeira ideia tinha em vista o esclarecimento da proposta do Plano de Estudos?
[FP] - Mas o nosso contra-argumento é que isso não é realmente um diálogo, isso é um monólogo. Interessa isso, sim, mas também interessa o que virá depois. Depois, o então director da escola começou a divagar sobre o que seria um diálogo, etc.
[GF] - Da conversa resultou que aconteceria uma sessão de esclarecimento da proposta. E depois?
[FP] - E depois 2 ou 3 sessões abertas, plenários, moderados pelos estudantes. Neste caso, foram moderados pela Beatriz, que era a presidente da Associação de Estudantes, por mim, e pelo Luís Pinto, que na altura estava comigo no Departamento de Políticas Educativas. E chamámos ao conjunto destes momentos o “diálogo”, uma espécie de resposta. Chamámos Diálogo ao conjunto destes plenários.
[GF] - Era estruturado no formato de um conjunto de plenários, o que se entendia como diálogo?
[FP] - Sim, como diálogo, que é muito mais que mero esclarecimento.
[GF] - Os moderadores eram a Beatriz Saraiva, o Luís Pinto, e tu. Como é que tu recordas estes colegas? Com saudade?
[FP] - Sim, sim.
[GF] - Fizeste referência, à Quinzena’15, a um abaixo-assinado, a uma “reunião”, e aos “Diálogos”. Foi então possível dialogar…
[FP] - Dialogar? Foi, foi quase… Em primeiro lugar, a preparação dos diálogos, do Diálogo também não foi nada fácil. Primeiro foi complicado aprender a linguagem, os termos como “tempos de contacto”, “tempos de estudo”, o que é que significa “acreditação”, como é que isso se calcula, o que é que está em causa no Plano de Estudos, etc. E depois a certa altura em muitas das discussões que tínhamos, por exemplo, com o então director da escola e com o então diretor do MIArq, muitas vezes alertávamos para um determinado conjunto de situações e respondiam: “Mas isso não é uma só uma questão do Plano de Estudos, isso é também uma questão de práticas pedagógicas”.
[GF] - Inseriram-se no jogo linguístico usando a terminologia envolvida no proposta do Plano de Estudos, que estava no Excel?
[FP] - Sim, também. Exatamente.
[GF] - Podia ser difícil perceber que a organização dos espaços/tempos didático-pedagógicos não deixa de expressar uma hierarquia, a distribuição das horas de contacto, com possibilidade de acreditação etc.
[FP] - Tudo isso há de significar que há coisas que interessam mais do que outras. E, efetivamente, tudo isso depois há de condicionar todo um conjunto de práticas pedagógicas, como, por exemplo, se os trabalhos são de grupo ou individuais. Se a relação dos professores com o estudante é numa base de atendimento ou se é algo mais do que isso, etc.
[GF] - Algumas coisas podem ser definidas/condicionadas pelos dados que estão lançados num Plano de Estudos.
[FP] - Chegar a este ponto de raciocínio foi, de facto, muito complicado e fez parte também da complicação tentar desmistificar muitas das justificações que, entretanto, eram dadas para justificar as opções pensadas. Por exemplo, lembro-me de o diretor do MIArq argumentar que, se o número de horas de contacto destinadas a unidades curriculares que não são Projeto for superior a x, o curso não é creditado. Então lá fomos nós, até me lembro de imprimir todo o regulamento de creditação dos cursos de arquitetura por parte do RIBA.
[GF] - Royal Institute of British Architecture?
[FP] - E de tentar descobrir como é que essas coisas funcionavam. Tentar perceber se era realmente assim. De alguma forma foi também o momento em que, pelo menos quem estava por dentro deste processo e a tentar mexer nestas coisas, começou a ganhar também algum ceticismo, em relação a algumas coisas. Algumas das coisas que eram ditas por parte de quem exercia o poder de direcção na Escola. Seja na direção, seja no Conselho Executivo, seja na direção de curso.
[GF] - Porque dizes que se começou a desenvolver algum ceticismo relativamente a algumas coisas? À medida que iam estudando a terminologia? Porquê?
[FP] - Acho que aconteceu principalmente por causa da alguma opacidade do processo. E depois da constante tentativa de recodificação das questões, de alguma forma preferindo explicar através do argumento mais complexo sobre o qual não seria possível haver muita discussão, como no exemplo que dei acerca da creditação do curso.
[GF] - Mas achavam que aquilo podia ser visto de outra forma?
[FP] - O que estou a dizer é que quanto mais se tentava debater sobre o assunto, mais se percecionavam eventualmente razões por detrás das opções tomadas no Conselho Científico. Na nossa opinião, iam-se percecionando, também se calhar, relações assimétricas de poder e relacionais entre professores que eventualmente deram fruto àquele Excel. Acho que uma ou a principal descoberta, possibilitada por este processo, foi descobrirmos mais ou menos como é que seriam as relações entre os professores, e como aquilo que é o projeto científico e político de Faculdade acaba, na nossa opinião, por ser também fruto dessas relações.
[GF] - Dizes relações assimétricas?
[FP] - Por exemplo, lembro-me que na altura, entretanto, também fomos tendo conhecimento, ainda que superficialmente, do que foram algumas das discussões entre alguns dos professores na preparação desta proposta de Plano de Estudos. Por exemplo, das reuniões gerais de professores, que foram em fevereiro, uma delas em fevereiro de 2016, se não me engano. Há até um rascunho do Manuel Mendes, que nos foi feito chegar do que seria até o entendimento dele do que é que pudesse ser um Plano de Estudos. Também sei que houve uma proposta...
[GF] – E, “foi feito chegar”, em que sentido?
[FP] - Ele há de ter sido, mas não me lembro se foi pessoalmente ou se institucionalmente.
[GF] - Não havia coincidências entre essa proposta e a vossa?
[FP] - Não, não. Infelizmente, penso eu agora. Também fomos sabendo que tinha havido uma proposta do Luís Viegas, isto sim, mais institucionalmente, porque a proposta do Luís Viegas chegou ao Conselho Pedagógico, do qual faziam parte 4 estudantes. Um deles mais uma vez a Beatriz Merouço. Depois durante os plenários do Diálogo tornou-se muito claro que havia talvez mais coisas em causa no debate do que propriamente o Plano de Estudos. Houve uma espécie de manifestação geral de um certo desconforto na Escola durante esses plenários.
[GF] - O que é que recordas desses plenários? Retiveste alguma intervenção?
[FP] - Lembro-me das longas intervenções do Manuel Mendes, lembro-me de uma intervenção certeiríssima por parte do Pedro Bismarck, lembro-me também de algumas intervenções do Vítor Silva e de uma intervenção da Marta Oliveira. Também me recordo muito bem dos discursos e posições de professores como o Carlos Guimarães, o José Miguel Rodrigues, o Carlos Prata, a Joana Couceiro, que na altura também chegou a intervir. E intervieram também muitos estudantes. O Daniel Sá, o Nuno Sarmento, o Ricardo Naldinho, o Francisco Craveiro, etc. Na altura, lembro-me de pensar que me suscitava receio isto tudo, enquanto estudante, que de vez em quando parecia que qualquer pergunta que fosse colocada poderia ser complicada, e que aquilo que pudéssemos dizer poderia de alguma forma comprometer as possibilidades de uma tomada de posição, ou possibilidades de debate.
[GF] - Foi uma altura...
[FP] - Séria. Lembro-me, por exemplo, que…
[GF] - Onde é que vocês trabalhavam? Era lá na Associação de Estudantes? Ou era em vossas casas?
[FP] - Na AEFAUP, e em salas de Projeto. Ou no bar. Em casa não costumava ser, não. Era sempre na Faculdade que fazíamos isto, as discussões, os debates e as preparações do que depois viriam a ser os plenários.
[GF] - E usavam a sala da AE, etc.?
[FP] - Nós enquanto estudantes, felizmente, sempre pudemos reunir onde quer que fosse na Faculdade. Costumávamos reunir principalmente na sala da AEFAUP, mas também noutros espaços. Qualquer estudante pode requisitar a Sala Plana para aquilo que lhe convém. Pelo menos até ao final do mandato do Carlos Guimarães e talvez depois.
[GF] - Que outras participações dos professores recordarias, naquilo que foram os plenários?
[FP] - Foram em primeiro lugar os professores aos quais de facto a proposta dizia respeito, a que o Excel dizia respeito.
[GF] - Ou seja, participaram bastante nos plenários?
[FP] - Sim, participaram sim. Eu lembro-me até muito bem da sua intervenção nos plenários.
[GF] - Até porque escrevi sobre a análise da Quinzena’15, depois destas reuniões dos professores. Os plenários não deixaram de constituir uma lição da democracia.
[FP] - Digamos assim, ou aos órgãos de gestão.
[GF] - Houve esforço pelos estudantes para chamar os professores a participar nesses tais plenários?
[FP] - Nós preparámos um envelope com uma espécie de convite ou apelo à participação que entregámos a todos os professores. E também fizemos comunicações ao CC, apelando também à participação nestes debates.
[GF] - Muitos professores participaram.
[FP] - Sim, sim.
[GF] - E o professor Francisco Barata, que era o Presidente do CC na altura, apareceu nos debates.
[FP] - Nós até éramos relativamente ousados nesta tentativa de apelo à participação. Uma das comunicações que fizemos ao CC, foi decidida em Assembleia Geral. Fizemos um cordão humano que saía do Salão Nobre até onde desse, e chegou quase até ao cubo. E na ponta do cordão humano, portanto na porta do Salão Nobre, estaria eu e Luís Pinto com a carta dirigida ao CC. E entregávamos em mão ao Francisco Barata mesmo antes do início da reunião do CC. Não queríamos que estas correspondências ficassem perdidas nos expedientes, ou então que simplesmente nem se fizesse referência a elas nas atas ou nos relatórios, etc., que esta foi uma das maneiras que arranjámos, de garantir que realmente...
[GF] - Que estavam a entregar convite?
[FP] - Pois, exatamente.
[GF] - E era em nome de todos?
[FP] - Exatamente. Também uma garantia de que aquela carta era lida naquela reunião do Conselho Científico.
[GF] - Como recordas o professor Barata?
[FP] - O Francisco Barata sempre foi muito cordial e atento. Recordo-o com bastante carinho. Era o Presidente do CC. Portanto, faria sentido estar alinhado com a direção da faculdade e do curso.
[GF] - Ah
[FP] - Para mim, é de certa forma um mistério. Do pouco que eu pude conhecer do Francisco Barata, parte de mim duvidou que ele concordasse com aquela proposta de revisão de Planos de estudos que saiu do CC. Depois, durante o processo com os debates, enquanto estudantes, fui intuindo que também não era um assunto tão fácil para o próprio professor Francisco Barata. Apercebi-me que se calhar ele não estaria cabalmente de acordo com o teor daquela proposta de revisão. Mas por outro lado estava comprometido, porque era então o Presidente do CC. E também percebemos que o corpo docente é pequeno, ou pelo menos o meio humano dentro do qual se tomam as maioria das decisões historicamente dentro da Faculdade, também é muito pequeno./
III.
[GF] - O que recordas de outros professores ou diretores durante o processo?
[FP] - Foi surpreendente. Ao contrário do Carlos Guimarães, que nunca tinha sido o meu professor, apenas o professor regente de Projeto 4, mas sem ter uma turma atribuída. Portanto, o contacto que tínhamos tido com ele era apenas as aulas teóricas que ele dava. Já o José Miguel Rodrigues não, fora um professor mais presente.
[GF] - Conheciam com relativa proximidade, pela disciplina de História da Arquitetura Moderna no 2º ano.
[FP] - Foi, digamos, uma surpresa para mim, e para vários dos meus colegas, perceber de alguma forma a diferença que poderá haver entre a postura no desempenho das funções docentes – no caso, um professor brilhante… Mas depois ao mesmo tempo ser o diretor de curso que por vezes parecia incomodado por achar que este documento do Plano de Estudos estava a ser discutido de uma forma que não deveria ser. E que os estudantes terem conhecimento de determinados documentos poderia eventualmente expressar uma certa quebra de sigilo. Portanto, foi difícil.
[GF] - O documento não ia então para outros Conselhos?
[FP] - Enquanto não estivesse terminado, não. Nós íamos tendo noção, mais ou menos, que a discussão estaria a acontecer, e que, entretanto, ia aparecer algo em setembro. Mas não o tínhamos, nem imaginávamos o conteúdo.
[GF] - Atualmente a diretora do MIArq é a professora Raquel Paulino. E o professor João Pedro Xavier atualmente assegura a direção da escola. Com vários outros professores vocês se calhar já não tinham tido uma relação prévia?
[FP] - A Raquel Paulino foi minha professora na optativa de Processos de Transformação de Ensino e Aprendizagem, há dois anos.
[GF] - Disciplina optativa co-regida com o professor Mário Mesquita. Essa continua?
[FP] - Sim. Se calhar agora que é diretora de curso, não sei se a Raquel Paulino trabalhou este ano com o Mário Mesquita. Mas nos outros 2 anteriores, sim.
[GF] - A experiência de frequentar a disciplina, como foi? E também estiveste no Conselho Pedagógico?
[FP] - Ensinaram-me bastante. Sim./
Quando eu entrei no Conselho Pedagógico era o Rui Braz o Presidente, e a Vice-Presidente estava o José Manuel Soares, de Projeto do 1º ano.
[GF] - Agora está nesse órgão o professor Luís Viegas e também o professor José Maria Lopes.
[FP] - Estava o Viegas e também o José Maria Lopes, sim.
[GF] - Integra ainda outros professores que já falámos, como o Mário Mesquita e o José Miguel Rodrigues. O professor Luís Viegas atua atualmente no Conselho Pedagógico como Vice-Presidente.
[FP] - Sim, ele é o Vice-Presidente do Conselho Pedagógico. Saiu o José Manuel Soares e o José Maria Lopes e entraram o Mário Mesquita e o José Miguel Rodrigues para o Conselho Pedagógico.
[GF] - Uma das ocorrências relevantes nos últimos tempos, foi a reabilitação da Faculdade. É importante que tenha acontecido.
[FP] - Sem dúvida.
O pavilhão Carlos Ramos esteve fechado para obras, mas depois as obras nunca mais começavam durante cerca de dois anos.
[GF] - Demorou um pouquinho para as obras começarem, por razões naturais, acho que decorrentes do processo de acesso a fundos públicos e de autorizações de obras em património, etc.
[FP] - Mas houve um episódio muito engraçado... O Pavilhão Carlos Ramos fechou em setembro de 2016, e em fevereiro foi o lançamento da coleção Primavera-Verão da ZIPPI, lá. Poucos meses depois. E para alguns foi estranho ver aquilo.
[GF] - Manifestaram a estranheza?
[FP] - Manifestações? Uns mais irreverentes do que outros, de protesto em relação àquilo. Nesse momento, eu acho que a forma de luta foi o humor. Depois até foi interessante como... A única coisa que eu fiz, realmente, foi um texto que dizia: “O Pavilhão Carlos Ramos fechou em setembro de 2016. Não há espaço para fazer maquetes, não há espaço para ter aulas, não há espaço para os estudantes todos, não há espaço para as dissertações, etc.”, e depois terminava com: “Mas há espaço para a ZIPPI”. E imprimi uma centena desses papéis e espalhei por todo o lado na Faculdade. Dei a cara nesse momento, porque foi em plena luz do dia que espalhei esses papéis. Quanto a tudo o resto que aconteceu, eu era imediatamente associado, mesmo sem ter feito mais nada...
[GF] - Referes-te a aparecerem, acho, montagens na Internet, ou pichagens de muros, etc.?
[FP] - Sim. Eu tenho uma fotografia de uma, mas não me recordo quando é que... Já não sei exatamente a data. No momento da revisão do Planos de estudos houve duas pinturas na Faculdade.
[GF] - Mas isto não tinha nada a ver contigo ou com os estudantes que discutiam a escola?
[FP] - Não. E ainda hoje não sei, de facto, quem foi que pintou. Agora... Arquei, de alguma forma, com culpas por causa disso. Eu não me importo. Lembro-me de um dia de manhã, em que cheguei à Faculdade, e estava uma delas acabadinha de pintar. Ouvi logo o Sr. João, em tom de brincadeira: “Já viste o que andas a fazer?”
[GF] - Elas acabavam por ser variações da famosa frase – “Já não há romance nesta Escola”?
[FP] - Aliás, acho que houve três pinturas.
[GF] - Uma foi durante a tal “Quinzena’15”.
[FP] - Sim. Eu não estava cá, estava em Erasmus. Dizia esse slogan conhecido, “Não há romance nesta Escola”. Depois, em 2016, quando começou o debate, ou se calhar foi mesmo no início do ano letivo. Pintou-se “Já não há Escola neste romance”.
[GF] - E não houve uma outra frase?
[FP] - Sim. Que dizia: “Quando as paredes falam, há gente que grita”. Assim uma coisa./
E também já não me lembro muito bem se esta foi a segunda, ou se foi ao contrário./
Já não me lembro muito bem da ordem. Aliás, essa foi apagada com relativa rapidez. Portanto, acho que essa foi a segunda. A terceira ficou lá bastante tempo, até os trabalhadores pintarem a torre de novo.
[GF] – Despoletou algumas queixas?
[FP] - Não, que eu saiba não. Mas, de facto, essas pinturas foram usadas de alguma forma contra a Associação dos Estudantes e contra os estudantes interessados em ter algo a dizer nestes processos que dizem respeito a todos, não é? Do género: “Já viram o que vocês fazem, quer dizer... O tipo de gente com que se está a lidar? O processo não está a ser totalmente bem feito, que é preciso haver discussão, mas nada justifica a agressão ao edifício”. Como se tivéssemos sido nós a escrever aquilo na parede./
IV.
[GF] - Fala-me da tua experiência – para lá desses processos – como estudante. Das matérias e professores que te marcaram, etc. E da tua opinião em geral da...
[FP] - Uma coisa é a opinião pessoal, outra coisa é a ideia que tenho do que é que são as matérias, os protagonistas.
[GF] - Já não tiveste aulas com professores como o arquitecto Fernando Távora, mas de certeza que reconheces a relevância de muitas matérias bem como de muitas personagens.
[FP] - Sim, claro. Eu acho que uma figura incontornável é o Manuel Mendes. A única coisa que me arrependo, de ter feito Erasmus no 3º ano, foi que de facto não fiz Teoria 2. Ele é uma figura incontornável.
[GF] - Depois também frequentaste a disciplina optativa que lecionou - Arquitetura, Circunstância e Manifesto.
[FP] - Sim. E fui conhecendo também os textos dele, a ideia que eventualmente ele teria da Escola, de Projeto, etc., seguramente. É engraçado como de alguma forma nunca tive muitas dificuldades em nenhuma unidade curricular. Sempre acho que fui um relativo bom aluno. Tive depois dificuldades para essa optativa e para Construção e Sistemas Estruturais no 4º ano...
[GF] - Mas perguntando quem te marcou, pensas no Manuel Mendes e…?
[FP] - Se me perguntarem professores que nos marcam, penso de um lado no Manuel Mendes, mas por outro penso em pessoas que marcaram de outras formas. Por exemplo, lembro-me que fui aluno da Graça Correia.
[GF] - Foste aluno da professora Graça Correia em Projeto 4, em 2015/16.
[FP] - Foi depois no final desse ano que começou aquela confusão toda dos Planos de estudo. Mas com a Graça Correia eu lembro-me de uma vez estar com ela a debater, na medida das minhas possibilidades. Ainda não tinha pensado muito bem sobre os assuntos, mas sobre o quanto me parecia estranho os estágios poderem não ser remunerados.
[GF] - Dizes que debatiam a pertinência dos estágios.
[FP] - Depois ela argumenta, se percebi bem, que nós queremos tudo feito quando saímos do curso. Isto, referindo-se à sua experiência enquanto estagiária no Souto de Moura. Portanto, como demonstração deste lado também corporativo da Escola, digamos. Este lado que de certa forma é refém daquilo que é o modo como funciona a profissão da arquitetura. Não sei, acho que há mesmo uma grande diferença entre o meu 1º e o 2º ano, e no 3º e o que aconteceu depois.
[GF] - Que outras histórias te marcaram?
[FP] - Marcou-me também muito a História da Arquitetura Portuguesa.
[GF] - Lecionada pela professora Marta Oliveira. Marcou-te por um interesse pessoal na matéria?
[FP] - E eu conseguia dominar mais ou menos bem os assuntos. Deu-me prazer fazer essa disciplina, tanto que depois até foi com a Marta Oliveira que tentei, ou que fiz uma primeira tentativa de elaboração de uma dissertação, de um projeto de dissertação. Que depois mudou totalmente, e naturalmente mudou também a necessidade de orientação. Tal como à Marta Oliveira, guardo também com bastante carinho o Nuno Sousa, de Desenho.
[GF] - Professor de Desenho no 1º ano.
[FP] - E também o professor Marco Mendes, que foi meu professor de Desenho também, mas no 2º ano.
[GF] - São muito competentes, a desenhar e a ensinar.
[FP] - Extremamente competentes, não só a desenhar, mas realmente como professores. Agora um assunto mais corrente. O assunto da precariedade docente.
Por exemplo, sou sensível de facto a esse problema, que se eu porventura também enveredar um dia, quiçá, numa carreira docente também me afetará. Mas de facto pessoas como o Nuno Sousa e o Marco Mendes despertam em mim mesmo uma admiração muito grande pelo bom trabalho que fazem. Em contraste com o que me parece muitas vezes ser alguma falta de consideração que a Escola tem por alguns professores, em particular de desenho./
Depois foi o Erasmus. É uma experiência comum a muita gente.
[GF] - É uma experiência muito marcante, não é?
[FP] - Sim.
[GF] - Tu foste em Erasmus para a Alemanha.
[FP] - Para Munique.
[GF] - E fizeste estágios?
[FP] - Eu nunca estagiei. Também nunca trabalhei num escritório de arquitetura, ainda.
[GF] - E tens alguma opinião acerca do futuro da relação entre o ensino e a prática. Tens opinião ou feedback sobre o mundo da prática profissional? Por exemplo, se há emprego para os recém-formados, se há possibilidade de iniciarem uma prática de arquitetura autónoma, etc.
[FP] - Pessoas como o Diogo Rodrigues dominam melhor essa matéria./
V.
[GF] - Estás ou estão envolvidos num Movimento de Trabalhadores em Arquitetura, que está a surgir?
[FP] - Sim, com este Diogo que referia, entre mais pessoas. Há de ser um sindicato. De facto, essa questão dos estágios e da profissão é uma questão que eu e o Diogo tivemos em mãos quando ainda estávamos na Associação de Estudantes. E com a Ordem dos Arquitetos reunimos várias vezes e tentámos debater essa temática.
[GF] - Tentaram trazer para o debate outras Associações de Estudantes de Arquitetura?
[FP] - Eu, o Diogo, e mais malta, até tentámos formar uma Associação Nacional de Estudantes de Arquitetura, com a Associação de Estudantes de Lisboa, com o Núcleo de Estudantes do Minho, com o Núcleo da Beira Interior, com o Núcleo de Coimbra, etc.
[GF] - Acabou por não acontecer?
[FP] - Principalmente porque depois eu, o Diogo e o resto da malta perdemos as eleições para a Associação de Estudantes no início do ano de 2018. E, portanto, quem nos venceu nessa eleição deixou cair totalmente esse projeto. Lembro-me que eu e o Diogo tivemos uma reunião em Lisboa e de que nos foi dado a considerar pela Ordem dos Arquitetos se continuava a interessar um modelo de estágio ou que formas alternativas ao estágio é que podia haver etc.
[GF] - Referes-te à questão do acesso à profissão?
[FP] - E as discussões não evoluíram muito também porque a questão é muito mais complexa do que simplesmente esta. Lembro-me de que eu e o Diogo alertávamos várias vezes para o problema da precariedade e eles respondiam que não têm poder fiscalizador em relação aos ateliês. Ou então, por exemplo, na reunião em Lisboa, recordo-me que estavam a considerar que se calhar os estágios poderiam no fundo corresponder a uma aquisição pré-determinada de conhecimentos ou de competências, uma espécie de tabela.
[GF] - Uma espécie, digamos, de Plano de Estudos… ou espécie de estágio?
[FP] - E eu e o Diogo já tínhamos encontrado uma tabela desse género. Já nem me lembro do que é que tinha sido. De uma proposta, se calhar, dos anos 90 ou no início dos anos 2000, de jovens arquitetos. Tinha a propósito uma série de coisas.
[GF] - Que o estágio correspondesse a uma série de competências previstas... e que depois se calhar a Ordem também fornecesse formações, etc.? Penso que a questão é complexa.
[FP] - Acho que se um estudante de arquitetura não tem ninguém ligado a esta área profissional na família, muito dificilmente conseguirá ter um negócio próprio, digamos assim. De alguma forma é como se esta ideia de profissão liberal fosse uma ilusão, não é? Aquilo que está realmente a acontecer é uma produção em massa, digamos assim, proletarizada, de trabalhadores que maioritariamente vão depois alimentar o aparelho de produção.
[GF] - Não falta trabalho para parte dos arquitetos formados?
[FP] - O que falta é realmente acesso ao exercício da profissão. Ou seja, na minha opinião, a importância de encarar o exercício da arquitetura como um assunto público, como talvez uma competência que devesse ser talvez do Estado e não de uma atividade liberal, só auto-organizada. E depois, claro está, parece que há demasiados arquitetos para aquilo que são as encomendas, mas a verdade é que não falta gente a viver em más condições de habitabilidade.
[GF] - Temos um considerável volume de negócios na construção civil… Tal não sei se corresponde ao aumento do número de ateliers?
[FP] - Que não corresponderam a um aumento também dos rendimentos daqueles que são os trabalhadores em arquitetura./
VI.
[FP] - Tentei falar do Erasmus. Na minha altura o Erasmus já era uma grande coisa./
Considero que seja ainda, aliás, foi muito marcante para mim.
[GF] - É algo muito comum, quase todos os alunos fazem.
[FP] - No meu caso, no sentido em que foi a meio do curso, e que voltando me permitiu ter uma visão diferente. No sentido em que, se calhar, muitas das opções que se tomam na Escola, sejam práticas, sobre o Plano de Estudos, etc., não são dados garantidos. Pelo menos o Erasmus permitiu-me ver isso.
[GF] - Permitiu-te ver como é que outras Escolas funcionam?/
Em determinado momento aludias a questão do tempo de Projeto etc. E eu, por outro lado, lembro-me do protagonismo de outras UC em relação à Teoria, da tentativa de redução da Teoria. Entre outras coisas que a proposta de plano propunha. Porque, se bem me recordo, também havia coisas relacionadas com o 6º ano, e com as condições para fazer a Dissertação.
[FP] - Sim, sim.
[GF] - Qual é a perceção de um aluno da tua geração, no referente a esta década? Na minha altura, por exemplo, fora muito valorizada a presença do Desenho; o 6º ano era ainda anual, e os estágios eram fáceis de arranjar.
[FP] - Pois… Já agora, uma das coisas que mais me arrependo deste período da discussão da revisão do Planos de estudos foi não ter havido realmente um registo fotográfico dos plenários. E de não ter havido também uma transcrição, nem gravação. Um registo, por exemplo, das intervenções ou considerações sobre as coisas. Porque também foi emocionante muita coisa. E quando tudo acabou...
[GF] - Não há registo?
[FP] - Não.
[GF] - Da Quinzena’15 há, mas dos Diálogos não?
[FP] - Eu lembro-me que até havia uma espécie de... uma coisa paralela, em que antes dos plenários andavam grupos com pessoas a discutir pela Escola, em salas diferentes. Era na Quinzena, onde de facto havia vários grupos que debatiam as diferentes temáticas.
[GF] - Tu estiveste na 2ª parte, e a Beatriz que referiste esteve na 1º parte?
[FP] - Exatamente. A Beatriz Merouço esteve envolvida em 1ª mão com as práticas, com as jornadas pedagógicas do início de 2015 e depois com a Quinzena’15, que foi em maio, acho eu. E ela era membro do Conselho Pedagógico, e também membro da Direção da Associação de Estudantes. Tem a minha idade. É do mesmo ano que eu.
[GF] - Ficamos por aqui. Fernando, obrigado.
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